A Justiça norte-americana, que marcou para o próximo dia 22, no tribunal de Brooklyn, em Nova Iorque, a primeira audição do processo das dívidas públicas ocultas de Moçambique, cita o nome do antigo Presidente Armando Guebuza como tendo recebido subornos para viabilizar o financiamento de uma empresa estatal
Víctor Carvalho
O nome do antigo Presidente de Moçambique Armando Guebuza foi pela primeira vez citado pela Justiça norte-americana como tendo recebido subornos para autorizar o financiamento da empresa estatal Proindicus, através da Privinvest.
No despacho de acusação, os procuradores norte-americanos usam a correspondência trocada entre outros acusados para tornar claro que altos responsáveis do Ministério da Defesa, do Interior e Força Aérea, em 2011, também terão beneficiado, mas não apontam especificamente o nome do antigo ministro da Defesa e actual Presidente da República, Filipe Nyusi, de acordo com documentos a que a agência Lusa diz ter tido acesso.
O nome de Armando Emílio Guebuza surge na citação da acusação através da referência a um e-mail de Novembro de 2011 que Jean Boustani, o libanês que negociou os empréstimos em nome da Privinvest, recebeu de uma pessoa cujo nome está rasurado, mas que a acusação sabe quem é, no qual se lê: “Para garantir que o projecto tem luz verde do Chefe de Estado (à data Armando Guebuza), um pagamento tem de ser combinado antes de chegarmos lá, para sabermos e acertarmos, bem antes do tempo, o que tem de ser pago e quando”.
A acusação refere que menos de um mês depois, “os acusados acordaram o pagamento de 50 milhões de dólares em subornos e luvas a membros do Governo de Moçambique e 12 milhões de dólares em luvas para os co-conspiradores da Privinvest”.
Na quarta-feira, o advogado de Armando Guebuza garantiu à imprensa moçambicana que o seu cliente não era alvo de qualquer mandado de captura, desmentindo assim rumores que davam como certo o pedido de detenção do antigo Presidente caso este saísse do país, como sucedeu com o antigo ministro das Finanças, Manuel Chang.
Audição arranca dia 22
Manuel Chang deve começar a ser ouvido dia 22 deste mês por um tribunal do distrito de Brooklyn, Nova Iorque, devendo por isso ser extraditado antes dessa data da África do Sul, onde se encontra detido, para os Estados Unidos. Chang vai comparecer esta terça-feira num tribunal de Joanesburgo para ouvir a decisão da Justiça sul-africana sobre o pedido de extradição para os Estados Unidos.
A data para a primeira audição do processo das dívidas públicas ocultas de Moçambique foi marcada a pedido dos procuradores federais e fixada pelo juiz principal, William Kuntz.
Na quinta feira, as autoridades britânicas prenderam em Londres, a pedido da Justiça dos Estados Unidos, três antigos banqueiros do Credit Suisse envolvidos nos empréstimos a empresas públicas moçambicanas, realizados à margem das contas, no valor de mais de 2 mil milhões de dólares.
Quase na mesma altura, o bastonário da Ordem dos Advogados de Moçambique considerou que a detenção do ex-ministro das Finanças na África do Sul constitui um embaraço para o país, constituindo uma resposta internacional à incapacidade da Justiça moçambicana.
“Esta situação embaraça, sobremaneira, o nosso país. Quer dizer que nós não conseguimos resolver os nossos problemas” e “tem de haver intervenção internacional”, disse Flávio Menete.
Flávio Menete assinalou que os Estados Unidos estão a defender os seus interesses, ao pedirem a extradição de Manuel Chang, tendo em conta que os factos que são imputados ao antigo ministro constituem um crime ao abrigo da legislação americana.
“É uma situação bastante embaraçosa e vergonhosa”, insistiu Flávio Menete, antigo director-nacional da Polícia de Investigação Criminal de Moçambique.
Também os dois principais partidos da oposição, Renamo e MDM, consideram que a detenção do ex-ministro das Finanças Manuel Chang mostra a “incompetência vergonhosa” da Justiça do país e da “desorganização do Estado”.
Aqueles dois partidos defendem que a Justiça moçambicana deveria reivindicar para si o julgamento deste processo, pois entende que seria essa a única forma de que o dinheiro envolvido nessa suposta fraude voltasse para os cofres do Estado.
JORNAL DE ANGOLA – 06.01.2019