- Como a corrupção e má governação prejudicaram o Estado em 47 anos de independência
- O país está diante de Estados falhados como Burundi e Somália
- Nível de pobreza aumentou desde 2015, período que coincide com mandato de Nyusi
- Há cada vez mais famílias que só conseguem fazer uma refeição por dia
- “A pobreza tem a ver com problemas de governação e corrupção”, Elcídio Bachita
Há cerca de um mês, os moçambicanos assinalaram a passagem de 47 anos da independência de Moçambique, mas há poucos motivos para celebrar. Apesar de ser rico em recursos naturais e estar independente há várias décadas, o país é, neste momento, o terceiro mais pobre do Mundo, segundo dados do Banco Mundial, ficando somente abaixo de Estados considerados falhados como o Burundi e a Somália, o que pode ser o espelho de sucessivos falhanços nas políticas governamentais, altos níveis de corrupção e má gestão da coisa pública. O nível de vida dos moçambicanos degradou-se sobretudo desde 2015, período que coincide com o arranque da governação de Filipe Nyusi, que encontrou o país como o 7º país mais pobre do mundo e o conduziu ao top três, com indicadores cada vez mais preocupantes. A mais nova actualização dos países mais pobres do mundo só veio confirmar a cada vez mais crescente degradação do nível de vida dos moçambicanos, numa altura em que algumas famílias já só conseguem colocar à mesa uma refeição por dia. Especialistas não têm dúvidas de que o problema do empobrecimento do nosso país tem a ver com a fraca liderança, má governação e corrupção.
São 15 horas. Estamos no bairro Malanga. À passagem por um dos becos, chama atenção o choro de uma criança. “Cala-te” – grita a mãe, com um semblante que deixa transparecer algum desespero –. Pedimos licença numa humilde casa de madeira e zinco. “Entra” – responde surpreendida a mulher – e imediatamente aponta dois bancos improvisados debaixo de uma mafureira para nos sentarmos.
Os meninos que brincavam num dos cantos de um apertado quintal com duas construções idênticas fitam olhar na nossa equipa de reportagem. A mãe se aproxima e logo nos apresentamos. “É para sairmos, aonde?” – insiste, ao que voltamos a esclarecer que se trata de um jornal.
A criança no colo desata a chorar. No meio ao desespero, a mulher chama um dos meninos e ordena – “vai dizer a Tia Cecília dar-te um biscoito e diga que irei pagar” – a criança sai a correr e volta num instante. Afinal, naquele local, praticamente todos vivem entulhados. Prontos, com um biscoito na mão a criança fica sossegada e finalmente podemos começar o trabalho.
A mulher, de seus 47 anos, corpo a aparentar mais idade, responde pelo nome de Zélia Sitoe. É mãe solteira e com cinco bocas para alimentar. São três filhos e um irmão mais novo. A uma pergunta da nossa reportagem sobre o custo de vida, responde com meia frase: – “ei, a vida está difícil, está mal aqui em casa”.
Procuramos saber porquê a mulher olha para baixo, observa uma pausa, e começa a desabafar: – “A vida está difícil. Desde que voltei do lar e os meus pais mudaram-se para Mahubo, deixando-me com a casa, a situação piorou. Vivo com meu irmão adolescente e os meus três filhos, e as coisas tendem a piorar. Antes, com o tomate e a banana que vendo aqui no quintal, conseguia alimentar a minha família, mas agora a situação mudou. O tomate está caro e o negócio já não anda, praticamente. Há dias que para conseguir 50 meticais é muito difícil e quando é assim, às vezes, dormimos com fome. Só desenrascamos qualquer coisa para as crianças menores não chorarem a noite toda”, desabafa.
A família de Zélia é apenas um exemplo do quão as famílias moçambicanas ficaram mais pobres nos últimos anos. Os números não mentem. Segundo o Banco Mundial, Moçambique é o terceiro país mais pobre do mundo, com base na Renda Nacional Bruta (RNB) per capita, estimada em $ 460 dólares.
Os países mais pobres do mundo são classificados como economias de baixa renda no sistema de classificação de quatro níveis do Banco Mundial. Esse ranking é baseado na renda nacional bruta (RNB) per capita de cada país, que é uma medida da renda total do país dividida por sua população. O RNB é muito semelhante ao Produto Interno Bruto (PIB) per capita. Ambas as métricas medem o valor em dólares de todos os bens e serviços produzidos em um determinado país, mas o RNB também inclui a renda obtida por meio de fontes internacionais (como investimentos estrangeiros ou imóveis). Por esse motivo, o RNB é considerado uma medida um pouco mais precisa da saúde económica de um país.
Sob o sistema do Banco Mundial, os países de baixa renda são nações que têm um RNB (ajustado ao dólar americano actual) inferior a U$ 1.046 em 1º de Julho de 2021.
Moçambique só é menos pobre que Burundi e Somália
Entre os países mais pobres do mundo, Moçambique, independente há mais de 40 anos e com enormes reservas de recursos naturais, só fica atrás do Burundi e Somália, dois Estados falhados que ocupam a primeira e segunda posição, respectivamente, e que têm sido governados de forma sazonal.
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