Por Edwin Hounnou
A audição do antigo presidente da República, Armando Guebuza, no tribunal no âmbito do esclarecimento das dívidas ocultas, foi recheada de grandes contradições que deixaram ver que o país vem sendo governado por indivíduos mais interessados nos seus interesses pessoais e do grupo que na boa gestão da coisa pública. Qualquer um bem poderia se aperceber de que, naquela tenda, nenhuma poeira baixou. A poeira, depois da audição de Guebuza, ficou cada vez mais densa. Ficaram expostas as feridas de uma governação danosa do Estado, o que justifica, em grande medida, a situação de penúria em que o país se encontra. Os que esperavam que Guebuza explicasse os contornos do calote, ficaram desiludidos. Para um importante sector da sociedade, esta audição serviu para confirmar que o Estado foi capturado por bandidos que acarinhou, ao invés de os trucidar ainda em ovos.
Em Estado de Direito, a delegação de funções não é feita com base em confiança política. Há formalidades legais a observar que Guebuza pontapeou. Mais grave ainda é quando o delegante lava as mãos, não exige contas do recado ao delegado. Esta prática é tolerável na gestão de coisa de família como de uma capoeira, de uma cantina, barraca e não da coisa pública. Seja em que circunstâncias que isso tenha ocorrido, não exime ao delegante das suas responsabilidades políticas como Guebuza tenta se esquivar. A única coisa pela qual o delegante não responde é quando se trata do cometimento de crime por delegado porque o crime é intransmissível e é de responsabilidade individual. Guebuza demonstrou que não esteve ao corrente de muita coisa feita pelos seus delegados, incluindo de Filipe Nyusi. Os crimes praticados pelos seus ministros não deixam Guebuza imune. Era a ele a quem cabia a última palavra de decisão.
Uma outra mentira que saltou à vista foi quando Guebuza disse que desconhecia da existência das garantias e avales do Estado para as empresas EMAATUM, MAM e PROÍNDICUS, assinadas pelo seu ministro das Finanças, Manuel Chang. É uma mentira intragável e grosseira. A apresentação de cartas de garantias e avales era a condição sine qua non para os financiadores abrirem os cordões da grana de onde cairiam os milhões de dólares que acabaram engordando as contas da quadrilha. Disso Guebuza, também, não sabia?! Guebuza não ficou admirado quando viu dinheiro a preencher tudo quanto fosse canto nem perguntou de onde provinha o mar de dinheiro em que seu filho, Ndambi Guebuza, pescou os 33 milhões de dólares. O partido Frelimo, de que ele era presidente, recebeu 10 milhões de dólares. Também não sabia? O seu ministro da Defesa, Filipe Nyusi, candidato à sua sucessão, encaixou um milhão de dólares e uma viatura de marca Toyota Land Cruiser que custou 728.6614,42 randes, preparado para seu uso pessoal na campanha eleitoral, doados por Skandar Safa, da PRIVIVINST, o "desconhecido" de Guebuza.
Guebuza insultou aos moçambicanos quando disse que não poderia levar o projecto da protecção da Zona Económica Exclusiva, ZEE, à Assembleia da República porque a Renamo, que estava em guerra com o governo à data dos factos, tinha deputados no parlamento e se procedesse de tal forma seria o mesmo que nada. Guebuza preferiu violar a Constituição a seguir a lei. Disse que seria o mesmo que levar uma proposta de empoderamento das FADM ao parlamento onde estariam os representantes dos terroristas que matam e saqueiam em Cabo Delgado. A solução que encontrou foi a de violar a Constituição. Porquê não ilegalizou a Renamo, se, não sua opinião, era um partido guerreava o governo? Guebuza quer infantilizar o povo com um falso patriotismo. O coordenador do Comando Conjunto - Armando Guebuza - e o coordenador do Comando Operativo - Filipe Nyusi - que diz que não sabia da existência da MAM e EMATUM, são todos eles uns grandes mentirosos.
Guebuza aproveitou para passar em revista as realizações do seu governo. Disse que o país não poderia ter ficado paralisado com a contratação de uma dívida de 2.2 biliões de dólares, pois 88Moçambique tinha, quando ele passou as pastas para o seu sucessor, no stock da dívida pública, 9 biliões de dólares, mas não esteve parado. Porém, não disse se os 9 biliões de dólares foram ou não roubados como foi com os 2.2 biliões de dólares.
O povo não é burro nem é estúpido para se deixar enrolar em mentiras grosseiras.
CANAL DE MOÇAMBIQUE – 27.04.2022