Por FATIMA MIMBIRE
O Presidente da República que se pronuncia, até quando um sujeito tem um borbulha de nada, ignorou a morte do Azagaia, o ícone da música de intervenção social. O povo o considera seu herói.
Uns vão dizer, mas lá esteve a Ministra da Cultura. Bulshit! Não quero desmerecer o Bang, um jovem brilhante com quem tive uma boa relação de amizade e trabalho, mas o PR esteve no velório do BANG in personna.
Mas, como se diz, águas passados não movem moínhos- O POVO HOMENAGEOU E ENTERROU O SEU HERÓI. A pergunta que não cala é: porque Nyusi e o partido que governa o país desde a independencia ignoraram literalmente a morte do Azagaia?
A resposta pode parecer simples. Do tipo, é porque o Azagaia criticava a Frelimo e a corrupção que é norma naquela organização. Então, eles sentiram-se muito atacados pelo Azagaia.
Pode ser verdade. Mas, eventualmente, uma parte da verdade.
Para entender a zanga dos frelos com o Azagaia é preciso conhecer bem as músicas do rapper. Ele não só criticou a corrupção e os corruptos, como também desafiou algumas narrativas sobre a nossa história. Por exemplo, sobre a morte de Samora, em que ele disse na música "As mentiras da verdade": "se eu te dissesse que Samora foi assassinado por gente do Governo que até hoje finge que procura o culpado, e foi tudo planeado?". Ainda na mesma música ele disse: "se eu te disseste que a história que estudas tem mentiras, que o teu cérebro é lavado a cada nota que tiras. Que a revolução não foi feita só com canções e vivas, houve traição, tortura e versos escondidos?".
E, depois de décadas, fomos aprendendo que o assunto do primeiro tiro não foi bem assim. Que o assunto da bomba no livro (maior infantilização das pessoas) era outra. Enfim... a narrativa sacrossanta do establishment começou a ser questionada de forma abertas, sem tabus.
Na música "homem bomba", do album Cubaliwa, Azagaia colocou no mesmo nível, digamos assim, de Machel e Mondlane, dois grande inimigos da Frelimo, nomeadamente: Urias Simango e André Matsangaíssa. "... enteados dessa patria de Samora Machel, Mondlane, Uria e Matsangaíssa..."
Falar desses nomes e de outros como Lázaro Nkavandame, Joana Simeão era quase que proibido. Ninguém se atrevia. E se falasse, era para proferir impropérios, reproduzindo as narrativa frelimistas de que são grandes traidores.
Esta coisa de Azagaia não falar dos heróis habituais, de decretos oficiais, não fazer-lhes hossanas, e trazer à mesa aqueles que se tentou apagar da história do nosso país sob acusacões de alta tradição, no meu entender, há-de ser a maior razão para a Frelimo não querer saber do Azagaia. Nenhum corrupto se zanga só porque lhe estão a chamar de corrupto, quando sabe que é!
Outra razão que julgo estar por detrás do desamor ao Azagaia, é o facto dele ter trazido uma contra narrative dos problems do país. Não somos pobres porque somos preguiçosos como se tenta pregar, porque Somos uns azarados da vida, amaldiçoados. O nosso problema tem um nome: governação objecta, fundada na megalomania da nossa elite dirigista, na cleptocracia e clientelismo. Associado ao nosso comportamento ausente.
Com isto, Azagaia ensinou muitos a pensarem. A entenderem que o governo não é pai e nem mãe. O Presidente não é pai. Servir bem não é um favor. É uma obrigação de quem governa, porque o povo é patrão, dono do poder.
Para eles, tudo isto que o Azagaia disse é um atestado à segurança do Estado. Digo, à segurança deles. Por isso ele devia ser peremptoriamente banido e esquecido. E na sua morte o ignoraram.
Mas o povo não se esquece dos seus verdadeiros heróis!