EUREKA por Laurindos Macuácua
Cartas ao Presidente da República (69)
Moçambique morreu, gritava a multidão ensandecida! E alguns, os menos crédulos na notícia que acabavam de receber, questionavam em uníssono: de que morreu Moçambique? De Covid-19? De morte matada, furava os tímpanos- mesmo de quem não tem ouvidos sensíveis- a gritaria da multidão!
Quarenta e seis anos! O arrebol dourado e escarlate da manhã da vida! Quarenta e seis anos e um destino trágico! Ah, Moçambique! E as carpideiras que sucumbiram todas ao novo coronavírus!?
Mas como fomos capazes de cravar mil adagas no pobre Moçambique? Como fomos capazes de beber o mar? Quem nos deu a esponja para apagar todo o horizonte? O que fizemos quando desacorrentamos esta terra do seu Sol? Como nós, os maiores assassinos dentre os assassinos, nos confortaremos? Moçambique sangrou até a morte sob as nossas adagas. Esventramo-lo, os mais corajosos, os que mandavam nos destinos do País, até banquetearam-se com a carne de Moçambique e beberam o seu sangue! Afinal, quem matou Moçambique? Perguntava uma voz anónima? Fomos todos nós! O povo é que é o seu assassino! Respondeu a multidão.
E quando se dizia isso, até vi Moçambique, cabisbaixo, caminhando em direcção ao patíbulo. Gritei, não! Nãooooo! Alguém ouviu-me e acordou-me. Julguei que fosse um mero pesadelo. Voltei à cama. Levantei-me à hora habitual e fiz as tarefas costumeiras até que me apercebi que, de facto, Moçambique havia morrido. Não era pesadelo!
E eu, que até Junho era moçambicano, tornei-me, desde Julho, ruandês. Mas há uma outra coisa que me inquieta: aqui também, no Ruanda, tem uma província chamada Cabo Delgado? Não. Não estou a sonhar. É isso mesmo. O líder da Frelimo é Paul Kagame. É por isso que os briefings sobre o que está a acontecer em Cabo Delgado são feitos a partir de Kigali.
O jornal que melhor me informa não é o “Notícias”. É o ruandês “The New Times”. Nos edifícios públicos está dependurada a fotografia de Paul Kagame.
A Comissão Política saúda agora Kagame. Mas aonde é que foram os nossos líderes: o Guebuza, Chipande, Pachinuapa, Nyusi e outros? Será que as ossadas de Eduardo Mondlane, Samora Machel, Marcelino dos Santos…continuam ali na praça ou hoje aquilo chama-se Praça dos Heróis Ruandeses?
Inquieta-me esta pergunta que faço a mim mesmo. Sinto a cabeça a latejar. Tenho os nervos em frangalhos. Vou desmaiar. E pimba, caio redondo e desamparado no chão frio que era outrora Moçambique.
Ai revejo tudo: os Guebuzas, Nyusis…a Frelimo, haviam se apoderado de um país que não é deles. Chamaram-no de Moçambique só para se apoderarem das suas riquezas. Os rubis de Namanhumbir. O gás de Temane. O carvão de Tete. As areias pesadas de Nampula e Gaza. Os dois mil milhões de dólares dos cofres públicos que jogaram toda uma população à miséria.
E Kagame, o bom samaritano, veio para nos salvar. Talvez a Total voltará a Afungi. E as casas de Kigali serão alimentadas pelo gás que deveria ter sido de Moçambique.
Coitado daqueles que pegaram em armas por falta de criatividade.
Primeiro foram deixados a morrer à mingua. Depois, quando se rebelaram, passaram a ser chamados de terroristas. E depois foram caçados e mortos. Terroristas não são os mandantes do assassinato, a sangue frio, de Moçambique?
Não são aqueles que esvaziaram os cofres do Estado e deixaram o País de rastos?
Deus anda distraído ultimamente. À próxima vez, podendo, vou construir um telescópio gigante, virado para o céu. Tenho que estar de olho em Deus!
DN – 06.08.2021
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