O Tribunal Comercial de Londres começou (ontem) a analisar um requerimento do banco Credit Suisse para anular o julgamento sobre as dívidas ocultas de Moçambique devido ao incumprimento na divulgação de provas documentais.
“A República [de Moçambique] continua em incumprimento dos deveres de divulgação”, criticou o advogado Andrew Scott esta manhã, apontando para o reduzido número de documentos oficiais facilitados.
O representante do Credit Suisse questionou se houve falta de vontade “ao mais alto nível”, nomeadamente do Presidente da República, Filipe Nyusi, enquanto a pessoa com maior autoridade no país, mas também sujeito a alegações neste processo.
Os argumentos para anular o julgamento vão prolongar-se durante três dias, devendo uma decisão ser tomada posteriormente. Em março, o juiz Robin Knowles avisou que não descartava anular o julgamento, sublinhando que a divulgação de provas documentais é essencial para garantir um julgamento justo.
A questão é crucial numa altura em que faltam quatro meses para o início em 03 de outubro do julgamento que está previsto durar três meses. A divulgação de provas documentais deste caso tem sido feita por fases e os prazos frequentemente alongados devido à complexidade do processo e necessidade de tradução.
O principal problema tem sido o acesso a documentos das várias entidades estatais, funcionários e titulares de cargos públicos que são objeto de alegações no caso. As cinco entidades são o gabinete do presidente, o gabinete do primeiro-ministro, o Serviço de Informações e Segurança do Estado (SISE), o Conselho de Estado e o Ministério do Interior.
O juiz Robin Knowles criticou em março a falta de acesso dos advogados britânicos que estão a defender a Procuradoria-Geral da República (PGR) de Moçambique aos documentos oficiais para ajudar na seleção, sejam aqueles classificados de segredo de Estado ou de consulta restrita.
O magistrado também reprovou o facto de nem a PGR ter sido autorizada a examinar documentos do SISE, Conselho de Estado e gabinete do presidente da República, decisão que cabe ao chefe de Governo ou ao chefe de Estado.
O Tribunal Comercial de Londres tem agendado para 03 de outubro o início do julgamento da ação judicial apresentada pela PGR de Moçambique em 2019 para tentar anular uma dívida de 622 milhões de dólares da empresa estatal ProIndicus ao banco Credit Suisse, alegando que resultou de corrupção.
O empréstimo foi avalizado secretamente pelo Governo da Frente de Libertação de Moçambique (Frelimo) quando Armando Guebuza ainda era chefe de Estado, sem conhecimento do parlamento e do Tribunal Administrativo.
O financiamento destinava-se à aquisição de barcos de pesca do atum e equipamento e serviços de segurança marítima fornecidos pelas empresas do grupo naval Privinvest.
O caso, descoberto em 2016 e que ficou conhecido por “dívidas ocultas”, envolve contratos e empréstimos de cerca de 2,2 mil milhões de dólares (cerca de dois mil milhões de euros) com os bancos Credit Suisse e VTB entre 2013 e 2014 em nome das empresas estatais moçambicanas Proindicus, Ematum e MAM.
Filipe Nyusi era ministro da Defesa quando os contratos foram assinados.
LUSA – 14.06.2023