A segurança marítima no Canal de Moçambique está em vias de incremento, com a aproximação da data de chegada da plataforma flutuante (FLNG), produzida na Coreia do Sul e actualmente em rota para Cabo Delgado, devendo entrar em águas moçambicanas em meados de Janeiro de 2022
A retirada gradual dos grupos armados de inspiração islâmica activos no Norte de Moçambique tem vindo a acentuar-se nas zonas ocupadas pelas Forças de Defesa do Ruanda (RDF) e Polícia Nacional do Ruanda (RNP) e pela força integrada da SADC (SAMIM), propiciando o alastramento de acções de guerrilha às províncias do Niassa e Zambézia, em moldes semelhantes às adoptadas em Cabo Delgado.
A ideia de que a insurreição “vem para ficar”, activando novos focos de conflito nas províncias do Niassa, Zambézia, Nampula, Tete e Sofala, tem resultados operacionais imediatos, obrigando as Forças de Defesa e Segurança (FDS) a dispersarem- -se por diversos teatros de operações, tornando-as crescentemente dependentes do apoio dos contingentes estrangeiros da SADC e Ruanda.
A extensão do mandato da SAMIM é dada como certa e a força militar do Ruanda, sem prazo definido, poderá prolongar-se indefinidamente, com custos mais pesados para Moçambique, financeiros e também políticos.
Um dos líderes do movimento insurgente de inspiração islâmica, activo desde 2017 em Cabo Delgado, Bonomade Machude Omar, continua activo no terreno, confinado a uma das bases na região montanhosa e de mata densa do Rio Messalo, próximo da fronteira com a província do Niassa.
Para suprir a desarticulação inicialmente identificada, os comandantes das FDS, SAMIM e Ruanda (RDF) têm vindo a reforçar a coordenação de operações, ao nível da partilha de informação e realização de reuniões mensais entre os comandantes de topo das três forças, e que passarão a incluir comandantes da Missão de Formação Militar da União Europeia para Moçambique (EUTM), formalmente activa desde 03 de Novembro.
Desenvolvimentos
Prosseguem as operações de “limpeza” em Cabo Delgado pelos contingentes ruandêses e da SAMIM, com informações dos últimos dias sobre a captura, por forças da SADC, de cinco insurgentes no distrito de Nangade e de outro no distrito de Macomia. Mantêm-se as emboscadas por parte de pequenas células armadas contra patrulhas das Forças Armadas de Defesa de Moçambique (FADM) e da SAMIM em vários pontos da província. Registam-se também ataques esporádicos a localidades isoladas.
Em 08 de Dezembro, 12 corpos de insurgentes foram descobertos em Mucojo, distrito de Macomia, na sequência dos confrontos que tiveram lugar dois dias antes com o contingente da SAMIM. A incerteza sobre a situação no terreno e a persistência de focos insurgentes levou ao encerramento “preventivo” em 11 deste Dezembro das ligações rodoviárias Afungi-Mocímboa da Praia (via Palma, Nangade e Mueda) à circulação de veículos civis não autorizados. A decisão foi tomada pelo contingente ruandês, territorialmente responsável pelo restabelecimento da segurança no distrito de Palma.
O Governo não se tem comprometido em relação ao regresso da população, apesar dos comunicados optimistas ruandeses e sul-africanos que caracterizaram os primeiros meses das respectivas missões.
O alastramento da insurreição ao Niassa e o reaparecimento de focos de conflito em território tanzaniano são referidos como o reflexo da incapacidade de contenção das FADM que deveriam ter assegurado a intransponibilidade das fronteiras internas (a partir de Cabo Delgado) e externas (Tanzânia).
As províncias da Zambézia e do Niassa são novos teatros de operações dos insurgentes, tendo-se registado novos ataques no distrito de Mecula, Niassa. A aldeia de Macanga, a 25 kms de Mecula, foi saqueada e destruída por um grupo de 10-15 insurgentes, em 12 de Dez., sem oposição das FADM/ UIR (unidade especial da PRM).
Informações disponíveis apontam para o avanço do grupo em direcção à capital do distrito, Mecula. Em 08.Dez, três localidades do mesmo distrito (Lichengue, Chinene e Nampequesso) foram atacadas e destruídas por uma célula armada.
À semelhança do ocorrido em Cabo Delgado, diversas infraestruturas de comunicações foram destruídas. Para além de Mecula, sob pressão há duas semanas, também o distrito de Muembe, igualmente na província do Niassa, foi atacado 09 de Dez.
O ataque de 08 de Dez foi reivindicado pelo Estado Islâmico para a Província da África Central (ISCAP) através dos canais habitualmente usados pela propaganda do movimento. O carácter rudimentar dos grupos armados mantém-se. O receio de disseminação do conflito por outras regiões do Niassa tem aumentado após a circulação de um “comunicado” em Lichinga, capital da província, onde se reafirma a intenção de estender o conflito a outros distritos como Sanga, Majuna e Metangula.
Em 12 de Dez., atracou em Pemba o navio da Marinha francesa Champlain, carregado de equipamento militar destinado à protecção de Afungi e ao projecto de GNL a cargo da Área 1. A atracagem do navio foi precedida pelo incremento das operações de fiscalização e patrulhamento marítimos no Canal de Moçambique, numa área que cobre as águas territoriais de Cabo Delgado e da Zambézia.
A segurança marítima está em vias de incremento, com a aproximação da data de chegada da plataforma flutuante (FLNG), produzida na Coreia do Sul e actualmente em rota para Cabo Delgado, devendo entrar em águas moçambicanas em meados de Janeiro de 2022. A Coral Sul desenvolve-se sob a responsabilidade directa da Samsung e da Eni, no âmbito do consórcio da Área 4.
Este é composto pela Mozambique Rovuma Venture S.p.A. (MRV), detida pela ExxonMobil, Eni e CNPC, que controlam 70% da concessão de exploração e produção, e a GALP, KOGAS e Empresa Nacional de Hidrocarbonetos (ENH, pública), que detêm 10% cada.
Também a região fronteiriça da Tanzânia continua sensível e marcada pela infiltração de células. Em 10 de Dez., foi reportado um ataque à localidade de Kiwengulo, a 15 kms de Pundanhar, com a morte de pelo menos quatro habitantes e a destruição de diversas residências.
Análise
Os recentes desenvolvimentos nas províncias vizinhas de Cabo Delgado vieram demonstrar que a informação divulgada pelo Governo (PR), Ruanda e SAMIM sobre o desenvolvimento do conflito é incompleta e, nalguns casos, tendenciosa.
Apesar dos avanços rápidos iniciais contra posições fixas dos insurgentes em Cabo Delgado, a situação tem vindo a tornar-se mais complexa e a dispersão territorial do conflito a aumentar, com as forças no terreno a denotarem dificuldade em conter desdobramentos e ramificações das células armadas.
REDACTOR – 17.12.2021