ten-coronel Manuel Bernardo Gondola
Dado os acontecimentos na região do Sahel na África Ocidental e as declarações recentes do Presidente de Burkina Faso, Capitão Ibrahim Traoré muita gente vem falando de Thomás Sankará nos últimos dias, compartilhando textos e discursos de Thomás Sankará e… eu acho muito bom que Thomás Sankará volte a ser falado, ou melhor dizendo, ganhe relevância e visibilidade dentro desse contexto.
Primeira coisa há um contexto para formação da figura do Thomás Sankará. Thomás Sankará é quase que um 'produto' típico do século [XX], daquela conjuntura histórica em que no pós-segunda guerra mundial, você tem um avanço do campo Socialista, Revolução chinesa, cubana, coreana, vietnamita, as democracias populares no Leste europeu.
Você tem também o iniciou de gigantescos movimentos históricos de descolonização em África e Ásia, você já tem os movimentos não alinhados, você tem um crescimento do pensamento anticolonial, já tinha acontecido a Obra de Frantz Fanon, já tinha acontecido a liderança de Kwame N’krumáh em Gana, Július Nyerere na Tanzânia, Kenneth Kaunda na Zâmbia, Samora Machel em Moçambique, Agostinho Neto em Angola, Amílcar Cabral , a luta contra apartheid e Nelson Mandela já era uma figura mundialmente conhecida, Malcolm Little, Luther King, Panteras Negras….
De facto, Thomás Sankará é o grande encontro, é o encontro do marxismo uma certa leitura do marxismo anticolonial, do marxismo leninista anticolonial, quer dizer, ele é o encontro do marxismo com anticolonialismo, com o terceiro mundo, com o pensamento negro radical.
Thomás Sankará, se reivindicava abertamente como pan-africanista, como anticolonial, um lutador pela descolonização de África num sentido + amplo, + profundo e como marxista-leninista, também se reivindicava como um internacionalista profundo e radicalmente convicto.
Então, não é pouca coisa agente está falando da melhor coisa que o marxismo 'produziu' no século [XX] que é, esse encontro entre tradição leninista do marxismo: marxismo-leninismo e o pensamento anticolonial.
É por isso que, vamos tentar definir aqui Thomás Sankará. Thomás Sankará é como se fosse um encontro entre Lénine, Amílcar Cabral, Frantz Fanon e Kwame K’krumáh. Acho que seria quase assim. Repare, estamos falando duma figura que inclusive estava muito a frente do seu tempo em vários aspectos. Por exemplo, o debate de Thomás Sankará sobre a emancipação da mulher que quase [50] anos depois agente teria vários reparos e questões a fazer, considerando o avanço do debate actual, mas para época era um debate que estava muito a frente do seu tempo.
A preocupação de Thomás Sankará com a questão ecológica era muito a frente do seu tempo, inclusive o debate sobre a questão ecológica, sobre como a libertação de Alto Volta [Burkina Faso] do neocolonialismo passava por recuperar a degradação ambiental produzida pela dominação neocolonial, foi um debate de ecologia Marxista um pouquinho antes do Fídel Castro em termos de anos, Thomás Sankará foi um pouquinho antes.
O debate de Thomás Sankará sobre o pan-africanismo acumulando inclusive as experiências passadas e derrotadas e até não pegadas do Gamal Abdel Nasser, do pan-africanismo do Kwame N’kumáh, entrando nos limites que estavam ali colocados, mas ao mesmo tempo as potencialidades e actualidades tanto do pan-arabismo como do pan-africanismo de Patrice Lumumba, do Kwame N’krumáh, quer dizer, agente está falando de um dos maiores líderes da história do marxismo.
Não acho exagero é, porquê Thomás Sankará teve pouco tempo de vida ele foi assassinado. Thomás Sankará tem algo parecido com Freedy Hampton e quem estuda Freddy Hampton vê claramente que ali é um dos melhores oradores, um dos melhores 'agitadores' de massa da história do marxismo só que, não teve tempo para se consolidar de maneira 'inconteste' nesse papel porquê foi assassinado, infelizmente a revolução de Burkina Faso foi derrotada naquele momento.
Por isso, chamo atenção para ter muito cuidado com comparar o Capitão Ibrahim Traoré com Thomás Sankará, não é negando as potencialidades do movimento revolucionário que está ali colocado é dizer calma… não dá para comparar o Capitão Ibrahim Traoré com um dos maiores revolucionários da história da modernidade.
E… se me dão licença, eu quero ler um trecho para você[s] do «Revolução Africana» para agente entender o quê era a Revolução de Agosto que foi liderada por Thomás Sankará. «Revolução Africana» está disponível na internet baixa pela PDF, socialize o papel dos autores que se propõem a fazer o debate contra-hegemónico e revolucionário.
«Revolução Africa» que é Sankará caracterizando o quê é que é a revolução de Agosto, ele diz na página [308]:
“A revolução de Agosto é uma revolução com um duplo caracter: é uma revolução democrática e popular. Suas principais tarefas são a liquidação da dominação e exploração imperialista, varrer no campo todos os obstáculos sociais, económicos e culturais que mantêm em estado de atraso. Daí vem o seu caracter democrático.
Do facto de que as massas populares voltaicas, participam plenamente desta revolução e se mobilizam em torno de palavras de ordem democráticas e revolucionarias, que traduzem de facto os seus próprios interesses opostos aos das classes reaccionárias aliadas ao imperialismo, deriva seu caracter popular”.
E um pouco + a frente na página [310] diz ainda Sankará caracterizando a revolução de Agosto que ele liderava: “o objectivo primordial da revolução é deslocar o poder das mãos da burguesia voltaica aliada ao imperialismo para as mãos da aliança das classes populares que compõem o povo. Ou seja, a ditadura antidemocrática e antipopular da aliança reaccionária de classes sociais favoráveis ao imperialismo, o povo no poder deverá opor o seu poder democrático e popular.
Esse poder democrático e popular será a fundação, a base sólida do poder revolucionário no Alto Volta. Ele terá como tarefa primordial a total reconversão de toda a máquina estatal com suas leis, sua administração, seus tribunais, sua polícia, seu exército que foram moldados para servir e defender os interesses egoístas das classes e dos estratos sociais reaccionários. Ela terá como tarefa organizar a luta contra os esforços contrarrevolucionários para reconquistar o “paraíso perdido”, a fim de esmagar completamente a resistência dos reaccionários nostálgicos do passado.
E é aí que reside a necessidade e o papel dos CDR’s. como Como ponto de apoio das massas populares para o assalto as cidadelas reaccionárias e contrarrevolucionárias”.
Repare, eu li esse[s] trecho[s] para deixar muito claro, que Thomás Sankará liderava uma revolução: uma revolução popular, democrática, anticolonial e anti-imperialista no caminho da construção do Socialismo. Por isso, é preciso ter muito cuidada para comparar um líder de um processo revolucionário, um dos marxistas + qualificados e emblemáticos da história da humanidade com um líder que acabou de aparecer e que agente precisa ver onde é que vai chegar.
Manuel Bernardo Gondola
Maputo, aos [10] de Setembro, 20[23]