Por Edwin Hounnou
O governo precisou de quatro anos para perceber que a guerra de Cabo Delgado é uma acção terrorista e não um vento num copo com água e a sua erradicação precisava de empenho e inteligência. Custou entender de que se trata de uma guerra não alimentada por jornalistas nem por pesquisadores. Muitos jornalistas sofreram por uma causa que nada lhe dizia respeito e Ibraimo Mbaruco, jornalista da Rádio i de Palma, raptado por forças governamentais, a 7 de Abril de 2020, e nunca mais foi visto. Encorajados por esse facto a caça a jornalistas aumentou e Cabo Delgado foi transformado em local perigoso para pesquisa e reportagem jornalística de verdade.
De 2017 a esta parte, Cabo Delgado foi vedado a um jornalismo investigativo, que conta a verdade e fomos assistindo a uma simulação de um jornalismo inofensivo ao status quo. O governo gosta de um jornalismo feito pelos seus enviados de guerra que falam da bravura dos leões da floresta que fogem a quatro pés dos terroristas. A guerra que os terroristas movem não era um convite a uma caçada de rolas, mas um conjunto de diversos interesses de estrangeiros e nacionais contra Moçambique. Sempre que nos deslocássemos a Cabo Delgado, o fazíamos às escondidas para não sermos confundido com colaborador do inimigo e pagássemos com a vida o nosso atrevimento.
O presidente Nyusi parece faltar à verdade quando diz não haver nenhuma contrapartida por nos ajudarem na luta contra o terrorismo. Podemos acredita em relação à SADC, mas quanto à Ruanda, temos mais dívidas que certezas. Em política, não há almoços gratuitos, assim se diz. A troco de quê, então os esquadrões da morte de Paul Kagamé raptam e matam refugiados ruandeses em Moçambique?
Em guerra como esta, quando o alvo não está claro, atira-se para qualquer lado e de qualquer maneira, atingindo inocentes, abatendo pessoas que nos poderiam ajudar a encontrar soluções. Foi desse modo que assistimos uma perseguição sistemática aos jornalistas.
Os promotores dessas acções estão em silêncio como se não tivessem cometido um crime. O governo é o responsável moral desse crime. O presidente Filipe Nyusi simulou que o jornalista Ibraimo Mbaruco fosse um colaborador dos terroristas. Estamos convencidos de que ele foi assassinado pelas forças do governo. O governo deve esclarecer sobre o destino que deu ao preso. A guerra de Cabo Delgado comporta interesses económicos de países estrangeiros e dos nacionais donos de Moçambique.
Desde que a guerra terrorista eclodiu, a 05 de Outubro de 2017, na Vila da Mocímboa da Praia em Cabo Delgado, nos sempre vínhamos dizendo que o orgulho do governo de que o país não precisava de ajuda externa não passava de um mau sonho de alguns que andavam a propalar essa brincadeira ou que tentavam esconder outros interesses obscuros bastante prejudiciais ao país, e não só. Sempre defendemos que se tratava de uma guerra que nada tinha, no fundo, com a religião islâmica porque essa, como a conhecemos, é pela paz entre os povos e civilizações. Defendemos que se trata de uma guerra terrorista pelo monopólio das vias do narcotráfico. É uma guerra pelo dinheiro. É guerra dos narcotraficantes estrangeiros e de alguns cidadãos nacionais que se acham no direito de se sobreporem aos demais cidadãos, abocanham todas as oportunidades de negócios apenas para eles. É uma minoria a caminho de obter o DUAT de todo o país.
