ten-coronel Manuel Bernardo Gondola
Já tem tempo que a palavra patriótico, ser patriota domina a discussão política moçambicana e… acho que já passou a hora de eu abordar essa questão neste lugar.
Afinal, ser patriótico é realmente bom? O que é que a 'filosofia' diz realmente disso.
O tema patriótico, ser patriota não é tão recente, o acto de ser patriota já está presente desde a Grécia antiga e, podemos notar traços de patriotismo, por exemplo, os próprios espartanos tinham esse traço de amor a pátria. A própria ideia da pátria, de patros vem de um amor ao solo, a palavra patros de latim vem o solo onde se nasce.
Mas, esse amor a pátria não significa exactamente amor a nação, o nacionalismo e…aqui eu já vou fazer uma 'distinção': Patriotismo, não é a mesma coisa que nacionalismo, embora muita gente confunda as duas coisas. Repare, nacionalismo seria isso que dá origem por exemplo; ao fascismo, a ideia duma nação ser superior a outra. Portanto, nacionalismo é diferente de patriotismo, vamos ter isso em mente.
Nacionalismo, é por exemplo, o quê aconteceu na Alemanha nazista, quando se diz que, “Alemanha acima de todos”, isso não é ser patriota. Quando agente diz, “Alemanha acima de todos”, agente não está sendo patriótico no sentido alemão, está sendo nacionalista.
Repare, há uma confusão entre esses dois termos. Quando agente diz, que um país está acima de todos outros, é uma ideia de 'supremacia' aí nós não estamos mais no âmbito do patriotismos e sim do nacionalismo e… isso tende a ser muito perigoso, pois pode dar origem a correntes perigosas como; o nazismo alemão ou a própria ideia do fascismo italiano. Tanto é, que a própria ideia do patriotismo vem sendo e é muito criticada pela filosofia desde a modernidade. Por exemplo, ficou clássica, uma crítica feita por um pensador inglês, chamado Samuel Johnson que disse que, “o patriotismo é o refúgio dos canalhas”. Essa frase ficou muito conhecida.
É claro, que quando o Samuel Jonhson diz isso, ele não está fazendo tanto uma crítica ao patriotismo, é + uma crítica aos 'canalhas’. E… você vai concordar comigo eu tenho certeza; porquê? O quê Samuel Jonhson está dizendo aqui é o seguinte: não é difícil encontrar pessoas que em nome do amor à pátria tentem esconder meros interesses pessoas. Sabe, aquele dirigente político que diz, “háaaa…estou defendendo interesses da pátria”, isso não só aqui em Moçambique no mundo inteiro! Que diz, que está defendendo interesses da pátria + na verdade só está defendendo interesses próprios. Repare, o próprio Samuel Johnson, está falando [d]isso, na Inglaterra do século [XVIII] só para vocês terem ideia, então não é algo novo.
E não é só isso, não é só o facto de patriotismo ser “o último refúgio dos canalhas” que nos torna isso evidentes, tem algo pior ainda que faz com que, o patriotismo seja tão criticado pelos filósofos. Por exemplo, o Rosseau, outro grande filósofo da modernidade vai dizer que… “o patriotismo até pode ser bem visto + desde que ele não ofenda a ideia de pluralidade”. E… aqui agente já começa a ter uma noção de porquê o patriotismo tende a ser mal visto.
Mas, tem uma outra questão que é o seguinte como diz o Rosseau. Quando nós chegamos a modernidade, a formação dos Estados modernos, esse elemento patriótico começa a ficar menor, porquê nós temos um projecto iluminista. O quê é que seria um projecto iluminista? Repare, não estou falando do iluminismo como período histórico, não! Eu estou falando iluminismo como projecto filosófico.
O quê, que seria iluminismo do alemão Wolff Kleron. Seria um projecto, de que, a humanidade por meio da razão [esclarecimento] seria organizada racionalmente. Ou seja, nós poderíamos ter uma ética universal baseada na razão, na racionalidade, na razoabilidade, uma ética comunicativa onde os povos poderiam estar em paz, resolver seus conflitos racionalmente, por meio do diálogo racional e… isso faz com que, a ideia de patriótico perca força. Porquê? porquê nós teríamos fronteiras se nós poderíamos resolver as coisas por meio de diálogo!
Logo, a ideia de uma só nação começa a ficar + forte, não só, uma nação, é claro que existiram nações, pátrias isso não têm problemas, só que, a ideia duma razão universal ela se torna muito forte. Uma razão universal como uma ética universal, em que sentido? Que o que é certo aqui, é certo em todo lugar do mundo; matar é errado aqui, e em todo lugar do mundo; roubar é errado aqui e em todo lugar do mundo, então, é isso que o Kant, o Immanuel Kant, maior filósofo iluminista vai nos ensinar.
