Com portas fechadas e ainda chamado “presidente de ladrões”
- Presidente da República garante que “eles [FMI] já nos confiam” e “esse é um grande ganho para nós”
Na primeira pessoa e falando para uma plateia fechada e dedicada à discussão da vida da Frelimo na província de Inhambane, o Presidente da República, Filipe Nyusi, partilhou a “boa nova” do regresso do Fundo Monetário Internacional (FMI) aos apoios financeiros directos ao Orçamento do Estado. Disse que era “boa notícia”, que abria espaço que o país voltasse a engrenar no campo do desenvolvimento económico, numa altura em que se está a sair dos nefastos efeitos da Covid-19.
Entretanto, o Chefe de Estado não deixou de partilhar aquilo que podem ter sido momentos difíceis da gestão das chamadas “dívidas ocultas”, razão por detrás da zanga do FMI e quase todos os parceiros bilaterais e multilaterais que cooperam com esta instituição da Bretton Woods.
Deu a conhecer que até a China não aceitou conceder empréstimo, tendo a recomendação ido no sentido de Moçambique encontrar formas de resolver o pendente com o FMI. Só depois disso, disse a China nas palavras de Filipe Nyusi, é que poderia disponibilizar algum empréstimo.
Era uma atitude que se compreende, pois “ninguém queria ser mal visto”. De acordo com palavras do Chefe de Estado, até quando viajasse para o estrangeiro, particularmente nos Estados Unidos, país que acolhe as sedes dos principais parceiros financeiros multilaterais, ouvia acusações de que tinha chegado e se estava perante “o presidente do país de ladrões”.
“Eu fui a Washington DC. A primeira vez que fiz [viagem], era chamado presidente do país dos ladrões” – apontou Filipe Nyusi, explicando que os esforços que foram sendo envidados pelo seu governo foram, de forma paulatina, melhorando a percepção negativa do país fora de portas.
Até porque internamente é consensual e compreensível o ódio que os moçambicanos demonstram em relação às dívidas ocultas. É que se tem a percepção de que as dívidas são o mal de todos os males pelos quais os moçambicanos passam neste momento.
Os pronunciamentos do Presidente da República foram feitos no âmbito de uma reunião do partido Frelimo, tida lugar na província de Inhambane, na tarde da segunda-feira. Para Filipe Nyusi, ser apelidado “presidente do país de ladrões” retira (va) a Moçambique o necessário prestígio no concerto das nações e impedia que se continuasse a ter acesso a algum tipo de financiamento para viabilizar a governação e garantir o desenvolvimento.
Graças a este esforço, entende ele, o país conseguiu impor-se e limpar a sua imagem, daí a razão de, agora, ter-se conseguido resgatar a notoriedade e importância do país. É nesta lógica que o Presidente da República enquadra o regresso do Fundo Monetário Internacional, com uma linha de crédito na ordem de 470 milhões de dólares.
“Não tinha peso [prestígio] nenhum, mas nós fomo-nos impondo. Fomos e tentamos devolver a confiança e o grupo [FMI] veio” – disse Filipe Nyusi, explicando, no momento seguinte, que agora deverá seguir a aprovação pelo Conselho de Administração da instituição, realidade que pode ser concretizada nas próximas duas semanas.
O Chefe de Estado sublinhou que o regresso do FMI vai reforçar o processo de reformas já em curso, no sentido de garantir crescimento sustentável, inclusivo e estabilidade macroeconómica de Moçambique. “Portanto, esse é grande ganho para nós. Eles já nos confiam” – apontou Nyusi.
Ainda apertados
Entretanto, apesar da abertura do Fundo Monetário Internacional, o Presidente da República reconhece que há ainda muito por percorrer para devolver uma efectiva e real estabilidade económico-financeira ao país. Ele não culpabiliza o Fundo Monetário Internacional pela decisão de, aquando da descoberta das dívidas, ter cancelado a parceria com Moçambique.
Entende que são regras e as regras devem ser cumpridas. O facto é que Moçambique não cumpriu essas regras. Não tendo cumprido, as sanções. É importante, na lógica de Filipe Nyusi, felicitar Moçambique pelo facto de ter sabido agir diante do problema e conseguido reaver a confiança, numa altura em que há, segundo disse, países que não conseguem “em tão rápido tempo”.
Mas, porque os desafios das dívidas são tantos, Filipe Nyusi recordou que o país ainda tem muitas contas por pagar, a exemplo dos empréstimos para a construção da Circular da cidade de Maputo e da ponte Maputo – Ka Tembe. “Estamos ainda apertados, mas o problema agora é que aquelas dívidas e outras já estão a cair [a ser pagas]. A gente nunca consegue sair na totalidade do problema. Aquelas dívidas da Estrada Circular, do Aeroporto de Nacala, da ponte de KaTembe, não estavam ainda a ganhar. Agora é que estão a cair [os créditos a ser pagos]. Agora é que vou pagar” – apontou Filipe Nyusi, chamando atenção para o facto de se compreender que o país caminhou, a dado momento, numa direcção de ser chamado “Estado falhado”.
MEDIAFAX – 31.03.2022