A falta de oportunidade de acesso a negócios e ao desenvolvimento abre brechas para desequilíbrios sociais e, consequentemente, a fricções sociais e a guerras. Não se pode compreender que num país com tantos recursos naturais, e não só, haja gente a morrer de fome e prevaleça a pobreza absoluta e o país não produza o suficiente para se alimentar. A má governação é única porta aberta por onde o inimigo pode entrar e nos dividir. Não são os recursos naturais, energéticos ou outros que nos conflictuam. Não é problema étnico, regional ou religioso, mas sim, é a maneira errada como nos governam desde 1975. É a ganância pelo poder politico de ficar com tudo que nos faz digladiar. É a forma fraudulenta de acesso ao poder e através deste à riqueza que nos rouba a paz e tranquilidade. Estamos sendo assolados por sucessivas guerras porque somos mal governados por indivíduos que vem no governo uma oportunidade para ficaram ricos roubando ao povo. Não nos dignifica nem nos honra como povo sermos governados por gatunos e trapaceiros. O lugar de um ladrão é atrás das grades e não no governo.
Não acreditamos na teoria segundo a qual seja uma guerra dos países produtores do gás e petróleo para inviabilizarem a efectiva exploração do gás do Rovuma. Não é guerra pela concorrência pela exploração do gás.
Para quem já fez uma reflexão de como estão sendo recompensadas as populações circunvizinhas das jazidas do carvão de Moatize, Benga e Marara, em Tete, pode entender a razão da guerra terrorista de Cabo Delgado. Como garimpeiros de Montepuez Ruby Mining, em Cabo Delgado, foram presos, açoitados e alguns mortos por milicianos dos novos donos das minas de rubis, pelo simples facto de um antigo combatente ser portador de uma carta que conseguiu em Maputo, a lhe dar o direito a ser o senhor daquela porção de terra, expulsando os legítimos donos para zonas áridas. Isso de dizer que combateram o colonialismo e expulsaram a administração estrangeira parece uma anedota. Que o colonialismo oprimia o povo é um discurso oco porque o novo colonialista é pior que o de ontem.
Não é assim que se constrói uma nação para todos. Não é desse modo que se consolida a paz e desenvolvimento. Não nos admiremos quando a bomba-relógio rebentar e lançar os seus estilhaços por tudo quanto seja canto, tal como está a acontecer, neste exacto momento, em Cabo Delgado e na zona centro do país. A injustiça é uma semente da qual brotam todas as guerras que as sociedades conhecem. Foi assim com a guerra colonial como foi com a guerra dos 16 anos. Pode-se fingir julgamentos de faz-de-conta como o que vai acontecer na BO, sobre as dívidas ocultas em que alguns arguidos por serem grandes demais, não serão ouvidos nem julgados. Não é preciso ser especialista de nada para perceber de que se trata de uma montagem de uma peça teatral para divertir o público. É uma manobra para enganar o público de que o tribunal julgou os lesa-pátria do calote e lhes impôs pesadas penas. Todo o resto termina por aí. A festa prossegue e o povo continua a pegar o dinheiro das dívidas que engordam os gatunos.
O New Man, ou seja, Filipe Nyusi que recebeu um Land Cruiser e um milhão de dólares não é encontrado nem achado na brincadeira do julgamento. O partido Frelimo que se beneficiou de 10 milhões de dólares nem sequer é mencionado. Chamam a isso de julgamento judicial? Pode-se dar qualquer outro nome e não julgamento judicial ou algo parecido com isso porque não é nem de perto nem de longe. Está a ficar claro o esforço titânico que a Procuradoria-Geral da República vem fazendo para impedir a extradição de Manuel Chang para os Estados Unidos. É para que a verdade não seja do domínio público. Visa esconder a verdade sobre o calote.
A justiça no nosso país está minada. Tem força para perseguir os pequenos e desprotegidos, mas, não pia quando se trata de pegar os graúdos. Estamos a anos-luz de distância da robustez e independência da justiça sul-africana que não olha para o tamanho do prevaricador : quem pisar o risco, dá dentro. Aí está Jacob Zuma, antigo chefe de estado sul-africano, recolhido aos calabouços.
CANAL DE MOÇAMBIQUE - 04.08.2021