EUREKA por Laurindos Macuácua
Cartas ao Presidente da República (56)
Não é novidade que ditaduras não gostam da verdade. Em nenhum momento isso fica tão claro quanto nas crises de segurança pública.
A história está repleta de exemplos de censura a informações sobre a guerra, quando incomodam tiranos no poder. Mesmo nas democracias, porém, a relação dos governos com a falta de segurança é ambígua.
Por isso também não surpreende que o Governo moçambicano tenha ensaiado uma manobra de ilusionismo para justificar a omissão dos dados sobre a guerra que devasta Cabo Delgado, na tentativa de minimizar a tragédia que se abate sobre o País.
Só que, ao tentar evitar o pânico, acaba por amplificá-lo. Por que o Governo não diz ao povo quanto é que gasta com mercenários em Cabo Delgado? Ou melhor: por que nega a existência de mercenários naquela província?
Eu, pessoalmente, não vejo porquê o Governo continua se esforçando para omitir uma coisa que já é do domínio de todos. Todos sabemos a importância que representa para qualquer entidade comunicar o que está a fazer, para que os seus diversos públicos não apenas disso tomem conhecimento, como também possam comentar e julgar, possibilitando eventualmente com isso correcções de rumo.
O Governo da Frelimo demonstra não levar em conta a importância da comunicação oficial, relegando à opinião pública nacional um papel secun[1]dário, incompatível com os nossos ideais democráticos.
Aquando da eclosão do escândalo das dívidas ocultas, o Governo fez o mesmo. Esforçou-se muito- e continua a esforçar-se- para que a verdade não fosse revelada. Conclusão: tudo acabou sendo destapado até o cobrador do “chapa” tomou conhecimento de que o Presidente da República, segundo testemunho de Jean Bostani e o seu chefe Iskandar Safa, é uma das pessoas, fora das grades, que também se beneficiou dos dinheiros do vergonhoso calote.
Está com os abutres que bebericam, impiedosamente, o sangue do povo moçambicano.
Manipular a verdade ou adoptar um discurso que minimiza os factos – aquilo que consultores de comunicação chamam de “gestão de riscos” – acaba tendo o efeito contrário.
A comunicação de riscos implica administrar a verdade. A verdade, porém, não se administra. A verdade se conta.
O Presidente devia saber que na realidade actual, manipular a verdade fica bem mais difícil. Isto quer dizer que tudo o que acontece no Governo que o senhor preside acabará vindo ter com o povo.
É só analisar quanto é que o Presidente teria pago para não ser associado ao calote. Mas o povo, sem muito esforço, acabou sabendo que o seu Presidente é associado aos que lesaram a pátria, quando por um lado vinha cantando estribilho de combate à corrupção para distrair esse mesmo povo.
DN – 23.04.2021