Uma dívida com o fornecedor levou ao corte no abastecimento de água potável ao Hospital distrital de Mueda - a única unidade de referência e que cobre três distritos devastados pelo terrorismo -, enquanto enfrenta um surto de diarreias e vómitos, disseram à VOA nesta segunda-feira, 31, várias fontes locais.
O ativista dos direitos humanos, Adriano Nuvunga, considera o corte como “atentado à saúde e vida”, de milhares de deslocados de guerra refugiados em Mueda, na província moçambicana de Cabo Delgado.
O hospital distrital de Mueda não recebe água desde 21 de Julho, na sequência de uma dívida de mais de 3.3 milhões de meticais (cerca de 53.5 mil dólares norte americanos) a fornecedora Águas da Região Norte (AdRN), antigo FIPAG, mas a situação tornou-se visível semana passada devido a eclosão de um surto de diarreias e vómitos, relataram várias fontes.
“A falta de água no hospital rural de Mueda não é um caso recente, só que agora está a piorar (...) e com esse assunto de cólera a coisa está a ficar mais pior”, disse à VOA Adamo Sulemane, um morador local, realçando que o problema tem deixado pacientes em situação de desespero.
O morador contou que a sede distrital de Mueda sempre enfrentou crise de água potável.
“O corte é o cúmulo do sofrimento da população (…) na verdade é um assunto caótico” e alguns pacientes recorrem à água de furos tradicionais nos bairros próximos do hospital para a higiene pessoal, disse.
Um outro morador, Rachid Ismael, contou que o surto de diarreias e vómitos está a abalar a zona e o corte de fornecimento de água no hospital local agravou um “problema que já vinha sendo preocupante”.
Em declarações à VOA, Lucas Saquina, delegado da AdRN em Mueda, confirmou o corte do fornecimento de água ao hospital, adiantando que várias tentativas de cobrança fracassaram.
“Nós efetuamos o corte no hospital porque a dívida é enorme (...) que se acumulou durante vários anos” de fornecimento sem pagamento, precisou Saquina, adiantando que várias negociações fracassaram desde 2021.
Silêncio
Num contacto telefónico o diretor distrital de saúde de Mueda recusou-se a comentar sobre o assunto.
O hospital de Mueda é atualmente a única unidade de saúde secundária que atende os distritos de Mocímboa da Praia, Mueda e Nangade, distritos cuja rede sanitária foi severamente devastada por ataques de grupos insurgentes.
Entretanto, o ativista moçambicano e defensor de direitos humanos, Adriano Nuvunga, classificou o corte de fornecimento de água ao hospital como “atentado à saúde e vida”, de milhares de deslocados de guerra refugiados em Mueda.
“Cortar água a um hospital que está a passar por uma crise de doenças diarreicas é um atentado contra o direito à saúde, contra o direito à vida dos pacientes, e até atentado contra a vida do pessoal médico e serventuário do hospital”, anota Nuvunga, que lamentou o “ato criminoso” do fornecedor.
Ónus da corrupção
“Sem água não há vida, sem água não há saúde, por isso cortar a água é um crime”, acrescentou.
O também diretor do Centro para a Democracia e Desenvolvimento (CDD), observa que Moçambique vive a atual crise devido à grande e pequena corrupção, que impede que as unidades sanitárias tenham recursos mínimos para atender suas obrigações com provedores de serviços, incluindo o fornecimento de água.
“Não se pode transferir para os pacientes o ónus da corrupção”, defendeu Adriano Nuvunga, insistindo que o fornecedor acumula dívidas, porque as instituições públicas não conseguem pagar “porque são saqueadas diariamente pelos dirigentes”.
A sede distrital de Mueda continua a acolher milhares de deslocados do terrorismo em Cabo Delgado, que vive uma insurgência armada desde Outubro de 2017.
VOA – 31.07.2023