Então, por isso que, a ideia de patriótico dentro do iluminismo vai perder muita força, porquê a ideia duma pátria vai ter só validade, mas + do que, a pátria, a ideia duma ética universal vai ter + validade, porquê o quê é certo vai ser certo aqui e em qualquer parte do mundo. Ou seja, agente abre a mão duma 'relatividade moral' e isso vai reflectar como ideia de patriotismo, pode reflectar em prol duma moral universal, duma ética universal.
Mas, uma ideia de patriotismo vai ser 'resgatada' dentro da ética. Existe um filósofo chamado Alasdair Macintyre, que diz que pode ser bom e…aqui eu quero te chamar para um raciocínio, que é muito interessante. De facto, ser patriota pode ser bom, mas eu volto a dizer; 'patriótico não é soberania, não é ser melhor que os outros, não é Moçambique acima de todos'. Porquê a ideia de Moçambique acima de todos, assim como; Alemanha acima de todos pode dar a ideia, de que, Moçambique é melhor do que, os outros, isso é 'tenebroso'.
Moçambique não é melhor do que ninguém + também não pior do que ninguém. Aqui eu já vou-te dar 'catucada' se você está me ouvindo. Moçambique não é melhor do que Tanzânia + também não pior do que os Estados Unidos. correcto! Não abaixe, não bate continência para ninguém, correcto! Se você é patriótico não vai bater continência para ninguém…que… não seja Moçambique. Logo, ser patriótico é amar a sua pátria sim… como eu vou falar daqui a pouco + você não tem que 'desrespeitar' a ninguém e sim respeitar a sua cultura + nunca se fechar nela mesma.
Então, vamos diferenciar aqui o quê que é nacionalismo de considerar você superior a todo mundo, de patriotismo. Porquê, que patriotismo pode ser bom. Pode ser bom no sentido de fortalecimento da cultura, por exemplo, fortalecer a cultura popular, fortalecer a nossa cultura alimentícia. Mas, não é só isso, Macintyre tem um exemplo que eu acho muito interessante dentro da sua ética das virtudes e eu vou trazer exemplo para aqui que é o seguinte. E aqui eu acho que todo o mundo vai ficar bravo comigo tanto patrióticos como não patrióticos: nós tendemos a ser + caridosos com quem agente reconhece como um par. Repare, dificilmente agente ajuda ou ajudaria a Turquia, contudo Moçambique através do Presidente da República, em nome do povo moçambicano e do Governo envio uma 'mensagem de solidariedade' para o Governo e povo da Turquia, na questão do terramoto.
Mas, nós civis não ajudamos, mas quando nós temos tragédias aqui no país, como as grandes inundações, as chuvas que normalmente no começo do ano assolam o país, nós sempre nos ajudamos, você já reparou isso! Porquê? Porque nós temos uma noção de comunidade a que nos liga e… isso vem da ideia de patriótico. É engraçado + é bonito. Quando nós tivemos as inundações no Distrito de Boane foram várias embarcações, vários camiões particulares com mantimentos para ajudar. Repare, esse tipo de situação só é possível quando nós nos vemos como comuns, como pares.
Destarte, esse sentimento de semelhante, só um sentimento patriótico pode nos proporcionar, porque nós acabamos ligando + tendo esse sentimento do afectivo, porque nos sentimo-nos + próximos com pessoas iguais, você se sente + tocado. Então Macintyre, vai dizer isso, que o sentimento patriótico, de comunidade; o patriotismo pode ser bom nesse sentido por reforçar esses 'laços' de comunidade e ao reforçar esses 'laços' de comunidade alguns sentimentos de cooperação, de ajuda mútua, alguns sentimentos éticos são reforçados.
Então, o sentimento patriótico ele pode ser bem visto. É claro para isso acontecer, para que esses sentimentos éticos, fortalecimentos éticos, comunitários de ajuda mútua acontecerem nós, temos que fazer do patriotismo, do amor a pátria um 'reconhecimento' de facto como algo bom, não pode ser como já nos ressaltou Samuel Johnson, “o patriotismo o último refúgio dos canalhas”, não pode ser o patriotismo uma mera bandeira como discurso político, faz junto para quem fica batendo continência aleatória.
Portanto, é preciso uma retomada do que é patriotismo de verdade, para que nós possamos, de facto, bater no peito e reconhecer no patriotismo de facto algo bom.
Manuel Bernardo Gondola
Maputo, aos [07] de Maio de 20[23]