Procurado pela África do Sul e pela Interpol, Simon Valoi foi capturado em Maputo. Ao longo dos anos construiu uma rede baseada em subornos para escapar às investidas das autoridades
É conhecido no mundo de crime por Navarra, mas o seu nome verdadeiro é Simon Valoi. “Boss Navarra”, como é carinhosamente chamado em Mavoze, pequena localidade do distrito moçambicano de Massingir, província de Gaza, a cerca 300 quilómetros de Maputo, foi detido quinta-feira, na capital do país, na posse de cornos de rinoceronte. Era procurado pela polícia sul-africana e pela Interpol.
Valoi estava na companhia de outro presumível caçador furtivo, Paulo Zucula, conhecido por Paulito, natural e residente na Cidade de Chókwè, a 90 quilómetros de Massingir. Paulo Zucula é familiar do falecido Félix Zucula, antigo traficante de viaturas roubadas na África do Sul para Moçambique, por sinal, a mesma atividade que Navarra exercia antes de entrar no lucrativo mundo da caça furtiva.
Navarra lidera há décadas um sindicato de caça furtiva no parque Kruger, na África do Sul. Conhece como ninguém os corredores de comércio de cornos. Nunca viaja para fora do país, porque é procurado há mais de dez anos. Os seus movimentos fazem-se dentro de Moçambique, sobretudo nas províncias de Gaza e Maputo, onde tinha garantia de que não seria detido.
O homem agora detido não é operacional, é mandante. Tinha equipas de operacionais (caçadores) que incluíam oficiais da polícia e das forças armadas no ativo e desertores. Houve um tempo em que pagava 200 mil meticais (perto de 3000 euros na altura) por cada caçador que conseguisse trazer da caça um troféu (nome atribuído ao corno de rinoceronte).
CARIDADE COMPRA POPULARIDADE
Em Mavoze e Massingir é, para todos, “Boss Navarra”. Conhecido pelas suas ações de caridade, é por isso um protegido da população local. Controlava o Estado a nível local e provincial, desde a polícia até aos órgãos da justiça, como a procuradoria.
A maioria das armas usadas pelos de Navarra era da Polícia da República de Moçambique. O aluguer de uma arma custava 650 mil meticais (cerca de 9000 ), o mesmo preço de uma munição. Há indícios de armas de fogo apreendidas pela polícia, mas que dias depois eram retiradas e entregues, em regime de aluguer, de novo aos caçadores.
Exemplo disso é uma arma do tipo Mauser 375, própria para a caça de rinocerontes, que foi apreendida três vezes entre 2008 e 2011. Da primeira vez foi recuperada pela Guarda Fronteira, em 2008, em Pumbe, uma das localidades de Massingir, e depositada no comando Distrital da Polícia em Massingir. A segunda vez foi a 26 de agosto de 2010, quando a mesma arma foi recuperada na região de Godji, pela mesma Guarda Fronteira, e imediatamente entregue ao comando distrital de Massingir.
A última vez foi a 30 de dezembro de 2011, quando foi apreendida nas mãos de Luís Mongue, caçador furtivo, em Massingir. Mongue viria a ser solto por ordens do comandante distrital local mediante pagamento de suborno de 120 mil meticais (cerca de 1700 euros, nessa altura).
EXPRESSO(Lisboa) – 29.07.2022