Por Edwin Hounnou
Moçambique está a abraços com um sério problema de calote avaliado em 2.2 mil milhões de dólares, dinheiro distribuído entre funcionários dos bancos Credit Suisse, VTB, governantes de Moçambique, altos funcionários do SISE – secreta do Estado moçambicano -, familiares de dirigentes como o filho do presidente, lobistas, aventureiros, pedintes, secretários e conselheiros do presidente da República e outros que viram naquele grande montante uma oportunidade ímpar para alavancar suas negociatas, oferecer valiosas prendas às suas esposas, filhos, filhas e amigos. Aproveitaram construir palacetes e mansões. Compraram viaturas de luxo para si e amigos, em detrimento da protecção da costa marítima que continua ao alcance dos piratas e dos narcotraficantes. Ainda que o país precisasse de protecção da Zona Exclusiva Económica, para o grupo, o projecto foi concebido para roubar, por isso, todos se aglomeraram à volta de Jean Boustani para cada um tirar proveito pessoal.
O dinheiro que foram pedir aos bancos estrangeiros, às escondidas e à margem das leis nacionais, em nome do Estado, serviu, tão-somente, para outros fins menos para os quais haviam sido projectados e até passarem garantias do Estado moçambicano dizendo que, caso as empresas beneficiárias desse volumoso calote - EMATUM, MAM e PROINDICUS - não pudessem pagar a sua dívida, nós, o povo, havíamos de arcar com a responsabilidade de devolver o dinheiro com os respectivos juros de mora aos fiadores dessa grana. O festival da gatunagem era de tal ordem que mesmo os que tinham o dever profissional de proteger o país, também, entraram na roubalheira, acumulando avultadas somas de dinheiro para si e inundar a seus familiares, amigos e comparsas de riqueza para a qual nunca verteram um pingo sequer de suor.
Os promotores do calote sabiam que o seu projecto não daria os resultados que propalam por ser inconsistente. Os países precavidos, como a Nigéria, Namíbia e Angola haviam rejeitado e afastado, mas o mesmo foi aclamado por corruptos da nossa terra por ter visto uma luz no fundo túnel para ficarem, de vez, ricos. Foi isso o que aconteceu – os 2,2 biliões de dólares desembolsados saíram dos bancos para o construtor dos barquitos que estão a apodrecer no Porto de Pesca de Maputo. Nem um cêntimo passou dos cofres do Estado. Isso é mesmo fraude. Somos obrigados a pagar uma dívida que nunca passou dos seus cofres. Foi um acerto entre os funcionários dos bancos que disponibilizaram os fundos, o construtor dos barquinhos e os nossos corruptos inflacionaram a dívida inicial calculada em 302 milhões de dólares para 622 milhões e daqui disparou para 2,2 mil milhões de dólares, para satisfazer os apetites dos corruptos.
A aprovação e efectivação desse calote é sinal de que o Estado moçambicano se encontra capturado por um perigoso gangster que pode roubar, tem poder bastante para amedrontar o tribunal, vociferar contra o juiz da causa e Ministério Público, ditar as perguntas que se lhe pode fazer, levantar os abraços como quem diz “independência ou morte, venceremos", tal procedimento de velhos revolucionários e falarem como se eles fossem os genuínos defensores do povo e do país. Se fossem defensores do povo e do país, não estariam a ser acusados de autoria do maior calote registado na história do país.
O Estado não tem meios para se defender dos corruptos e o pensamento de enriquecimento fácil está enraizado nas mentes da burguesia frelimista de que o roubo, corrupção, extorsão e calote são a fórmula mágica para se ser rico. Não se combate a grande corrupção porque há pessoas que estão acima da lei, sobretudo, por cima da lei, contra as quais a Procuradoria-Geral da República, PGR, não torra farinha.
Ressalta à vista o incompleto trabalho de Investigação feito pela PGR para o esclarecimento do desaparecimento dos fundos das dívidas ocultas porque o que está em julgamento na tenda da BO são apenas cerca de 50 milhões de dólares que ficaram com a malta do Ndambi Guebuza, filho do antigo presidente da República, Armando Guebuza; Gregório Leão, antigo director-geral do SISE; António Carlos do Rosário, antigo director da Inteligência Económica do SISE e PCA das empresas usadas para o calote; Cipriano Mutota, antigo director do Gabinete de Estudos do SISE; Isaltina Lucas, antiga directora nacional do Tesouro; Inês Moiane, antiga secretária do Presidente da República; Renato Matusse, antigo conselheiro do Presidente da República e Manuel Chang, antigo ministro das Finanças Teófilo Nhangumele, Rosário Mutota, Inês Moiane, Manuel Chang, antigo ministro das Finanças, que ainda continua preso na África do Sul a pedido dos Estados Unidos, apesar de um forcing da PGR para o retirar das garras do regime sul-africano que continua indeciso sobre o destino da deportação se vai para os Estados Unidos ou para Maputo se juntar aos seus comparsas. A lista dos beneficiários do calote é bem longa. Não são apenas os que vemos a gingar na tenda que comeram deste calote. Há muito mais do que se pode imaginar.
Sobre o sumiço dos restantes cerca de 2 biliões e 150 milhões de dólares ninguém diz uma única palavra sobre o seu destino. A PGR procura demonstrar que o resto não lhe diz respeito, dá-nos a entender que tudo vai terminar com o julgamento dos bafejados pela distribuição dos 50 milhões de dólares. Porém, os réus considerados como “caixa-negra" da concepção do calote referem-se de forma constante sobre Armando Guebuza, presidente da República à data dos factos, e Filipe Nyusi, na altura ministro da Defesa Nacional e actual Presidente da República, com responsabilidades acrescidas na contratação das dívidas ocultas mas agora não achados nem encontrados em tribunal quando se procura atribuir responsabilizar aos autores morais e materiais da prática do crime do calote. Desconfiamos de que o regime pretende atribuir uma morte súbita à questão do calote, limitando-se à condenar apenas o peixe-miúdo, deixando os graúdos ilesos e na santa paz. Isso é inaceitável.
Para que não reste mais nenhuma sombra para dúvidas se Armando Guebuza e Filipe Nyusi, também, se beneficiaram ou não dos fundos do calote, que sejam ouvidos estes dois governantes, de maneira pública e transparente, tanto mais que a última palavra quer no Comando Conjunto quer no Comando Operativo cabiam a eles dois, por isso, que venham cá para fora explicar o que aconteceu sobre o sumiço de tanta grana que o país está a pagar com muito sacrifício. O povo não tem nada que pagar pelo prato que não viu nem comeu. A PGR é o elo mais fraco do sistema. É incapaz de apurar para onde foram parar os 500 milhões de dólares transferidos do SISE para o Ministério da Defesa Nacional. Se não estão nos cofres do Ministério da Defesa Nacional, estão, seguramente, nas contas de pessoas, em alguma conta escondida em paraíso fiscal. Como tanto dinheiro fica em mministéris e não com o guardião dos fundos públicos? Aqui está uma prova de que o crime organizado capturou o Estado moçambicano.
A aparente falta da coragem da PGR em aprofundar as investigações deste caso, alimenta os apetites para um terceiro mandato sobre quem ainda recai a percepção comum de muitos suspeita de se terem beneficiado dos fundos do calote. Se a lei é igual para todos, por quê uns são apanhados e arrastados na via pública enquanto outros são protegidos e isso tem levantado reclamações de que “estamos em falta aqui na tenda BO.
Não há terceiro mandato para ninguém e muito menos ainda para quem recai suspeita de ter participado do calote.
CANAL DE MOÇAMBIQUE – 27.10.2021