Por Bernardino Bernardo
O regime está na sua pior crise de sobrevivência. O regime está em agonia. A pedra de toque do fim deste regime deu-se com a morte de Azagaia, a 9 de Março. Surpreendentemente, à morte de Azagaia fez nascer A GERAÇÃO POVO NO PODER, que viralizou nas redes sociais. A GERAÇÃO POVO NO PODER era até aqui a mais silenciosa, apática, discreta, dada a ouvir o rapper, em espectáculos, em bares, em barracas, onde o punho do regime não se fazia sentir o suficiente forte e repressivo para calar os incontidos altifalantes, que bombeavam as músicas do ídolo destas massas. Era nos subterrâneos dos espaços marginais e clandestinos dos subúrbios e cidades que as músicas de Azagaia faziam eco e exerciam o efeito tutelar e de consolo desta juventude deserdada, que encubava o vírus manifestamente latente e agora exposto, de deitar abaixo um regime caduco, que sobrevive do sangue do POVO, do sequestro e da rapina dos bancos e do tesouro público.
Quando o regime acreditava que tinha abafado a voz ao Azagaia, que ele estava isolado ou inoculado das classes que lhe podiam atormentar, eis que Azagaia agora ressuscita. Azagaia ressuscita dos boicotes que lhe impunham, da exclusão social que lhe impunham, tornando-se num líder social, espiritual, daquela juventude que se cria perdida, aparentemente apática, suspeitosamente acomodada a desfrutar de TRÊS/CEM nas ruas e nas barracas do Museu.
Quando o regime tomava o Azagaia como um músico frustrado, inconveniente, agitador das massas, com pensamento que não subjazia um alvo enfocado, eis que se nos revela idolatrado pela maioria empobrecida por cinquenta anos de má governação, cinquenta anos de amiguismo, cinquenta anos de exclusão e corrupção, cinquenta anos de nepotismo, cinquenta anos de desleixo e incúria.
Se a 8 de Março de 1977 nasceu uma geração que se tornou na charneira que manteve de pé este regime, a 9 de Março de 2023 nasceu a GERAÇÃO POVO NO PODER, que augura deitar abaixo o regime e passar por cima dos conselhos manipuladores dos seus pais e avôs. A GERAÇÃO POVO no poder grita pelo fim das consignas de um regime buçal que violenta, oprime o povo, rouba os votos e vem negligenciado um projecto colectivo de tornar Moçambique uma Nação una, viável, indivisível e de justiça social. Azagaia deixou um apelo à geração que lidera de entre as nuvens: «Não se esqueçam do combinado: POVO NO PODER».
A GERAÇÃO POVO NO PODER é aquela que não beneficiou da contrapartida dos apoios e suporte que ofereceram à FRELIMO e à RENAMO, também ao MDM, em muitas campanhas eleitorais. É uma GERAÇÃO inconformada com a sua condição precária. É a geração socialmente solitária, vítima do egoísmo e individualismo das lideranças que repartem os benefícios da independência, da indústria extractiva e do pseudo Estado de Direito Democrático, que lhes tem virado as costas, em muitos anos consecutivos de má governação.
Afinal Azagaia personifica muito mais do que aparentava. Azagaia personifica o que o regime sempre ignorou: o perfil de milhões de jovens que têm de comum o facto de serem melhores formados e que, incrivelmente excluídos, vagam, sem emprego, pelas cidades, como zombies, como fantasmas, como mercadores ambulantes, no Mercado do Estrela, no Mercado do Zimpeto, no Mercado Fajardo, no Mercado de Namicopo ou Brandão, em Quelimane. Azagaia personifica os jovens órfãos, solitários e abandonados pelo Estado-pai, diferentemente daqueles que estudaram em Cuba, no Leste ou nalguma Europa Ocidental e que tinham um Gabinete de Quadros que os enquadravam sem terem de despender cem mil meticais para comprar vagas para admissão na Polícia ou funcionalismo público. É uma geração que rompe com os laços dos que fundaram a Nação. Já não vai na onda dos que contam historietas da luta de libertação e que toma essa narrativa como folclore de uns para fazerem festas e perpetuarem-se no poder. É parte de uma geração com luz e televisão em casa e que se conecta facilmente com o mundo liberal, achando-se mais capaz para cuidar do país do que aqueles que em cinquenta anos não construíram um único prédio habitacional, uma única cidade. É uma geração muito consciente de que o regime está sem ideias, que os seus ministros são um bando de oportunistas e mentirosos. É uma geração racionalista que tem consciência que depois de cinquenta anos é chegado o momento de levar a FRELIMO ao museu, com os seus efeitos positivos e nefastos.
A morte de Azagaia despoletou a tensão e lançou alerta a uma crise de desgoverno a que o Estado está emerso, de que a elite poderosa não quer ver, não quer ouvir falar, muito menos lhe dar ouvidos. A morte de Azagaia despoletou o alarme de que o país, com uma população maioritariamente jovem, necessita de reformas urgentes, necessita de uma corajosa aceleração no processo de descentralização, senão cairá em ruínas.
Os incidentes ocorridos à volta da presente crise mostram que se o regime apostar em prosseguir com a sua campanha de hostilidade, acelerará o seu fim, porque essa juventude é aquela que serve de paisagem às caravanas dos partidos e ela poderá se decidir com a formalização de uma liderança, como aconteceu na Espanha com a emergência do PODEMOS, pois é um dado, sendo a maioria, melhor formada, melhor estruturada, organizada, far-se-á com o poder, bastando que eleja o seu líder, em face ao descrédito e da inércia de uma RENAMO e demais oposição capturada pelo regime.
A GERAÇÃO POVO NO PODER é composta por um substracto sem casa própria, vítima de cinquenta anos de falhanço da política habitacional. É aquela a que a oligarquia de políticos e Polícias de Trânsito obriga a pagar portagens, em todas as estradas nacionais, com que se financiam na compra de carros para os ministros, comandantes e directores provinciais e nacionais. É aquela Geração alvo da extorsão, com que se financia a compra de bens materiais e se procede a edificação de palacetes. É a geração que emerge da crise de valores que há muito nos governam. É a geração a que lhe é consentida apenas o culto nas igrejas mafiosas que se erguem como cogumelos pelo país afora.
Apesar da crueldade com que o regime lhe respondeu, a GERAÇÃO POVO NO PODER é a única capaz de pôr o regime de côcoras. Nas eleições de Outubro, se a oposição unir-se, fará jus ao slogan POVO NO PODER.
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