Por Edwin Hounnou
O Presidente da República Portuguesa, Professor Doutor Marcelo Rebelo de Sousa, esteve de visita a Moçambique, de 17 a 20 de Março. Por todos os lugares por onde passou deixou a sua marca – próximo das pessoas, de trato fácil, conversa com todos, vai ao barbeiro, engraxa sapatos na rua, pára a sua caravana, que anda de janelas abertas, para comprar amendoim, sem receios nem cerimónias. Marcelo vem ensinar que é possível governantes e governados conviverem no mesmo espaço sem se empurrarem uns aos outros nem se insultarem como a nossa polícia anda a maltratar o povo. Diferente do que estamos habituados a ver dos nossos governantes, Marcelo anda a pé, distribui beijinhos por senhoras e crianças e pousa para fotografia. Ninguém tem medo de chegar perto dele. A sua segurança não enxota nem impede que alguém chegue perto dele. Isso não é possível acontecer com o nosso Filipe Nyusi. Ai de quem se atrever chegar perto sem autorização, pode ser preso ou baleado.
Entre nós, o povo só se aproxima dos dirigentes, em épocas eleitorais. Cantam e dançam, sentam-se na esteira ao lado do povo, comem chima com matapa com as mãos. Quando as eleições passam, ninguém se aproxima do presidente, ninguém fala com ele, a menos que seja escolhido para dizer algumas palavras, já ensaiadas, em comícios a fim de dar a impressão de que o povo fala com o seu “timoneiro”. Sabe-se que tudo isso não passa de uma encenação. A nossa democracia é de fachada. Por onde passa o Presidente da República todos os utentes da via são obrigados a parar e encostarem-se nas bermas da estrada. Viaturas, motorizadas e bicicletas ficam imobilizadas. O carro da polícia vai a frente com megafone, aos gritos, manda a se afastarem a todos da via. A polícia faz isso quando escolta a Presidente da Assembleia da República, Primeiro-ministro, presidentes do Conselho Constitucional, Tribunal Supremo e do Tribunal Administrativo.
Na Beira, acompanhei de perto a visita de Marcelo àquela urbe quando acabava de ser fustigada pelo Idai. Fiquei vislumbrado pela sua simplicidade e trato simples. Durante o almoço, num dos hotéis da cidade, dispensou a nossa PRM que havia sido destacada para o escoltar. Não havia nenhuma mesa especialmente reservada para Marcelo. Sentou-se numa mesa qualquer e serviu-se sozinho. Quem quisesse falar com ele, bastava aproximar-se e o resto corria normalmente. Não havia protocolo para inscrição ou saber o que deseja nem “gorila” por perto pronto a intervir. O que a gente vê Marcelo na bicha do mercado para pagar a sua conta na praia a tomar banho como qualquer cidadão, é a maneira de ser do Presidente Marcelo. Não é nenhuma propaganda enganosa. Marcelo é um homem simples. Ninguém é escorraçado por se aproximar dele ou sentar-se à sua mesa. Em Maputo e Chimoio, Marcelo meteu-se entre a gente e deixava-se fotografar. As redes sociais têm provas bastantes daquilo que escrevemos.
Marcelo diz, de forma insistente, que Moçambique é sua segunda pátria e não é nenhuma mentira. Viveu, com pai, o então governador-geral Rebelo de Sousa da província ultramarino de Moçambique, no Palácio da Ponta Vermelha e frequentou o ensino liceal na então cidade de Lourenço Marques. Portanto, protocolarmente, Marcelo é hospede, visitante em representação de um estado estrangeiro e amigo, porém, de facto, é, também, tão moçambicano quanto a qualquer um de nós . Quando Marcelo mantém a sua postura habitual, é por saber que, também, é filho da nossa terra, coisa que os nossos governantes não se atrevem fazer nem de perto nem de longe.
Os nossos governantes poderiam se portar como Marcelo. Nós tememos ser golpeados pela polícia, por isso, não chegamos perto de Nyusi nem dos seus ministros. Para não corrermos o risco de nos partirem as pernas ou os braços, preferimos ficar longe deles. Aprendemos que quem não deve não teme, mas, os nossos governantes vivem distantes do povo. Não se misturam com os pobres. Por vezes, vemo-los em províncias assoladas por calamidades naturais, debaixo de guarda-chuvas, assegurado por um filho de alguém, como se fossem amputados. Uma vergonha! Cada aparição de Marcelo é uma lição para os que se escondem do povo. Marcelo é um bom exemplo. É governante de outro nível. Pudera que Moçambique, também, tivesse dirigentes do peso de Marcelo.
CANAL DE MOÇAMBIQUE – 06.04.2022
NOTA: E nem consigo imaginar comportamento semelhante de qualquer um outro chefe de estado em qualquer uma das suas ex-colónias. E, por muitos erros que hajam sido cometidos, não há irmandade igual à de Portugal e as suas ex-províncias ultramarinas. "Irmandade" muito mal aproveitada pelos actuais dirigentes, talvez com exepção de Cabo Verde.
Fernando Gil
MACUA DE MOÇAMBIQUE