Na tomada de posse, o atual Presidente brasileiro sinalizou a pretensão de reatar as relações bilaterais com África. Moçambique está no radar de Lula da Silva. Mas o que nos diz o histórico político entre os dois países?
Entre 2003-2010, na área da cooperação internacional para o desenvolvimento, Moçambique foi o principal destino dos investimentos brasileiros, segundo dados do Ministério das Relações Exteriores do Brasil de 2010.
Indústria extrativa, construção civil, agricultura e saúde foram as principais apostas do consulado de Lula naquela época. O especialista em Relações Internacionais Enio Chingotuane analisa que "foi num período de boom dos recursos naturais das chamadas commodities internacionais e a economia internacional estava também em alta”.
Para Chingotuane, o Brasil conseguiu assim "somar ganhos comparados a outros anos”.
O especialista em relações internacionais alerta que em contra-mão para o 'sonho de Lula' também está a crise económica internacional. "Também o Brasil está a passar por vários desafios enconómicos. Daí que, pensar em altos voos para se lançar ao mundo, tenho dúvidas", acrescenta Chingotuane.
Mina de Moatize
O projeto de extração de carvão mineral, então liderado pela Vale Moçambique na bacia carbonífera de Moatize, na província de Tete, foi o principal investimento brasileiro realizado em Moçambique.
Na agricultura, através do ProSavana, as autoridades brasileiras em parceria com as japonesas disponibilizaram-se a financiar o projeto com cerca de 7 milhões de dólares americanos.
Mas todos estes projetos fracassaram. Em 2022 a Vale anunciou a venda da sua participação na mina de Moatize.
Estará Lula a pensar em novos projetos financeiros em Moçambique? O jurista e ativista social Júlio Calengo, baseado em Tete, está reticente.
"Não temos muitas grandes experiências em termos de investimentos brasileiros com sucesso", diz o jurista, acrescentando que "esta é a oportunidade que Lula tem para mudar as coisas".
Escândalos de corrupção
Enio Chingotuana considera que os escândalos financeiros envolvendo as empresas brasileiras em África serão a principal "pedra no sapato" para as pretensões do petista.
"Ele [Lula] não terá a mesma apetência para jogar as grandes empresas brasileiras para o mercado externo porque a cassação judicial que aconteceu contra ele teve a ver com os escândalos de corrupção das empresas como Odebrecht e outras empresas condenadas por envolvimento em escândalos de subornos", advoga o analista.
Em Moçambique, entre os projetos mal-parados está a construção do aeroporto de Nacala, executado pela Odebrecht e orçado em cerca de 125 milhões de dólares, financiados pelo Banco Nacional do Desenvolvimento Económico e Social (BNDES).
Este projeto está envolto a um escândalo de corrupção, envolvendo os antigos ministros moçambicanos dos Transportes e Comunicações, Paulo Zucula, e das Finanças Manuel Chang, acusados de terem recebidos mais de 385 mil dólares de suborno.
Caso aeroporto de Nacala
Este processo foi despoletado no caso da Lava Jato que envolveu o atual chefe do estado Brasileiro, Lula da Silva. Ao todo estima-se que a empreiteira brasileira usou cerca de 900 mil dólares de subornos a altos dirigentes moçambicanos.
Em dezembro, o Gabinete Central de Combate à Corrupção (GCCC) acusou o antigo ministro das Finanças, Manuel Chang, de ter beneficiado de dinheiro de corrupção para facilitar obras da empresa em Nacala e Beira.
A ativista social Fátima Mimbire acredita que com Lula da Silva no poder, no Brasil, está aberta uma porta de esperança para o esclarecimento do caso.
"Eventualmente ele é uma das pessoas que conhece bem a Odebrecht e isso pode ajudar muito no esclarecimento do caso", entende a ativista.
Mas por outro lado, Mimbire desconfia "se ele [Lula da Silva] tem alguma ligação a este escândalo e se não houver uma independência do sistema judiciário brasileiro e moçambicano ele pode influenciar o não esclarecimento do caso", conclui.
DW – 07.01.2023