ten-coronel Manuel Bernardo Gondola
Na última carta, eu mostrei como foi todo o processo que deu iniciou a primeira guerra do Congo-Zaire, hoje, vou falar justamente sobre como essa história ainda continua.
Como mostrei a primeira guerra do Congo-Zaire começou, a partir duma Aliança entre Laurent Kabilá, que liderava um grupo de guerrilha interna no Congo-Zaire, que se aliou a Uganda e a Ruanda que tinha interesses contra o Governo de Móbutú que era o ditador do Congo-Zaire. O Móbutú, tinha um problema que acomete diversos regimes autoritários, que é uma certa tendência de lideranças, de burocratas serem promovidos, subirem suas carreiras muito mais por lealdade, confiança, do que, por competência.
O Móbutú, por ficar muito anos no poder e por ter uma ditadura altamente violenta e corrupta, tinha muitos inimigos internos dentro do país, por isso, ele temia pela própria vida, assim para ele compor um grupo de ministros, de pessoas que formassem administração do país, ele contava muito mais com pessoas que lhe fossem próximas, com pessoas que lhe tivessem fidelidade, do que, com pessoas que tivessem competência.
Na verdade, boa parte do alto escalão do seu Governo era composto por pessoas que vieram da Vila onde ele nasceu e esse grau de desestruturação afectará as próprias Forças Amadas [FA]. Logo, essa união [Aliança], entre o Kabilá com o Ruanda e Uganda, não encontrou muita resistência; as FA do Congo-Zaire eram muito frágeis, se estão lembrando, foi questão de apenas meses, [6] messes para que as Forças da Aliança pudessem chegar a Kinshasa, Capital do país e dessa forma tirar o Móbutú do poder.
Móbutú, foi para o exílio, ele nessa época já estava sofrendo de câncer de próstata e poucos meses após ter sido derrubado ele veio a falecer em Marrocos. Laurent Kabilá, autodeclarou-se presidente do Congo-Zaire no dia [02] de Maio de 19[97], e ele renomeio o país; o país deixou de ser chamado Zaire e voltou a se chamar Congo. O Kabilá, mostrou-se competente enquanto uma liderança militar, enquanto uma liderança de guerrilha, mas ele não foi tão bem-sucedido no momento desse tornar uma liderança política. O seu perfil era mais autoritário algo típico de militarismo e teve bastantes dificuldades para conseguir negociar e para fazer todas as relações que são tão necessárias dentro do meio político.
Muitos grupos que achavam que haveria uma 'guinada' para uma democracia por eleições acabaram se tornando, tanto quanto desapontados, porque o Kabilá acabou centralizando o poder nas suas mãos e, aos poucos isso foi desagradando diversos sectores dentro do país.
O Ruanda e o Uganda, tinham suas tropas dentro do Congo-Zaire, Ruanda aproveitou essa Aliança para conseguir perseguir aqueles inimigos, aquelas pessoas que fizeram parte do massacre, do genocídio do Ruanda e que estavam dentro do Congo-Zaire. Ao longo do tempo, Kabilá começou a Constituir o seu Governo, ele herdou um país totalmente destruído após três décadas de corrupção e pilhagem nas mãos do Móbutú e ele foi se estabilizando e, enquanto presidente ele começou a criar o seu próprio grupo, a sua própria estrutura de Governo e com isso, ele passou a se tornar menos dependente das tropas externas que estavam no Congo-Zaire.
A partir, do momento em que ele conseguiu essa autossuficiência, a partir, do momento em que conseguiu se sustentar por conta própria no cargo; o Uganda e o Ruanda passaram a tornarem-se aliados desnecessários, destarte ele acabou não rompendo, mas acabando com essa Aliança e pedindo para que o Ruanda e o Uganda se retirassem seu território e essa decisão desagradou, tanto ao Governo do Ruanda quanto ao Governo de Uganda.
O estilo autoritário de Kabilá, também começou a desagradar determinados grupos que temiam por perseguição étnica, e neste caso o principal grupo eram os Tutsi. O medo de sofrer uma represália, de sofrer uma perseguição étnica sob o Governo Kabilá, fez com que, uma nova Organização começasse a surgir na região de Banyamulengué que era de maioria Tutsi. Esse grupo se levantou no dia [02] de Agosto 19[98] contra o Governo do Kabilá, o Uganda e o Ruanda apoiaram esses grupos e invadiram novamente o Congo-Zaire e dessa forma começou então em Agosto de 19[98] a segunda guerra do Congo-Zaire.
Se a primeira guerra do Congo-Zaire foi muito rápida durou poucos meses e não encontrou uma grande resistência, já a segunda guerra foi bastante complexa encontrou muito mais atores participado, a divisão interna no Congo-Zaire foi bastante maior e isso envolveu ainda uma quantidade maior de países no conflito.
