Prefácio
Neste livro, são várias as tramas que passam pelo urdume do tema principal: o desmontar entre os africanos, depois que os portugueses ocuparam militarmente os territórios do atual Moçambique, dos seus ritmos e regimes tradicionais de trabalho, com a quebra de sua divisão
por sexo, idade, grupos sociais, estações do ano e o correr do dia. Usaram para isso os mesmos recursos que outros colonizadores europeus, no fim do século XIX e na primeira metade do seguinte: a cobrança de imposto (aqui por cabeça, mais adiante por cubata), o combate à chamada vadiagem, a disseminação de novos objetos de consumo e, finalmente, a corveia. Esse processo de doloroso desarraigamento dos africanos, bem como a história das violências que sobre eles se exerceram, é narrado neste livro com tamanha vida, minudência e rigor, que Valdemir Zamparoni parece não apenas haver lido os documentos a que teve acesso, mas ter neles entrado com a alma inteira, para reviver as situações que descrevem. Daí que à sua prosa fácil, clara e corrida, não falte o tom da testemunha indignada.