Volvidos um pouco mais de seis meses desde que o julgamento das dívidas não-declaradas iniciou, noto com satisfação que a opinião pública entende os contornos deste intricado processo melhor agora do que antes.
A primeira coisa que este julgamento ajudou a esclarecer é que as dívidas não são mais “ocultas”, mas sim não-declaradas ou não-publicitadas. Inclino-me mais ao nome “não-publicitadas”, pois elas foram declaradas a quem deveriam ter sido declaradas. É importante lembrar que as dívidas, aquando da sua contratação, eram de natureza privada e, como tal, não careciam de aprovação pela Assembleia da República.
Quando chegou o momento de elas serem inscritas na Conta Geral do Estado, foram devidamente aprovadas pela bancada maioritária na Assembleia da República, sob o beneplácito do olvidarte e esquecediço Presidente da República, Sua Excelência Filipe Nyusi,
A segunda coisa que este longo julgamento nos esclareceu, é que as ditas dívidas foram contratadas com o conhecimento e envolvimento dos Comando Operativo e Comando Conjunto das Forças de Defesa e Segurança. Este ponto é deveras importante, visto que, contra toda racionalidade, a acusação deduzida pelo Ministério Público (MP) e a pronúncia elaborada pela 6ª Secção do Tribunal Judicial da Cidade de Maputo, na altura dirigida pela Dra. Evandra Gonçalo Uamusse, paradoxalmente, em nenhum momento faz referência ao envolvimento destes dois órgãos.
A acusação e a pronúncia são, de forma suspeita, mudas em relação ao envolvimento destes órgãos. Qual é a intenção do mutismo do MP e do Tribunal em relação ao envolvimento destes órgãos?
A terceira coisa é que tanto a acusação do Ministério Público assim como a pronúncia dão um peso e relevância indevida a “peões”; pessoas que não desempenharam nenhum papel relevante na contratação dos equipamentos, das dívidas e muito menos na gestão dos projectos.
Todos os arguidos deste processo judicial 18/2019-C, com a excepção de Gregório Leão, António Carlos do Rosário e Cipriano Cisínio Mutota não estão em condições de explicar “nadinha-de-nada” sobre este intricado processo, envolto em secretismo do Estado. Todas as pessoas que estão em condições de explicar sobre os aspectos relativos à negociação, contratação, emissão de garantias, estruturação das dívidas, emissão e comercialização dos títulos da dívida, gestão das empresas, cancelamento das garantias e inscrição das dívidas na Conta Geral do Estado não são arguidas deste processo. São todas como parte secundária.
Em contrapartida, o Ministério Público pretende explicar este processo indagando cambistas, estafetas, intermediários, consultores, construtores civis, promotores imobiliários, até esposas. O MP transformou as vítimas da actuação dos mentores em parte principal da acusação, deixando de fora os verdadeiros mentores e beneficiários.
O quarto e último aspecto é que o total do valor envolvido supostamente nas mãos dos arguidos não chega a $200 milhões, pelo que é justo questionar com quem ficaram os $1.900.000,00 (um bilhão e novecentos milhões de dólares)? Foram gastos em quê? Quando é que o Tribunal vai apresentar o inventário de todo o equipamento adquirido com os valores das dívidas? Acredito que aqueles “pobres e sacrificados” arguidos queiram saber. Imagino o quão doloroso é alguém ser responsabilizado por um crime que não praticou.
A concluir, começa a cristalizar a ideia de que o Ministério Público nunca trabalhou em busca da verdade material. Trabalhou sim na busca de “bodes expiatórios” para responsabilizá-los por um assunto que não é do seu conhecimento, e proteger os verdadeiros implicados e responsáveis por estas dívidas.
A pessoa que investigou e deduziu está acusação descabida, o Dr. Alberto Paulo, foi agraciado com uma promoção de Procurador Geral Adjunto para Vice-Procurador Geral em reconhecimento do “excelente e meritório” trabalho que realizou em excluir os verdadeiros donos das dívidas ocultas. O Juiz Efigênio Baptista, certamente, está ansioso em concluir este julgamento e ser elevado a uma outra posição dentro da Magistratura Judicial ou do Ministério Público pelo seu excelente, impecável e soberano trabalho de condenar inocentes e deixar os culpados de fora. Assim vai a nossa justiça!!!!!
Se verdadeiramente houvesse interesse de esclarecer as dívidas ocultas teríamos, adicionalmente, a desfilar no Tribunal nomes como Verônica Macamo, Alfredo Gamito, Lúcia Ribeiro, Filipe Nyusi, Manuel Chang, Basílio Monteiro, Atanásio Mtumuke, e tantos outros quadros que tiveram um envolvimento directo neste assunto, a vários níveis.