Milhares continuam a pedir sair, mas Governo faz ouvidos de mercador
- Embarcações que chegaram, semana passada, a Paquite, terão partido de Palma à revelia das autoridades
Fora do branqueamento que tem estado a ser privilegiado pela máquina partidária e governativa, os relatos das vítimas directas do conflito, e que estão ainda na vila de Palma e na aldeia de Quitunda continuam a relatar uma realidade de mortes, desespero, fome, medo, assim como pedidos reiterados de evacuação que são, entretanto, rejeitados pelas autoridades governamentais.
Na verdade, o Governo esta a fazer um esforço gigantesco para dar a entender que a ordem e segurança públicas estão restabelecidas na vila de Palma, mas a realidade no terreno mostra exactamente o contrário.
A fazer prova da falta de segurança, o mediaFAX sabe que, na noite de sexta-feira, cinco pessoas foram mortas e sete casas foram queimadas. Esta ocorrência teve lugar num dos bairros de expansão da vila de Palma.
A este episódio juntam-se relatos de mortes que tiveram lugar dias anteriores, com suspeita de terem sido protagonizadas por membros das Forças de Defesa e Segurança (FDS). As
pessoas mortas, relata-se, terão caído na lista de suspeitos de colaboração com os grupos terroristas.
E porque os sinais de falta de segurança são evidentes, além de pessoas que buscam estratégias para deixar a vila, várias empresas que respondiam ao boom da actividade económica ligada aos projectos de LNG, estão, também, a consumar a sua retirada.
Até porque a Total, o grande cliente dos serviços e produtos que forneciam, também se retirou temporariamente.
Nisto, o que se vê na vila de Palma é a desmobilização de muitos empreendimentos, com muitas máquinas e carros a serem retirados dos estaleiros dos arredores da vila para Afungi.
Naquele ponto do distrito de Palma, os empresários procuram carregar, em navios, o que sobrou do ataque terrorista. O destino do que está sendo removido de Palma é Pemba.
No grupo de quem está a sair está a REEF, uma firma que está (va) a operar em Cabo Delgado há mais de 15 anos.
Aquando do assalto terrorista à vila de Palma, a REEF, com um investimento na ordem de USD 4 milhões, estima ter perdido cerca de 700 mil dólares.
Drama em Quitunda
Enquanto isso, na aldeia de Quitunda, o cenário também está a deteriorar-se a cada dia que passa. Aqui, as pessoas até se esqueceram de questões meramente de segurança. Estão sim preocupadas com a precariedade das condições de vida naquele local.
Os relatos indicam que não há água em Quitunda e o facto de acolher muita gente (cerca de vinte mil pessoas) faz com que a falta de condições de saneamento do meio tenha atingido o pico, abrindo espaço para eclosão de doenças.
“Não há água nas torneiras. Tem muita gente na vila. Na entrada da vila cheira muito mal. As pessoas fazem as suas necessidades maiores ao redor da vila. O mercado está incontrolável. É lixo, é água suja. O perigo maior é de apanhar cólera” – narrou uma fonte local, reiterando pedido de, pelo menos, retomar-se o processo de evacuação das pessoas para Pemba, o actual porto seguro para muitos refugiados que estão apinhados na aldeia de Quitunda.
Com o Instituto Nacional de Gestão de Desastres (INGD), o braço estatal de apoio às populações em situação de vulnerabilidade ainda com sinais de desconecção, os refugiados que ainda esperam pela sua sorte para sair de Quitunda, parecem depender muito de apoios de pessoas e instituições de boa vontade.
Do Governo, muito pouco se vê. Neste grupo de “mão amiga” está Zvika Karadi, proprietário da REEF. Ele arrendou uma casa em Quitunda e colocou lá 11 colaboradores seus para procurarem ajudar as populações que passam por extremas necessidades.
Com o ataque a Palma e destruição das suas infra-estruturas e máquinas, ele terá decidido abandonar Moçambique. Ou seja, decidiu não continuar a investir em Moçambique.
Entretanto, de acordo com a Zitamar News, depois de se deslocar a Palma e depois a Quitunda, onde viu o sofrimento das pessoas que naquele ponto estão concentradas, ele terá decidido ajudar no que pudesse antes de sair de Moçambique.
Os 11 trabalhadores colocados em Quitunda recebem mantimentos e medicamentos que Zvika Karadi compra em Pemba e manda a Quitunda e, posteriormente, iniciam o processo de distribuição.
Há indicações de que freta avionetas para transportar as pessoas de Afungi a Pemba, cabendo aos seus funcionários seleccionarem as que vitimas que estão em situação demasiadamente crítica.
Negociações com a Linhas Aéreas de Moçambique terão sido feitas para garantir que um avião maior pudesse transportar os refugiados para Pemba. Entretanto, o processo foi parado pelo Governo.
Esta rejeição, ao que parece, tem a ver com a tese governamental de que as pessoas devem, obrigatoriamente, regressar à vila de Palma, mesmo que as condições de segurança não estejam criadas. Ou seja, quer o Governo fazer vingar a ideia de que os terroristas foram efectivamente expulsos de Palma, daí a importância do regresso das populações.
Os refugiados irão completar 30 dias em Quitunda, aguardando que tenham a sorte de serem retirados e transportados para algum local seguro e com alguma condição para tocarem as suas vidas.
As agências humanitárias têm, igualmente, estado a queixar-se do facto de o Governo continuar inflexível na criação de condições para a importação de mantimentos e entrada de pessoal humanitário.
Na semana passada, uma embarcação com mantimentos, enviada pelo INGD não conseguiu deixar comida para as populações necessitadas em Palma. As razões não ficaram claras, mas foi coloca[1]da a hipótese de, a dado momento, ter-se chegado à conclusão de que não havia condições estruturais e de segurança para fazer chegar os apoios.
MEDIA FAX -26.04.2021