Força de trabalho cresce rápido, mas sem qualificação
Moçambique está a registar uma espécie de explosão demográfica nos que, em poucos anos, poderá trazer uma pressão na demanda de emprego por parte dos jovens, que tendem a ser a maior parte da população.
A pressão já está à porta, induzida pelo cada vez aumento do número de jovens com fracas ou mesmo sem qualquer capacitação profissional ou nível académico.
"Não temos emprego. Eu não sei porquê”, grita Razão Leopoldo, um jovem que saiu do distrito de Nicoadala, na província da Zambézia, centro do país, para a cidade de Maputo à procura de emprego.
Naquilo que achava ser o el-dorado, tudo o que conseguiu, foi uma banca de um metro quadrado, improvisada de madeira, onde vende acessórios de velhos telemóveis. Diz ter tentado arranjar emprego, com base nas suas habilitações literárias de nível médio, nunca conseguiu e não tem dúvidas sobre o culpado.
“Eu penso que o nosso governo, talvez está a escolher. Nós os pobres não temos emprego, quem tem são os filhos dos bosses (chefes)” sentenciou.
Razão tem 22 anos de idade e é o retrato da situação de milhares de jovens moçambicanos e expõe os os perigos, riscos e desafios de um país em que cerca de 15 milhões de pessoas, o correspondente a metade da população, está entre a adolescência e a juventude.
Potencialidades e riscos demográficos
O demógrafo e professor universitário Carlos Arnaldo, olha para a pirâmide etária e faz a análise na perspectiva do potencial de desenvolvimento.
“Há sim uma potencialidade de desenvolvimento nessa nossa estrutura. Se nós pudermos transformar, primeiro, a nossa estrutura etária, depois, ser acompanhada por uma preparação adequada desse potencial de mão-de-obra, para que no futuro, possa estar em condições de competir no mercado de trabalho, isso pode ser uma vantagem” avaliou o demógrafo.
Arnaldo salientou contudo que “isso só pode ser uma vantagem se houver grande investimento neste momento, em relação àquilo que são as necessidades básicas e que também, haja um investimento social que seja capaz de transformar a estrutura etária de modo a pensarmos nesses ganhos de dividendos demográficos”.
Para Carlos Arnaldo, por enquanto, tudo o que vê são enormes desafios, uma vez que o quadro mostra uma pressão à vista em termos de demanda de emprego, o que carrega riscos sociais.
“Nós temos uma força de trabalho que está a crescer rápido, mas também está a crescer sem qualificação. Isso pode trazer consequências na possibilidade dessas pessoas poderem participar na economia e, quando não podem participar, isso pode gerar frustração a um número muito maior de pessoas” alertou.
Uma bomba relógio
O Reverendo Anastácio Chembeze é director do Instituto de Formação Profissional e Estudos Laborais Alberto Cassimo (IFEPLAC), uma instituição pública criada para dar encaminhamento e resposta a questões de emprego. Olha para as tendências demográficas como uma bomba relógio que só pode ser desactivada, com forte aposta na educação, focada no auto-emprego.
“É preciso investir muito na educação profissional. Estou a falar do ensino técnico e da formação profissional. A formação profissional tem uma vantagem, porque os cursos ou qualificações são relativamente mais curtas e preparam o jovem para o mercado de trabalho, e eles podem, enquanto trabalham, dar continuidade aos seus estudos noutros níveis” justificou.
De acordo com Chembeze, o país precisa acelerar os investimentos neste sector, pois só assim vai conseguir induzir a transformação e fazer da tendência demográfica actual, um factor de desenvolvimento.
“Neste momento ainda não demos passos largos. Demos pequenos passos e se não acelerarmos, vamos apanhar um choque” alertou.
VOA – 23.08.2021