As marcas do terrorismo em Cabo Delgado
- Relatório de uma agência das NU diz que 1.3 milhão de pessoas necessita de ajuda urgente, ao mesmo tempo que fala da rede sanitária destruída e da cólera que está a matar
Os ataques terroristas que há pouco mais de três anos têm lugar nas regiões centro e norte de Cabo Delgado continuam a ser responsáveis pela deterioração acentuada das condições de vida da população das zonas afectadas pelo conflito, dos locais de acolhimento e reassentamento, e não só.
É um drama humanitário que parece não ter fim à vista, com os números a indicarem 1.3 milhão de pessoas que precisa de protecção e assistência humanitária urgente. Os 1.3 milhão de pessoas a necessitar de ajuda, particularmente alimentar, e de habitação corresponde às que foram forçadas a abandonar as suas zonas de origem e residência habitual e deslocar-se a outras zonas relativamente mais seguras em distritos de Cabo Delgado, assim como nas províncias de Nampula e Niassa.
Um relatório do Escritório das Nações Unidas para a Coordenação de Assuntos Humanitários (OCHA), publicado semana passada, explica que os 1.3 milhão de pessoas inclui as que são efectivamente deslocadas, mas também as das regiões de acolhimento e reassentamento.
É que mais de 90 por cento de deslocados foram acolhidos em casas de familiares, amigos e conhecidos, o que implica a necessidade de compartilhar o bastante pouco que os anfitriões, em algum momento, conseguem ter. O relatório, apoiando-se na última análise da Classificação da Fase Integrada, aponta que quase 950 mil pessoas em Cabo Delgado, Niassa e Nampula estão a enfrentar o que se considera “fome severa”.
Esta é uma realidade que também está ligada ao facto de, muitos distritos de Cabo Delgado, a exemplo das vilas sedes de Palma e Macomia, estarem a registar alto custo de produtos de primeira necessidade, o que faz com que muitas pessoas estejam impossibilitadas de adquirir o básico.
“As comunidades em áreas menos agitadas de Cabo Delgado, bem como nas províncias vizinhas de Niassa e Nampula, mostraram uma solidariedade e generosidade incríveis com os deslocados que fogem da crise” – anota o relatório, reconhecendo que estas pessoas precisam de apoio, tendo em conta que os novos membros que chegam precisam de recomeçar do zero.
Cólera e rede sanitária Uma outra preocupação apontada pelas Nações Unidas tem a ver com a deterioração das condições de assistência sanitária. O pessoal de saúde está actualmente deslocado e a rede sanitária bastante destruída.
Nos locais de acolhimento e reassentamento não existem mínimas condições de saneamento de meio, realidade que resulta na eclosão de doenças, a exemplo da cólera.
“Os casos de cólera estão aumentando, especialmente entre os deslocados, e mais de 4.916 casos e 55 mortes relatados até 14 de Fevereiro de 2021, com o maior número de casos registados no distrito de Metuge [distrito que acolhe maior número de centros de deslocados]” – refere o relatório, demonstrando uma imagem bastante difícil, particularmente para a província de Cabo Delgado.
Com a destruição da rede sanitária local, o relatório estima que cerca de 36 por cento das unidades sanitárias da província deixaram de funcionar. Umas foram somente vandalizadas, mas outras foram mesmo destruídas.
Actualmente, em algumas vilas dos distritos afectados, apenas agentes comunitários Forças de Defesa e Segurança é que tentam assegurar assistência sanitária às populações.
MEDIA FAX – 01.03.2021