Por Francisco Nota Moisés
Entre as 10 e 12 horas do dia 11 de Marco de 1968 um grupo de macondes revoltados contra a liderança da Frelimo de Eduardo Mondlane invadiram o escritório da Frelimo em Dar Es Salaam. Fazem agora 55 anos depois do acontecimento histórico que fez estremecer não somente a Frelimo, mas também toda a cidade de Dar Es Salaam e na verdade o mundo, tendo a Radio Clube de Lourenço Marques anunciado que tinha havido um tiroteio entre grupos armados hostis no escritório dos terroristas em Dar Es Salaam..
Estive na urbe tanzaniana antes do governo tanzaniano me ter evacuado com outros estudantes do então Instituto Moçambicano para o campo de refugiados sob tutela do Alto Comissariado das Nações Unidas para os refugiados em Rutamba no Distrito de Lindi na Província de Mtwara no sul da Tanzânia.
Os anais da história controlada pelos grandes dos terroristas da Frelimo não falam da revolta popular ou militante contra a liderança da Frelimo dirigida por Eduardo Mondlane, preferindo falar de reacionários e manchando o nome do Padre Mateus Pinho Gwenjere como causador da desordem no Instituto Moçambicano. Hélder Martins, um dos grandes dos terroristas da Frelimo, chegou mesmo de dizer que o padre Gwenjere era agente dos portugueses e que os portugueses não agiram para resgatar o sacerdote que se escapou antes que a Frelimo agisse contra ele.
Obviamente, Hélder Martins podia somente dizer a sua fantasia aos seus colegas mentirosos como ele na Frelimo. O Gwenjere não foi o causador da má situação que a Frelimo enfrentava, mas a causa foi sim o caracter altamente impopular, criminoso e assassino dos líderes da Frelimo com Mondlane, Joaquim Chissano, Marcelino dos Santos, Samora Machel e outros da raia deles como Alberto Chipande que matou o seu próprio pai que ele acusara de ser um agente da PIDE. Gwenjere que entrou na Frelimo em 1967 não estava lá quando a Frelimo se dividiu em duas partes em 1965, tendo alguns revoltados ido a Lusaka para formar o Coremo (Comite Revolucionario Moçambicano) com o apoio do presidente Kenneth Kaunda da Zâmbia.
Gwenjere ainda não tinha chegado na Tanzânia quando o Instituto Moçambicano estava numa erupção volcânica contra os líderes da Frelimo que eles não queriam que controlassem os assuntos do instituto.
Falando com alguns homens que estiveram ligados ao grupo dos assaltantes do escritório, mas que não participaram na invasão, apurei que o objectivo principal do grupo era o de matar Mondlane que não estava em Dar Es Salaam naquele dia. Se os rebeldes tivessem feito reconhecimento teriam sabido que Mondlane não estava na Tanzânia e teriam aguardado por uma ocasião propicia para apanhar o grande terrorista da Frelimo. O grupo estava estreitamente ligado ao Gwenjere que os desencorajavam a não fazer o uso da violência contra os lideres da Frelimo, enfaseando que ele queria mudanças na Frelimo e não a matança de ninguém, fosse quem fosse. Aquele dia o grupo aproveitou-se da ausência do padre que tinha ido a Morogoro, ao norte de Dar Salaam, em actividade pastoral.
Armados de catanas, paus e com algumas mulheres com bebés ao colo e cornos de animais nas mãos, o grupo rompeu no escritório onde agarraram no Chissano que pôs em prática os ensinamentos de auto-defesa da KGB que lhe treinara na espionagem. O matsotsi conseguiu evitar que golpes de espadas o atingissem. Foi então que ele conseguiu remover o casaco que trajava depois dele perder os seus botões, retirá-lo do corpo e deixá-lo nas mãos dos assaltantes que o levaram como troféu antes dele se precipitar nas escadas abaixo do escritório que estava no primeiro andar do edifício onde estava albergado. Chissano de camisola somente correu doidamente pela estrada fora, fazendo pensar algumas pessoas que ele era um ladrão que tentava se escapar depois de roubar alguma coisa na vizinhança.
Os invasores não tinham o tempo de persegui-lo para o castigar. Agarraram no Samuel Mutemba, que tentou lhes resistir e no processo o chefe das transmissões da Frelimo que alguns diziam transmitia aos portugueses, recebeu golpes fatais de espada na cabeça das quais veio a morrer no Hospital Muhimbili de Dar Salaam. Sérgio Vieira que conseguiu enfiar-se na latrina do escritório e se fechou lá dentro conseguiu evitar que os invasores, que não tinham o tempo para arrombar a porta, o apanhassem. Só saiu dali depois de se assegurar que os invasores tinham recuado visto que eles não queriam dar à polícia o tempo de reagir e encontrá-los no escritório. Os agressores já tinham planos para se escapulirem de Dar Es Salaam.
Pela tarde daquele dia, foi que soubemos que o escritório da Frelimo tinha sido invadido por oponentes da liderança da Frelimo através da Radio tanzaniana transmitindo em swahili. O dia seguinte os jornais tinham artigos e fotografias do escritório desertado.
Aquela mesma manhã passei pelo outro lado da estrada oposto ao escritório. O lugar estava separado por um cordão com um soldado tanzaniano de capacete na cabeça e armado por uma arma Patchett britânica a vigiar o lugar. Ri-me a valer, mas estive um pouco desapontado que os invasores não tinham apanhado os grandes dos terroristas da Frelimo para fustigá-los e lhes fazerem saborear o mesmo terrorismo que eles infligiam a muitos militantes que eles matavam de qualquer maneira e a seu belo prazer.