Em entrevista à DW, Paula Monjane, do Fundo de Monitoria do Orçamento (FMO), afirma que Presidente moçambicano deve esclarecer o povo moçambicano se recebeu ou não os pagamentos que a Privinvest diz que lhe fez.
Na passada sexta-feira (21.05), soube-se que o grupo naval Privinvest foi autorizado por um tribunal britânico a notificar o Presidente da República de Moçambique, Filipe Nyusi, no âmbito do processo das "Dívidas Ocultas", a decorrer em Londres. O grupo Privinvest afirma que o próprio Filipe Nyusi terá recebido pagamentos - que a empresa considera legítimos - quando ainda era o ministro da Defesa de Moçambique.
Em entrevista à DW sobre o tema, Paula Monjane, que faz parte do Fórum de Monitoria do Orçamento (FMO), uma plataforma de organizações da sociedade civil interessadas na área de gestão de finanças públicas, e que tem vindo a acompanhar o processo das Dívidas Ocultas, afirma que Filipe Nyusi deve esclarecer o povo moçambicano sobre se recebeu ou não estes pagamentos.
DW África: O facto do Chefe de Estado moçambicano poder vir a ser notiicado é um grande embaraço para Filipe Nyusi?
Paula Monjane (PM): É claramente, desde logo porque o assunto das Dívidas Ocultas tem vindo a mexer com a sociedade moçambicana desde a sua descoberta e todo o processo que o governo esteve envolvido com vista a clarificar o problema torna a situação complexa porque é a segunda vez que ouvimos o nome do Presidente neste processo.
DW África: Perante esta possível notificação do Presidente moçambicano do tribunal em Londres, como é que Filipe Nyusi deveria reagir agora?
PM: O Presidente tem que vir clarificar e dar uma justificação aos moçambicanos sobre o que é que isto quer dizer, principalmente num contexto de crise. Sabemos todos que as Dívidas Ocultas resultaram, tanto numa crise económica e social [no país], mas também numa crise que até hoje não está devidamente explicada, e os processos não estão ainda terminados. Mas o nosso foco principal é que o Presidente tem o dever de vir junto dos moçambicanos explicar esta situação e penso que nós, como moçambicanos, estamos à espera que isso aconteça.
DW África: A Procuradoria-Geral de Moçambique iniciou este caso na justiça britânica em 2019 para pedir uma indemnização que cubra todas as perdas resultantes do escândalo das Dívidas Ocultas, portanto é o próprio Estado moçambicano que deveria estar interessado em esclarecer todas das dúvidas neste processo...
PM: Na nossa opinião, como FMO, sim. Estamos cada vez mais preocupados. A notificação não significa culpa, mas sugere que há um esclarecimento e há uma necessidade de clarificação melhor desse processo.
DW África: Tem denotado alguma tendência por parte da Procuradoria de ilibar o Chefe de Estado e o próprio partido no poder – FRELIMO – de todas as acusações?
PM: Nos julgamentos realizados, portanto, nos Estados Unidos, principalmente ligado ao Jean Boustani, tanto o partido no poder - FRELIMO -, como o Presidente da República, foram citados como pessoas que terão recebido compensações, naturalmente ilícitas, em relação a este processo. Contudo, a PGR nunca tocou ou explorou [o envolvimento destas pessoas], ou pelo menos se explora não veio a público falar do caso. E nós, como organizações da sociedade civil, estamos interessadas em perceber até que ponto, tanto o partido no poder, como o Presidente, podiam estar implicados e queríamos que dessem uma explicação muito clara sobre esse aspeto.
DW África: E acha possível e desejável que a Procuradoria-Geral abra um processo em Moçambique para esclarecer se, de facto, foram feitos pagamentos por parte da Privinvest e de outras empresas ao próprio Presidente da República Filipe Nyusi?
PM: Eu penso que todo este processo devia ser feito de uma forma mais clara e aberta, portanto, com um julgamento isento. Para nós, moçambicanos, seria de extrema importância num caso destes, mas temos de contar e jogar e cruzar com as possibilidades de que os julgamentos estão a acontecer fora.
DW África: O Presidente da República não vai comparecer no processo das Dívidas Ocultas em Londres, uma vez que goza de imunidade, certo?
PM: A nossa perceção é que esteé um processo cível e neste caso ele pode ser notificado, mas não é obrigado a comparecer. Num contexto em que é Presidente, não sabemos qual vai ser a decisão, provavelmente não irá aparecer, mas mais importante, volto a frisar, é termos como moçambicanos já uma explicação imediata do que é que se está a passar e porque é que um Presidente é notificado para este caso e no passado foi também indicado da mesma forma por pessoas da mesma empresa.
DW – 24.05.2021