PORTUGAL - O único país do mundo que escolheu, como dia nacional a morte de um poeta (2)
Por Francisco Nota Moisés
Aline Gallasch-Hall DB · Professora universitária, Deputada na Assembleia Municipal de Lisboa
Portugal- O único país do mundo que escolheu, como dia nacional, não a data de uma batalha, de um tratado, ou da independência.
Mas o dia da morte de um poeta.
Isso diz muito do que é ser português.
E eu acho isso maravilhoso.
Eu amo Portugal!
Duvido muito se entre aqueles de nós que ainda sobramos neste mundo passageiro, há estudantes do antigo seminário do Zóbuè que ainda se lembram do que se passou no dia 10 de Junho de 1965 em Zóbuè. O evento sobre o qual faço recordações aqui não aconteceu no seminário, mas falado, comentado e vivido no seminário do Zóbuè.
O seminário do Zóbuè com alunos das regiões de Sofala, Manica, Tete e Zambézia era um Monastério fechado a toda gente incluindo aos nativos da região com residências no mínimo de um quilómetro ou mais do seminário com uma vida austera e uma disciplina que os espartanos admirariam ou mesmo invejariam. Mas para o dia 10 de Junho de 1965, sendo um feriado por ser o dia de Portugal, foi decidido que iriamos a Vila do Zóbuè para uma missa campal ao ar livre que foi dita por um padre da Missão católica de Zóbuè que detinha a jurisdição pastoral na zona do Zóbuè como o seminário não era uma missão.
Nós os estudantes descemos a pé a Vila de Zóbuè, que está a 4 quilómetros ao sul, e chegamos lá na altura da missa que começou por volta das 10 horas na presença de residentes brancos e gente nativa e suas raparigas bem vestidas e formosas. Ao ver as raparigas, o demónio me entrou na cabeça e pensei que não seria padre visto que estava destinado a uma vida mundana dedicada a aventuras com raparigas, o que veio acontecer em Nairobi no Kenya onde vim depois a me casar com uma rapariga queniana.
Na ocasião que o padre que rezava a missa fazia genuflexões durante o Ofertório com dois soldados ao seu lado apresentando armas, houve uma começo que abalou toda a gente com a chegada dum homem da PIDE que sussurrou ordens a outros homens da PIDE que o seguiram para o posto de migração fronteiriço.
Finda a missa, comemos e regressamos ao seminário depois do por do sol. Eu e os meus amigos Emílio António e Manuel Tomé decidimos cobrir a distância de 4 quilómetros numa maratona doida que durou exactamente 45 minutos. Chegamos molhados de suor e fomos ao balneário para tomarmos o banho.
Foi só no dia seguinte que ouvimos alguma coisa sobre o mistério visto no dia anterior na Vila de Zóbuè. O padre espanhol José Molina tinha alguns amigos entre a gente da PIDE que lhe disse que um dos grandes dos terroristas vindo de carreira de Blantyre no Malawi tinha se entregue às autoridades, O senhor Baltazar Chagonga de Tete, líder da Unami (União Nacional para um Moçambique Independente) que tinha tomado a sua organização para se filiar à Frelimo que tinha sido formado por aderentes da Udenamo e a Manu em Acra no Gana em Fevereiro de 1962.
Por 1965, a Frelimo sob Mondlane, já se tinha tornado numa organização altamente terrorista dominada por sulistas de Manjacaze, Gaza, forçando alguns dos lideres a irem a Lusaka, Zâmbia, onde depois formaram o Coremo.
Changonga não foi um deles. Decidiu entregar-se aos portugueses e foi levado para Tete naquele mesmo dia da sua rendição. Antes do fim daquele dia, muita tropa chegou em Zóbuè, Parece que durante o interrogatório, o antigo chefe terrorista disse que os terroristas da Frelimo iriam atacar através do Zóbuè, o que regime do Banda no Malawi não iria permitir. Eram somente os regimes do Julius Nyerere da Tanzânia e de Kenneth Kaunda que permitiam incursões terroristas através dos seus territórios.
A tropa agora baseada em Tete vinha buscar água do seminário que obtinha água canalizada duma montanha ao norte. Apesar de ser uma zona montanhosa, Zóbuè não está abençoado com rios ou riachos com água limpa e jogos de futebol eram frequentes entre a tropa e os seminaristas que sempre ganhavam contra a tropa.