A família do ativista moçambicano Anastácio Matável, morto por seis polícias em Xai-Xai, com 13 tiros, na campanha eleitoral de 2019, afirma que a justiça continua por fazer e não desiste de perguntar pelos “mandantes” do crime.
“A arma é do Governo, as pessoas são do Governo. A arma saiu do portão e as pessoas saíram do portão, então aí não houve nenhum desvio, não há qualquer coisa estranha. Saíram legalmente no portão e a arma também”, criticou, à Lusa, em Xai-Xai, Ananias Matável, 65 anos, um dos três irmãos de Anastácio, e ambos ativistas locais, numa altura em que a campanha eleitoral, neste caso para as autárquicas de 11 outubro, volta também às ruas da capital provincial de Gaza.
Anastácio Matável, então diretor-executivo do Fórum das Organizações Não-Governamentais de Gaza (Fonga) e formador de observadores eleitorais, morreu após ser atingido por 13 tiros disparados de uma arma do tipo AK-47 e de uma pistola, no dia 07 de outubro de 2019, oito dias antes da realização das eleições gerais moçambicanas, num caso que provocou a crítica nacional e internacional.
“Foi morto porque estava a corrigir os erros do Governo”, aponta Ananias Matável, reconhecendo, no mesmo sítio em que a viatura em que o irmão seguia se imobilizou, em 2019, e onde acabaria por morrer, que o irmão “era muito crítico”.
O Tribunal Judicial da Província de Gaza, sul de Moçambique, condenaria em junho de 2020 seis polícias a penas de prisão entre três e 24 anos pelo seu envolvimento no homicídio do ativista e observador eleitoral, mas o Estado foi absolvido, sob argumento de que os arguidos cometeram o crime em seu nome e no interesse próprio.
“O Governo não aceitou assumir a responsabilidade. Diz que não sabe nada. Não ficamos satisfeitos por causa disso”, crítica o irmão, três anos mais velho.
Ainda hoje, na primeira campanha eleitoral que se realiza desde então, Ananias Matável recorda o carro “cravado” de balas e o local onde o irmão morreu, na estrada que liga a cidade à praia, por onde lhe custa passar, todos os dias.
Ananias, que é presidente da Associação para a Assessoria e Projetos Sociais – que ambos fundaram em 1998 –, confessa que por mera coincidência não seguia na viatura naquele dia, quando Anastácio regressava de uma reunião de ativistas.
“O meu irmão morreu a fazer o que defendia”, desabafa, mas insistindo em pedir respostas neste processo: “Saber quem mandou e o Governo também assumir a responsabilidade”.
Pela falta de respostas sobre os “mandantes” do crime, a família ainda apresentou recurso à decisão do tribunal, mas garante que sem resposta até ao momento, daí o apelo: “Às pessoas honestas, que são capazes de levar o assunto, caminhar mais o processo. Eu digo que o processo ainda não está resolvido, está pendente”.
Desse julgamento, que acompanhou do primeiro ao último dia no tribunal, recorda hoje que foi “muito rápido”: “Tudo ali estava programado (…) Ninguém ficou satisfeito com a Justiça”.