Por ten-coronel Manuel Bernardo Gondola
A tomada rápida do Kabul pelos talibãs não deve surpreender a ninguém. Em 20[18] aconteceu um encontro de representantes do Donald Trump e representantes dos talibãs no Qatar, e os estados unidos [EU] ali já estavam ensaiando sua retirada do Afeganistão, porque os custo financeiros eram gigantescos de manter centenas de milhares de soldados alí. E o acordo foi seguinte: «olha! Nós sabemos que saindo vocês vão tomar aquilo, isso é óbvio, pois não há força no Afeganistão que possa detê-los. Então, o que nós pedimos e exigimos para nossa saída é que vocês não deixem o al-Qaeda e o Estado Islâmico [EI] terem bases no Afeganistão». E os talibãs se comprometeram com isso. E tem outra inclusive o Presidente Joe Biden pode-se dizer surpreso, mas os seus Generais do Comando militar dos EU avisaram-no. «Destarte, que nós sairmos os talibãs vão tomar conta daquilo rapidamente».
No Domingo por exemplo, nós vimos imagens arrepiantes de pessoas tentando se agarrar no avião militar americano, que já estava andando na pista. Era o total desespero. Contudo, essas imagens não devem ser [confundidas] com a maneira como a boa parte de afegãos recebem os talibãs. Os talibãs têm bases populares muito profundas no Afeganistão, e inclusive houve erros de avaliação, um General americano chegou a dizer, que haveria uma guerra civil e, estava à vista, que não haveria uma guerra civil.
O Presidente afegão Ashraf Ghani, escreveu no facebook, que «os talibãs venceram» e garantiu ter fugiu do país para evitar «derramamento de sangue». Balela fugiu porque tinha medo e sabia que a população não iria defende-lo. Não haveria derramamento de sangue e se fosse seria da parte dele. E Abdullah Abdullah, que é quem governava, de facto o Afeganistão veio com essa história de que, vamos fazer um Governo de transição; talvez os talibãs concordem que haja ali representantes do Governo que foi derrubado para manter contactos internacionais, mas quem vai mandar realmente no Afeganistão são os talibãs.
E a tomada de Kabul, que alguns especialistas imaginavam que fosse demorar [30] dias era uma coisa esquisita. Claro que não! Eles tomaram aquilo facilmente como tomaram o Exército e a Polícia que bateram em retirada, até porque a base do Exército afegão e a Polícia é muito ligado aos talibãs.
E agora o que vai acontecer? Essa é que é a pergunta.
O talibã não são o EI, o talibã não é al-Qaeda é preciso acabar com alguns estereótipos. A ideia dos talibãs é estar no Governo e ter relações internacionais. Devo lembrar, quando eles estavam no Governo por [6/7] anos eles tinham [3] países que os sustentavam internacionalmente: Arábia Saudita, Emiratos Árabes, que praticamente sempre segue a política da Arábia Saudita e o Paquistão onde nasceu os talibãs.
Talibã quer dizer estudantes. Porquê estudante! Porque eles vieram daquelas madrassas corânicas do Paquistão. Quando a União Soviética [US] foi derrotada no Afeganistão, aquilo foi uma sura porque os tanques soviéticos não tinha a menor valia nas montanhas do Afeganistão, eles tinham de subir a pé com a infantaria ou helicóptero e eles tinham mísseis stinger, que os EU forneceu e derrubavam helicópteros como quem derrubava moscas.
E então, depois da derrota da US, houve uma guerra entre os mudjahidineen e os talibãs para ver quem tomaria o poder e os talibãs eram os únicos que tinham aviões. E numa guerra se você tem avião a sua vantagem e tremenda. Então, o talibã/talibãs conseguiu dominar [90%] do Afeganistão excepto o Norte do país. Agora vai ser diferente, eles vão dominar tudo, eles terão o controlo de [100%] do Afeganistão, não mais [90%].
Agora, a única dúvida que fica é sobre o futuro. O quanto EI vai influenciar o trabalho dos talibãs. Porque, depois da morte de Mullah Omar o EI se aproximou muito de algumas frentes dos talibãs e o que se espera é que eles não tenham essa influência uma vez que, os talibãs são um grupo nacionalista islâmico, radicalmente islâmico e vai impor a lei islâmica as mulheres e homens. Por exemplo, não puder ouvir música, ir no cinema, ter barba no caso de homens, mulher andar de borca. Isso vai ser imposto com rigidez como há [20] anos.
Eles vão ser tão rigorosos, a diferença estará talvez na tentativa de serem mais acessíveis nas relações internacionais. Por exemplo, a China já reconheceu o Governo talibã, consequentemente não vai tirar sua Embaixada em Kabul. A Rússia, também vai manter sua Embaixada, mas tudo indica que vai reconhecer o Governo talibã. A China tem contractos para exploração de minérios raros que existem no Afeganistão e a Rússia o oleoduto que é muito importante, um gasoduto e…é bom lembrar que o Afeganistão tem petróleo, tem gás e tem uma riqueza extraordinária e isso interessa a China quanto a Rússia.
Impedir os talibãs chegar ao poder seria manter as tropas americanas no Afeganistão, e os EU não estavam mais dispostos a isso. Há quem ache, que Joe Biden fez de maneira errada e desastrosa, porque o acordo para retirada foi feito pelo Trump, Joe Biden deveria retirar paulatinamente sempre atento a qualquer movimento dos talibãs para que não retomassem Kabul. Dos [160] mil soldados americanos em missão ano Afeganistão, Joe Biden reduziu a [3] mil soldados, aquilo era um convite. Os [3] mil soldados só estão lá, agora vão para [5] mil, e a Inglaterra também vai enviar, mas para retirada. Quer dizer, eles estão mandando a tropa apenas para garantir a retirada de cidadãos seus e não para enfrentar os talibãs.
Ao fim e ao cabo, há [20] anos os talibãs foram expulsos por uma coalizão euronorteocidental, liderada pelos EU, após a recusa em entregar Osamá Bin Laden líder da al-Qaeda e os ataques de [11] de Setembro. A derrota é total, tanto para o Governo, quanto para as Forças de Segurança afegãs, que os EU tanto financiam há duas décadas com bilhões de dólares.
Manuel Bernardo Gondola
Em Maputo, aos [17] de Agosto 20[21]