Kabilá, como ainda tinha umas FA muito frágeis precisou recorrer a países estrangeiros e, conseguiu trazer como aliados países como; Angola, Zimbabwe e o Chade para ajudarem na defesa do seu Governo. O caso do Zimbabwe envolve directamente a questão da mineração, porque o Kabilá justamente comprou o apoio do Zimbabwe, pagou para que o Zimbabwe levasse as suas FA e o protegessem.
A questão da mineração ficou muito evidente o quanto a disputa pelos recursos minerais faziam parte de todo esse conflito militar. por exemplo, muitos grupos. estavam porque querendo defender, determinar quem teria a hegemonia justamente nessas áreas de maior mineração em especial na região do Katanga, que é a maior produtora de diamantes e maior mineração no Congo-Zaire.
Internamente, essa nova guerra criou diversas faccões e se levantaram e com essas faccões surgiram, também diversas lideranças políticas que queriam tornar-se o sucessor do Kabilá, caso ele viesse a cair. Por isso, vamos ter o Governo apoiado por Zimbabwe, por Angola e pelo Chade, contra novos grupos internos, novos grupos de guerrilha que surgiam fortalecidos pela invasão do Ruanda e do Uganda.
Esse novo conflito foi muito mais sangrento e é dele em que vai acontecer diversos actos de genocídio, em que aconteceu enorme violência contra a população civil, há relatos de Vilas em que populações civis inteiras foram completamente dizimadas, há relatos de famílias inteiras que foram executadas por soldados, há Vilas em que todas as mulheres foram estupradas.
A quantidade de pessoas em situação de refugiados disparou e muitas tiveram que abandonar as suas casas para fugir dos confrontos. E abandonar a cassa significa ficar sem a fonte de renda, no caso de populações rurais significa ficar sem a colheita, significa ficar sem aceso a água potável, sem medicações, e em decorrência disso a quantidade de mortes vai ser ainda maior.
Em 19[99], aconteceu uma mudança política bastante brusca nessa guerra, que foi o rompimento entre o Ruanda e o Uganda. Ou seja, os dois países que até então eram aliados entraram em conflito no interior do Congo-Zaire. Destarte, Ruanda e o Uganda entraram em guerra em um território estrangeiro e, o conflito existente entre eles dentro do Congo-Zaire foi dos momentos mais violentos de toda a guerra.
O princípio da mudança, do que, levaria ao desfecho dessa guerra começou em Janeiro de 20[01], quando Laurent Kabilá foi assassinado por um dos seus guarda-costas. Nisso, surgiu então o 'vácuo político' dentro do Congo-Zaire e a pessoa que acabou sendo levantada para ocupar esse lugar foi o filho do Laurent Kabilá, o Joseph Kabilá. O Joseph Kabilá era uma figura bem diferente do seu pai, enquanto, Laurent Kabilá era uma figura mais militar, era uma figura mais focada na ordem, uma figura mais autoritária, o Joseph Kabilá era uma figura mais pragmática, mais conciliadora, mais negociadora, ou seja, não teria o mesmo perfil do seu pai. Destarte, foi visto como alguém que conseguiria pegar esses diversos grupos divergentes dentro do país e unir. Portanto, sob essa a nova direcção do Joseph Kabilá é que começou uma negociação de paz para todo esse conflito.
Foi apenas no ano de 20[03], em que, cerrou-se toda a beligerância no Congo-Zaire, o Acordo de paz foi assinado que continuou alguns confrontos internos entre grupos étnicos no Congo-Zaire, mas nada que fosse comparado a guerra. Nesse período todo como já citei na carta anterior as mortes há quem estime em [3] milhões de pessoas até [5] milhões, além da quantidade de vidas perdidas temos todo um prejuízo económico e toda uma perda material.
O Joseph Kabilá, assumiu como presidente pegando o seu país, surgido tanto pelos anos em Móbutú ficou no poder, tanto pela destruição causada pela guerra. Joseph Kabila ficou no poder de 20[03], quando foi nomeado formalmente nomeado como presidente, anteriormente a isso era uma espécie de Governo de transição para se tentar chegar a um Acordo de paz e ficou no poder até ao ano de 20[19], ele foi sendo reeleito sucessivamente.
O Yoweri Museveni e Paul Kagamé, são respetivamente presidentes do Uganda e Ruanda, permanecem até os dias de hoje nos seus cargos. Esse, foi o conflito que envolveu atores diferentes, desde a hegemonia sobre a área de mineração dentro do Congo-Zaire, desde questões étnicas da história, desde que todo o legado, toda a sequência da África após o fim do colonialismo.
Enfim, o Congo-Zaire tem sofrido no período pós-guerra fria os momentos mais 'trágicos' de sua história, o país foi palco da primeira guerra e da segunda guerra do
Congo-Zaire, esta também chamada de guerra mundial africana, foi uma das guerras mais violentas do século [XX], da guinada do século [XX] para o século [XXI] e que, infelizmente é muito pouco falada apesar de todo impacto, tanto em vidas humanas perdidas, tanto em questões políticas, quanto em questões económicas.
Manuel Bernardo Gondola
Maputo, [31] de Janeiro de 20[23]