A exploração e exportação da madeira ainda representa um grande desafio para o País que perde, anualmente, 200 milhões de dólares fruto da existência de esquemas ilegais. A fraca fiscalização e falta de capacidade técnica dos fiscalizadores concorrem, entre outros factores, para que Moçambique continue a perder receitas e, mais do que tudo a ver um dos seus mais preciosos recursos a ser devastado, sem qualquer lógica de sustentabilidade de longo prazo.
Apesar de o Governo assumir estas fragilidades, pouco tem sido feito, na prática, para inverter este cenário, embora o problema não só preocupe o Executivo como também inquiete os operadores moçambicanos a operar dentro da Lei. A este nível, a Associação Moçambicana dos Madeireiros é um dos actores visivelmente preocupado com o que se assiste nesta actividade.
Ao Diário Económico, Sudecar Novela, presidente da Associação Moçambicana dos Madeireiros, conta como a agremiação lida com este cenário.
Como é que está a exploração e exportação de madeira ao nível da Associação Moçambicana dos Madeireiros?
A actividade de exploração e exportação da madeira, ao nível da Associação, não está bem. Há ainda falta de meios para trabalhar, mas temos também os fiscais que não colaboram para que haja uma actividade normal. Os madeireiros enfrentam várias dificuldades durante a sua actividade.
Os nossos problemas vão desde a falta de clareza no licenciamento até à fiscalização. E tudo isto desagua nos actos de corrupção.
O operador que vai à mata para explorar a madeira é que deveria estar licenciado, mas, infelizmente, verificamos que as licenças, na sua maioria, circulam com pessoas que nunca sequer exerceram esta actividade de exploração, e é aí que começam alguns esquemas de corrupção.
Quais são as dificuldades que enfrentam durante a vossa actividade?
Grande parte dos madeireiros não têm equipamentos nem equipas de corte. Há, nesta actividade, praticamente um predomínio da terciarização das comunidades onde pagamos por cada abate das árvores. A isto junta-se a falta de meios para exploração da madeira, pelo que acabamos por recorrer a algumas serrações para alugar os equipamentos, o que, de certa forma, se traduz no preço final da madeira.
“A lei está a ser violada por aqueles que deviam fazê-la cumprir. É uma pirâmide que envolve pessoas de calibre político”
Mas o grande problema que queremos combater é a existência de guias de trânsito falsas. Há muitos operadores que exercem a exploração da madeira usando essas guias, portanto, se queremos que o mercado seja produtivo, temos de acabar com estas práticas.
Sabemos que essa é uma tarefa das autoridades, mas nós, ao nível da agremiação, temos também esse desafio, pois o nosso objectivo é contribuir para o desenvolvimento do País por meio do pagamento de impostos.
Apesar de haver uma lei que todos devíamos respeitar, reina ainda uma anarquia, onde cada um faz o que bem entende. Não existe uma união no seio dos operadores para que a actividade seja feita de forma organizada e, ao mesmo tempo, contribuir para a economia do País.
Existem pessoas que nem sabemos se devíamos chamar de operadores ou vendedores de madeira, visto que não se percebe o que cada um faz. Só que, no fim de contas, vemo-los a circular com o produto sem sabermos como foi a sua exploração e qual o seu destino.
Por outro lado, existem também problemas na cubicagem (processo para calcular o volume da madeira), pois os nossos técnicos, responsáveis por fazer esse exercício, não têm observado efectivamente os critérios exigidos estipulados na lei. Como consequência, após este trabalho deficiente dos técnicos em cubicagem, temos acumulado muitas multas emitidas pelos fiscais florestais instalados ao longo das nossas estradas.
Quantos operadores fazem parte desta agremiação a nível nacional?
Até agora temos 15 operadores, número composto, na sua maioria, por operadores de madeira existentes nas províncias de Nampula, Zambézia, Cabo Delgado, Sofala e Niassa. No entanto, ainda muitos estão por se filiar na associação, visto que há um número considerável de madeireiros que estão fora do sistema.
Fora os não licenciados, temos também aqueles que chamaríamos de “operadores-fantasma”, que se aproveitam das fragilidades da fiscalização moçambicana para exercer a actividade, mas não possuem nenhum tipo de documento que os identifique.
Segundo a lei, todos os operadores da madeira têm de estar licenciados e pagar todos os impostos ao Estado. Porém, alguns, em conivência com os fiscais, exercem a actividade sem obedecer à legislação moçambicana. Exemplo disso, são os operadores chineses que fazem o abate desenfreado da madeira, muitas das vezes sem que sequer tenham alguma licença para o exercício.
Em termos de valores, quanto é que a associação conseguiu movimentar durante o exercício do ano passado?
Aproximadamente 500 mil dólares (31,6 milhões de meticais), sendo que esta é uma estimativa, uma vez que estamos ainda num trabalho de apuramento dos dados concretos.
Os operadores filiados na Associação Moçambicana dos Madeireiros vendem a madeira localmente ou também exportam?
Até agora vendemos localmente. Todavia, temos essa perspectiva de começarmos também a vender para fora do País.
Qual é o tipo de madeira mais procurado no mercado?
Temos o Jambirre, Chanfuta e Umbila. No geral, o mercado procura mais este tipo de madeira para o fabrico de portas, janelas e outros objectos de mobília.
Qual é a vossa percepção quanto à presença dos exploradores e exportadores ilegais de madeira em Moçambique que envolve, em muitos casos, operadores chineses?
É uma grande preocupação, pois não faz sentido um cidadão estrangeiro vir praticar essas irregularidades sem que ninguém ponha alguma ordem. Sabemos que essas pessoas não agem sozinhas, há conivência de algumas pessoas de influência política.
É uma grande perda para o País, sem dúvida. Acho que, uma vez existindo uma cooperação bilateral entre Moçambique e China, seria melhor convidarmos os investidores chineses para instalarem uma indústria mobiliária no País para evitarmos este saque da madeira moçambicana de forma desregrada. Isso feito e tenho a certeza que poderia ajudar muito no desenvolvimento da nação.
Mas o que estará a acontecer para que esses casos sejam recorrentes no País? Será falha da legislação moçambicana?
A lei é rígida quanto a isso. O que está a acontecer é que a própria lei está a ser violada por aqueles que deviam fazê-la cumprir. É uma pirâmide que envolve pessoas de calibre político.
Mais do que isso, existem fraquezas dos serviços de fiscalização que acabam por ser, muitas das vezes, aproveitadas pelos operadores ilegais para continuar a defraudar o Estado.
Nesse sentido, qual seria a solução para se acabar com estas práticas?
Devia haver o envolvimento de toda a comunidade para denunciar estas situações prejudiciais.
Texto Hermenegildo Langa • Fotos Mariano Silva