O Conselho Constitucional de Moçambique mandou repetir a votação em várias mesas de Nacala-Porto, Gurué, Milange, e em toda a autarquia de Marromeu. À DW, analista considera que o processo inteiro devia ter sido anulado.
Depois de semanas de espera, os moçambicanos conheceram finalmente os resultados das sextas eleições autárquicas. O Conselho Constitucional proferiu hoje (24.11) o acórdão sobre o processo. E na maioria das cidades e vilas, a Frente de Libertação de Moçambique (FRELIMO) saiu vitoriosa.
Mas também houve reviravoltas, depois da oposição contestar os resultados. O Conselho Constitucional anunciou a vitória da Resistência Nacional Moçambicana (RENAMO) em quatro autarquias, onde o partido tinha perdido antes, segundo os dados divulgados pela Comissão Nacional de Eleições.
Ficam ainda por repetir as eleições em várias mesas de assembleias de voto nas autarquias de Nacala-Porto, na província de Nampula, Gurué e Milange, na Zambézia e em toda a vila de Marromeu, em Sofala, onde o Conselho Constitucional anulou por completo a votação, realizada a 11 de outubro.
O jornalista e comentador político João Chamusse diz, no entanto, que o acórdão do Conselho Constitucional pecou pela superficialidade. Em entrevista à DW, ele considera que oprocesso eleitoral devia ter sido anulado por completo.
DW África: Que avaliação faz do acórdão do Conselho Constitucional?
João Chamusse (JC): Senti que o acórdão foi muito superficial em relação aos editais, que eram a principal causa de todo o problema. Não explicou qual foi o tratamento que terá dado. A maioria eram cópias. Portanto, a partir da altura que o Conselho Constitucional se pronuncia sem ter abordado essa questão, deixa muito a desejar.
DW África: Houve ou não justeza neste posicionamento do Conselho Constitucional?
JC: Não pode ter havido justeza quando recorreu a cópias. O Conselho Constitucional não lida com cópias. Além disso, não explica. Não vi em nenhum capítulo a explicar mais ou menos qual foi o tratamento que fez dessas atas. Comparou as atas com o quê? Para mim, esse elemento retira toda a credibilidade do processo, para além de que, um pouco antes do anúncio, já tínhamos ouvido o rumor de que Maputo e Matola nunca seriam entregues a quem ganhou de facto.
DW África: Diante de todas essas anomalias que refere, qual deveria ter sido então a postura do Conselho Constitucional?
JC: Analisando tudo, desde o início, creio que o mais certo era anular as eleições. Porque eu não sei qual foi a base legal em que o Conselho [Constitucional] se baseou para fazer a operação que fez. Agora, se diminuiu ali e aumentou acoó, eu creio que isso foi uma estratégia para atenuar um pouco o dano, mas, em termos de efeitos práticos, está praticamente tudo na mesma.
DW África: Que cenário se pode esperar daqui para diante com este pronunciamento do Conselho Constitucional?
JC: Isso já vai depender da reação do principal interessado, que é a RENAMO. Para mim, não me parece que realizar manifestações seja sustentável, porque esta foi a última decisão que se tomou. Eu penso que o importante agora é trabalhar no sentido de corrigir tudo quanto fez com que o processo [ficasse beliscado] e fazermos de tudo para que, no próximo ano [de eleições gerais], as coisas aconteçam de outra forma.
Eu acho que a melhor maneira agora é mobilizar os eleitores - mobilizar ainda mais, porque já se percebeu que há um problema de fraudes -, para inverter esse cenário em 2024. De uma ou outra forma, já há sinais de mudança. Só isso que aconteceu, a pressão que existiu e os resultados, dão a entender que há um terreno fértil para que a oposição possa ganhar mais do que autarquias, no próximo ano.
DW África: Antes das eleições gerais, as autárquicas deverão ainda ser repetidas em alguns locais. O que é preciso fazer para que situações como esta não voltem a acontecer?
JC: Pela experiência do passado, sempre que se repetem as eleições, tudo fica controlado. Eventualmente por já não serem muitas mesas, é muito fácil reforçar a observação. É algo que, até certo ponto, inibe a possível má conduta dos próprios agentes eleitorais. Não acredito que o processo corra mal, até porque interessa ao próprio sistema que tudo corra bem de modo a salvar a má imagem que resultou do atual processo eleitoral.
DW - 24.11.2023