Por Edwin Hounnou
Pode ser que sim, mas, pode ser que não. O DDR (Desmobilização, Desarmamento e Reintegração) dos antigos guerrilheiros da Renamo é um acordo assinado, em Maputo, a 06 de Agosto de 2019, entre o Presidente da República, Filipe Nyusi e o presidente da Renamo, o General Ossufo Momade. O tal acordo, que designaram de Acordo de Paz e Reconciliação Definitiva, visava desmobilizar os guerrilheiros da Renamo, retirar-lhes os instrumentos de guerra e reintegrá-los na sociedade. Se os passos indicados forem cumpridos, de forma escrupulosa, podemos ficar sossegados que ninguém voltará a socorrer-se da força das armas para fazer valer os seus direitos, as suas reivindicações e fazer ouvir a sua voz. Assim, a resposta não poderá ser linear nem uniforme.
Seria muito interessante se pudéssemos encontrar uma resposta definitiva da bicuda questão da preservação da paz e consolidação da reconciliação nacional que nos fogem desde que o país se tornou independente, a 25 de Junho de 1975.
Já passam 48 anos que Moçambique vai na trilogia da guerra - acordo -guerra. As gerações de moçambicanos que nasceram depois da independência ainda não conhecem a paz em toda a extensão do território nacional e isso não acontece devido ao destino ou à vontade dos que pegam em armas. Para que tenhamos uma paz definitiva e os moçambicanos estejam, de facto, reconciliados, precisamos que sejam removidas as causas que provocam conflitos que vêm dilacerando o país. Não são as armas a causa dos conflitos. O que provoca a guerra é a maneira atípica como o país é governado.
Os entraves à paz e reconciliação, na nossa opinião, ainda não foram removidos porque a exclusão politico-económica e a intolerância permanecem intactas e inalteráveis.
A eliminação dos esquadrões da morte que têm sentenciado à morte os políticos da oposição e outros pensadores continuam activos e vigilantes. Os órgãos eleitorais - CNE (Comissão Nacional de Eleições) e STAE (Secretariado Técnico de Administração Eleitoral) - continuam a inventar fraudes eleitorais. Fazem um recenseamento vicioso e não se pode esperar que a campanha eleitoral e os resultados venham a ser diferentes. A CNE e o STAE foram feitos para comprometer a paz e democracia.
A polícia não é republicana e nunca o foi. A PRM está partidarizada e defende, indefetivelmente, o partido no poder. Ela está educada e treinada para tomar a oposição como sua inimiga natural, por isso, rapta, persegue, prende, tortura e, até, mata. Esperar que a PRM seja imparcial e defenda a todos os cidadãos de igual maneira, é o mesmo que julgar que as águas dos rios venham, um dia, a galgar a montanha. Isso nunca vai acontecer.
A maneira como o partido no poder ganha as eleições deixa a todos atónitos porque está com a cara suja pela violência que promove e corrupção com a qual sempre se identifica. Existe uma ideia generalizada, segundo a qual a Frelimo é a porta por onde a pobreza, o mal é a corrupção que encharcam o país.
Os tribunais para onde devem ser encaminhados os ilícitos eleitorais fazem o jogo do partido no poder - ignoram as queixas dos partidos da oposição e sempre decidiram a favor do partido no governo.
Em Moçambique, para a oposição vencer uma eleição é preciso que o partido no poder tenha esgotado todos os argumentos e recursos. Os órgãos eleitorais não tenham mais possibilidades de fazer fraude e a polícia tenha sido posta fora do "combate".
O Conselho Constitucional entra, também, na sujeira, validando e proclamando resultados fraudulentos. Tudo faz para que a Frelimo seja vencedora. Os integrantes CNE/STAE, PRM, SISE, tribunais lutam pelos seus interesses estomacais. Fazem de tudo para ficarem de bem com o partido no poder. Ninguém está comprometido com a justiça nem com a verdade.
É essa postura põe em causa a paz, justiça, democracia e desenvolvimento. Esses problemas todos não se resolvem recolhendo, apenas, as armas ou prometendo pensões aos antigos guerrilheiros.
O que ameaça a paz não são as armas, que podem ser encontradas a qualquer momento, mas o comportamento da Frelimo. A nossa História ensina que, para combater o mal, as armas sempre existem. Não faltaram armas para combater o colonialismo. Não faltaram armas para lutar contra a ditadura a seguir à independência. Não tenhamos ilusões quanto a esta questão.
A paz assegura-se pela justiça, inclusão e respeito pela diferença. A nossa paz está garantida pelo recenseamento discriminatório e mafioso, campanha intimidatória e resultados eleitorais fraudulentos.
Se o partido no poder prosseguir com está postura, continuaremos mergulhados em conflitos e guerras. O povo tem o direito de escolher o que deseja para si. É momento de escolher entre a paz, democracia e conflitos. Mesmo sem armas, pode haver derramamento de sangue, como foi no Quénia, onde houve mortes devido a fraudes eleitorais. Batemos palmas pelo DDR, todavia, achamos que seja pouco demais para nos tranquilizar de que a paz já seja um dado adquirido.
A justiça e a inclusão conduzem-nos à paz e democracia. A violência policial não leva o país à uma paz. Não devem ser os órgãos eleitorais a determinarem quem vence uma eleição com recurso a truques, como, aliás, tem sido prática habitual.
A paz e desenvolvimento estão ao alcance do povo. É preciso não cruzar os braços à espera da boa vontade de quem quer que seja.
O povo precisa se bater pelos seus direitos. A paz, justiça e desenvolvimento são direitos inalináveis do povo e não uma dádiva. Com gente comprometida com a causa do povo, o DDR seria um meio caminho andado em direcção à paz e reconciliação, porém, para o nosso caso, estamos ainda bem longe.
Moçambique é dos raros países do mundo que se pretendem democráticos que não permite o mais pequeno sinal de manifestação pacífica, ainda que seja do comando constituticional. Seria demasiado infantil acreditar que depois do DDR, o país vai seguir o trilho da paz. Há provas bastantes sobre a arrogância doentia do partido Frelimo.
Para quem estiver atento, deverá ter notado que mesmo os considerados como os mais lúcidos do grupo quando falam se dão ao prazer de julgar, sem qualquer prova, que a oposição, quando chegar ao poder, vai fazer pior que eles. Parece difícil que esperar que surja algum partido venha governar o país pior que o partido Frelimo.
VISÂO ABERTA – 27.06.2023