Por Edwin Hounnou
A paz é como uma bela flor plantada no jardim da vida. Não é como qualquer capim que brota, cresce e dá flores num bosque. Como não a temos cuidado com a devida cautela, ela passa a maior parte do tempo murcha, raquítica e frágil. Paz é a flor mais bela que a humanidade pode ter e espalhar a beleza para todos.
O povo moçambicano não consegue viver em paz desde que o país chegou à independência nacional, a 25 de Junho de 1975. Vai de conflitos em conflitos que, muitas vezes, desembocam em guerras fratricida pelo facto de um grupo de indivíduos se julgarem donos exclusivos do destino de todos, sem levarem em conta os interesses dos demais grupos que constituem o país inteiro que somos.
A corrida desenfreada pelos recursos por alguns, em prejuízo da maioria do povo, tem provocado feridas profundas na nossa sociedade. Não vale a pena procurar as causas dos nossos conflitos longe ou fora de nós mesmos.
Moçambique pertence a todos e aqui não deve haver moçambicanos mais privilegiados que outros pelo simples facto de pertencerem ao partido que governo.
Os recursos que o país possui devem beneficiar a todos e quando assim não acontece, surgem conflitos e aparecem guerras. As guerras pelas quais temos vindo a passar não nem nunca foram da inspiração externa. São as acções de uns que alimentam a instabilidade, fazem renascer os conflitos e deflagram as guerras que nos dilaceram há cerca de 50 anos.
Somos nós mesmos que alimentamos as nossas desavenças, conflitos e guerras. Para forças externas terem espaço entre nós, alguém de dentro abre as portas. O africano costuma dizer que o feiticeiro só entra quando alguém de dentro abre a porta.
Existem mil maneiras de como abrir as portas tais como a exclusão económica, intolerância política, perseguições fundadas em política e reiteradas fraudes eleitorais.
Se não soubermos nos vergarmos perante a paz, qualquer discurso político sobre a paz não terá qualquer valor. Não passará um discurso vazio, nulo e desprovido de conteúdo, pois, a paz requer mais acções que palavras bonitas e floreadas.
Os excluídos podem não possuir armas nem catanas nem machados mas estão prontos para aderir qualquer luta para se livrarem de um regime que os oprime. Por isso, o recolher das armas e o receber, em público, a suposta última arma não deve ser tomado, só por si, uma vitória e fazer esquecer de dar os passos subsequentes para consolidar a paz. Na verdade, é um passo muito bom, deverá ser completado com a reinserção dos desmobilizados.
O argumento de que o processo demorou que havia dificuldades pelo facto dos ex-guerrilheiros não tinham descontado para a previdência social, é esfarrapado e incompreensível. Trata-se de uma questão política com solução própria.
Onde e quando os antigos guerrilheiros da FRELIMO haviam descontado que justificasse a previdência social de que começaram a gozar a seguir à independência nacional?
Colocar o problema desse modo é o mesmo que incubar confusões para o futuro e nem se deve dizer que haja falta de dinheiro porque o nosso país tem-no muito que o Estado o desperdiça de qualquer maneira. Não faltam exemplos que ilustram o desperdício do dinheiro que temos e multiplicação de desperdícios são quase infinitos.
Até aqui ninguém nos explica, de forma plausível e convincente, a figura de Secretário de Estado na Província, a multiplicidade de vice-ministros e as intermináveis viagens pelos distritos que o Presidente da República anda a fazer para inaugurar lojas e lojinhas de bancos, casas e casitas de previdência social e até para ir cortar fita de uma torneira de água. O governo não sabe tão-pouco racionalizar o pouco que o país possui.
Um outro exemplo que se pode dizer é o desperdício que se faz exportando a matéria-prima em bruto. Quando se faz a transformação dos que temos, como grafite, rubis, ouro, etc., para além de conferirmos um valor acrescentado, criamos postos de trabalho para os nossos jovens, porém, a ganância pelo dinheiro rápido é tanta que alguns empresários de sucesso acoplados ao partido no poder que preferem exportar a matéria-prima em bruto.
A pobreza por que passamos é produto de modo de governar o país. Não é a falta de informação que atrapalha o governo, mas o excesso de ganância pelo dinheiro que os deixa com a mente obstruída e não conseguem ver o futuro do país. A única coisa que cresce em flecha é a riqueza acumulada em bolsos de uns tantos poucos enquanto a maioria da população vai ficando cada vez mais pobre.
É urgente que esses problemas sejam resolvidos para garantir a paz e evitar futuros conflitos porque a pobreza, a ausência de desenvolvimento, a exclusão político-social e económica não forem eliminados, a guerra continuará latente e sempre ficará à espera por uma oportunidade para entrar em acção. Aí não haverá a famosa "mão estranha" porque, afinal, essa "mão" são as acções que o governo vem fazendo todos os dias contra o povo e contra o país. A "mão estranha" é a postura do governo que não resolve os problemas que apoquentam as populações, não repara as estradas de graças e só fica à espera por donativos.
O povo lutou e conquistou a independência para viver de donativos e não para desenvolver as imensas oportunidades que o país tem? Este é o dilema que o país enfrenta : lutar e conquistar a independência para viver mendigando.
A paz e tranquilidade passam, igualmente, pela eliminação dos esquadrões da morte do governo da Frelimo que raptam e assassinam opositores do regime que, durante o primeiro mandato do Presidente da República, Filipe Nyusi, haviam atingido o apogeu da irracionalidade de violência.
Quem levanta a espada contra o seu opositor político deve ser objecto de desprezo. Para além de tantos opositores políticos que foram raptados e assassinados, vimos as vergonhosas tentativas de assassinato de Afonso Dhlakama, então líder da Renamo, que culminaram com o cerco da sua casa, na Cidade da Beira. A paz é tolerância e inclusão, que são duas faces da mesma moeda. Não se pode falar da paz sem falar da inclusão e desenvolvimento. Por isso, é urgente vergar perante a paz, a flor mais que os moçambicanos sempre andam a desperdiçar através de conflitos.
VISÃO ABERTA – 30.06.2023