ten-coronel Manuel Bernardo Gondola
Hoje, eu vou falar de epistemologias do Sul, que é um assunto que vem me sendo muito pedido há bastante tempo por meio do meu correio eletrónico.
Elas foram criadas por um autor português chamado Boaventura de Sousa Santos, e eu resolvi retroceder um pouquinho no pensamento dele, porque na década de [80], ele publicou um artigo que ficou muito famoso que se chama «O Discurso sobre as Ciências». Lembrando, que nesse artigo ele fala muito da necessidade de rompimento das ciências naturais em relação as ciências humanas. É a necessidade de romper com esse paradigma dominante com essa necessidade de fazer ciência com base num positivismo lógico, positivismo empírico ou qualquer outro tipo de marco metodológico que seja amarado abstractivamente dado e que, não possa ser modificado sob pena daquilo não ser considerado ciência.
Boaventura, também escreve sobre a necessidade de a gente romper com necessidade de só fazer ciência quantitativa, ou seja, ciência baseada em relações numéricas, em tabelas e, da validade de você fazer ciência qualitativas. Ele nos ensina, que a ciência deve ser sempre local, porque ela deve levar em consideração o local de fala daquele que está elaborando aquele conhecimento.
Boaventura, também nos ensina, que a ciência deve ser de auto-conhecimento, porque o pesquisador, à medida que ele pesquisa ele transforma o objecto de pesquisa e se transforma também e, por isso é uma ciência de auto-conhecimento, além disso, a ciência deve ser uma ciência baseada no senso comum.
Parece até estranho afirmar, que a ciência deve ser baseada no senso comum. Mas, o que é que Boaventura nos ensina? Nos ensina, que o senso comum não leva em consideração rigores metodológicos, quer dizer, ele está aberto ao que a sociedade tem a dizer, ao que aquela comunidade tem a dizer e por isso, a ciência teria que ser baseada nesse conhecimento de senso comum. Porém, o conhecimento do senso comum um arcabouço metodológico válido pode-se tornar muito autoritário e essa união das premissas do senso comum de estarem abertas as oportunidades de conhecimento social existentes em cada localidade somadas a uma metodologia científicas adequadas é que vão fazer ciência.
Note-se que, quase trinta anos depois Boaventura, foi desenvolvendo a sua teoria até em 20[09], publicar o livro chamado «Epistemologias do Sul», nesse tempo todo ele foi 'construir' um pensamento onde ele faz uma análise do globo em que, países do Norte e países do Sul, mas essa análise não é geográfica é política é, a forma que Boaventura de Sousa Santos, tem se referido aos antigos países que eram chamados terceiro-mundo, que hoje em dia sempre falo para os meus estudantes, que é uma terminologia muito pejorativa, se utilizar países do terceiro-mundo, países subdesenvolvidos; não se deve utilizar esse tipo de nomenclatura, nem em conversa e na escrita, porque é uma terminologia que 'remonta' a conceitos muito preconceituosos de que, um país seria desenvolvido e outro seria subdesenvolvido, apenas porquê está economicamente marginalizado da economia dominante global euro-americana.
Por essa razão, Boaventura chama esses países periféricos de países do Sul, e aí. agente inclui países da África, da Ásia, América-Latina e, os países do Norte seriam os países economicamente dominantes; países europeus, os Estados Unidos e, ele faz essa divisão para apontar até em relação aos direitos humanos, que a bandeira dos direitos humanos tão proclamada no pós-guerra fria, de fazer com que os países do Norte, fossem os maiores violadores de direitos humanos e não os países do Sul. E os países do Norte utilizavam os direitos humanos como uma bandeira para continuar colonizando de uma nova forma esses países do Sul, através da imposição dos direitos humanos, da democracia como única forma de Governo válido.
Para tratar das epistemologias do Sul, Boaventura chama epistemologias, porquê? Ele fala do diálogo intercultural. As cultura devem dialogar entre si sem que uma tente se sobrepor a outra, sem que haja uma predominância, mas um diálogo intercultural que faria com que, essas culturas pudessem unir características de uma e de outras e conseguir intercambiar conhecimentos, por isso, epistemologias do Sul e não epistemologia no singular, porque elas são muitas, elas se referem ao conhecimento produzido em todos esses países periféricos e que foi tratado pela epistemologia dominante, que Boaventura chama de pensamento abissal.
Boaventura, nos ensina que temos que romper com esse pensamento abissal, com esse pensamento dominante para valorizar o conhecimento produzido em cada uma dessas localidades diferentes. Então, agente vai falar de tradições orais como o griô aqui na África, que é uma pessoa que tem todo o saber cultural duma determinada região de forma oral e não escrita, portanto é um saber de conhecimentos não escritos é, você não tratar a priori nenhum tipo de conhecimento como idolatria, como bruxaria, como senso comum de uma forma pejorativa.
Na verdade, Boaventura, propõe um paradigma de conhecimento emergente que venha também do Sul e não só do Norte, que valorize o conhecimento local desses países, a história de produção de conhecimento desses países[povos] para que agente fuja da colonização epistémica, da colonização do saber, dessa dualidade mente/corpo cartesiana, que nos foi imposta pelo conhecimento europeu desde a ascensão do racional na época do iluminismo.
Além do pensamento abissal, Boaventura nos ensina, que você não agir dessa forma você está a cometer um verdadeiro 'epistemicídio', é um outro conceito de Boaventura, ele tem a sua fundamentação da linguagem vinda do 'genocídio’, da palavra 'genocídio' no Estatuto de Roma e ele aponta para o 'epistemicídio', que seria a [dizimação] do conhecimento local, seria o 'genocídio' da epistemologia desses países, da forma de produção do conhecimento desses países.
Então é +- isso a questão das epistemologias do Sul. Mas também temos um outro movimento, que se completamente a teoria das epitimologias do Sul do Boaventura, que se chama movimento modernidade, modernidade colonialidade, o movimento de(s)colonial. Ele é exposto por exemplo pelo Aníbal Quijano, Enrique Dussel , que não se contrapõe ao pensamento de Boaventura ,mas não é idêntico a ele existem determinadas particularidades até porque todo esse movimento de construção de novos saberes ele vai ser necessariamente heterogéneo para dar conta das particularidades , da pluralidade do conhecimento no mundo e não um conhecimento puramente focado na colonização europeia feita ao restante do mundo como agente sabe que foi a nossa história, a história da humanidade de colonização.
Manuel Bernardo Gondola
Maputo, aos 29 de Novembro, 2022