Caso, descoberto em 2016, ficou conhecido por "dívidas ocultas" e levou à suspensão de apoios internacionais.
Um juiz britânico avisou esta sexta-feira que o Presidente da República de Moçambique, Filipe Nyusi, deve preparar-se para o julgamento sobre o caso das “dívidas ocultas” em outubro em Londres, apesar de invocar imunidade.
Numa audiência esta sexta-feira no Tribunal Comercial, o juiz Robin Knowles admitiu que “não é o momento de tomar decisões sobre o que acontecerá se o resultado da [discussão sobre a] imunidade for num sentido ou noutro”, admitiu.
Porém, vincou, “todos, incluindo o Presidente Nyusi deve proceder com base no facto de que correm o risco de que esse julgamento aconteça e de que sejam envolvidos nele, ou das suas consequências”.
As palavras do magistrado eram uma referência à proximidade entre uma audiência de três dias para discutir a questão da alegada imunidade do chefe de Estado moçambicano, apontada para o início de agosto, e o começo do julgamento, em 03 de outubro.
O advogado que representou Nyusi em tribunal, Rodney Dixon, concordou que a questão da imunidade é crucial e que deve ser discutida “o mais cedo possível”.
Filipe Nyusi foi nomeado no processo que decorre na justiça britânica pelo grupo naval Privinvest e pelo respetivo proprietário, Iskandar Safa, por entenderem que deve ser responsabilizado caso sejam provadas as alegações de corrupção contra a Privinvest.
O Tribunal britânico autorizou a notificação do Presidente Nyusi em maio de 2021, mas esta só foi confirmada oficialmente em abril deste ano e esta sexta-feira foi a primeira vez que se fez representar legalmente em tribunal para invocar imunidade diplomática.
O grupo naval libanês quer que Nyusi explique o envolvimento na compra de barcos e equipamento para pesca e proteção marítima em Moçambique através das empresas estatais Proindicus, Ematum e MAM.
Filipe Nyusi era ministro da Defesa quando foram assinados os contratos com a Privinvest e contraídos empréstimos de cerca de 2,2 mil milhões de dólares com os bancos Credit Suisse e VTB, entre 2013 e 2014.
Os empréstimos foram avalizados secretamente pelo governo da Frente de Libertação de Moçambique (Frelimo) quando Armando Guebuza ainda era chefe de Estado, sem conhecimento do parlamento e do Tribunal Administrativo.
O caso, descoberto em 2016, ficou conhecido por “dívidas ocultas” e levou à suspensão de apoios internacionais, incluindo do Fundo Monetário Internacional (FMI), que só recentemente retomou a ajuda financeira ao país.
A Procuradoria-Geral de Moçambique iniciou uma ação judicial no Reino Unido em 2019 para tentar anular a dívida de 622 milhões de dólares da empresa estatal ProIndicus ao Credit Suisse, invocando que os contratos resultaram de corrupção.
Entretanto, o caso juntou mais processos relacionados com a suspensão de pagamentos das dívidas por Moçambique para serem julgados em conjunto entre outubro e dezembro de 2023.
Além de Nyusi, no processo em Londres estão nomeados vários altos funcionários públicos e figuras de Estado, como Guebuza e o antigo ministro das Finanças Manuel Chang.
Num julgamento em Maputo do mesmo caso que foi concluído em dezembro, 11 dos 19 arguidos foram condenados a penas de prisão de entre 10 e 12 anos.
Três deles, Ndambi Guebuza, filho do ex-Presidente Armando Guebuza, e dois ex-dirigentes do SISE, Gregório Leão e António Carlos do Rosário, foram ainda condenados a pagar uma indemnização ao Estado equivalente a 2,8 mil milhões de dólares.
O juiz responsável, Efigénio Baptista, recusou ouvir Nyusi naquele processo. (LUSA através da CM África)