O Governo moçambicano pagou aos credores cerca de 142 milhões de dólares no âmbito do acordo extra-judicial com o grupo “Credit Suisse”, recentemente adquirido pelo Grupo UBS, e os demais membros do sindicato bancário que financiou a dívida de 522 milhões de dólares contraída em nome da ProIndicus, uma das três empresas envolvidas nas dívidas ocultas que empurraram o país para alama, contribuindo para uma acentuada degradação da qualidade de vida dos moçambicanos.
“Pagamento de cerca de 142 milhões de dólares aos credores da dívida da“ProIndicus” é para proteger as elites, incluindo Filipe Nyusi, em prejuízo do povo”, afirma o CDD
The President of Mozambique Felipe Jacinto Nyusi (L) is pictured during a meeting with the King of Belgium at the Royal Palace of Brussels, on April 21, 2016. / AFP PHOTO / THIERRY CHARLIER
As dívidas ocultas foram contraídas com o aval do Estado para alimentar a corrupção e financiar interesses particulares das elites dirigentes do Estado, incluindo o actual Presidente da República, Filipe Nyusi, que na altura dos factos era ministro da Defesa e, nessa qualidade, teve um papel importante para a sua viabilização, o que lhe rendeu mais de um milhão de dólares em subornos, para além de ter beneficiado dos dez milhões de dólares que o partido Frelimo recebeu do calote para financiar a campanha eleitoral que o levou ao Palácio da Ponta Vermelha. Desembolsar 142 milhões de dólares é proteger as elites que se locupletaram do dinheiro das dívidas, sacrificando o já martirizado povo moçambicano que não tem o básico para a sua sobrevivência, o que configura violação de direitos humanos, tais como o direito à Alimentação, o direito à Saúde, o direito à Educação, o direito à Habitação, entre outros.
Um relatório do Banco Mundial revela que as desigualdades permanecem gritantes em Moçambique, com um rácio de “Gini” de 50,4%, que ilustra que a diferença entre os rendimentos dos mais pobres e dos mais ricos ainda é elevada, apesar de ter registado uma descida de 5,7%, saindo de 56,1% para 50,4% entre 2015 e 2020. O consumo médio diário por pessoa é de 50,8 meticais e o consumo médio mensal por família é de 11.900 meticais.
Segundo o relatório de 2023, mais de cinco milhões de moçambicanos entraram para a situação de pobreza durante o período em alusão. No mesmo período, o número de pobres em Moçambique aumentou de 13,1 para 18,9 milhões de moçambicanos e a taxa de pobreza subiu de 48,4% para 62,8% em toda a população, mostrando retrocesso na redução da pobreza no país. O custo de vida agravou-se em mais de 5,3 por cento durante o ano de 2023, com uma subida de preços nos produtos de primeira necessidade.
Neste momento, o Governo não consegue pagar horas extras de mais de 13 meses aos professores, que já há bastante tempo estão numa greve silenciosa. Os médicos e os profissionais da saúde estão insatisfeitos devido a questões remuneratórias e condições de trabalho. O Governo diz que não tem dinheiro. Nos hospitais faltam medicamentos. Chega a faltar um simples paracetamol. As estradas, incluindo a principal estrada que liga o país do Rovuma a Ponta Douro e do Zumbo ao Índico (a EN1), estão esburacadas. Recentemente, a cidade de Maputo, a capital do país, ficou tomada de lixo, porque a edilidade não conseguia pagar as empresas que fazem a recolha de lixo, com as quais tem uma dívida6 de 160 milhões de meticais.
Na altura em que o acordo que permitiu o desembolso dos 142 milhões de dólares foi anunciado (Outubro de 2023), o ministro da Economia e Finanças, Max Tonela, disse que o mesmo permitiria que as partes se libertassem mutuamente de quaisquer responsabilidades e reivindicações relacionadas com as transacções no contexto do processo cível que o Estado, através da Procuradoria-Geral da República, move desde Fevereiro de 2019 em Londres. De acordo com um relatório do Fundo Monetário Internacional, citado pela “Bloomberg”, o pagamento compreendeu cerca de 96 milhões de dólares em títulos em moeda local e 46 milhões de dólares em dinheiro.
Para além do valor despendido no acordo, a aventura do Governo no processo de Londres gastou cerca de oitenta milhões de dólares norte-americanos de despesas com advogados da “Peters & Peters”, que representam o Estado na acção cível que move contra o “Credit Suisse” (antes do acordo), com a “Privinvest” e com outros réus que tiveram envolvimento no caso da emissão de garantias para o financiamento das empresas das dívidas ocultas, nomeadamente, “ProIndicus”, EMATUM e Mozambique Asset Management, gasto à margem da lei e para alimentar esquemas de corrupção.
Essas dívidas foram contraídas pelo Governo de Armando Guebuza com o envolvimento de quadros do Serviço de Informação e Segurança do Estado. O valor foi em viagens, carros de luxo e investido na imobiliária. Os moçambicanos nunca viram um tostão sequer dos mais de dois mil milhões de dólares do calote.
Entrar em acordos milionários é proteger as elites que se beneficiaram do calote, incluindo Filipe Nyusi, que, segundo consta da planilha de subornos de Jean Boustani, recebeu um milhão de dólares em subornos e beneficiou de dez milhões de dólares que a Frelimo recebeu, primeiro como candidato, e mais tarde como presidente deste partido.
Nesse sentido, não é justo que seja o erário público a pagar os milhões de dólares que estão nos bolsos de Gregório Leão, António Carlos do Rosário, Cipriano Mutota, Ndambi Guebuza, Ângela Leão, Teófilo Nhangumele, Manuel Chang, Isaltina Lucas, Inês Moiane, entre outros. Fazer este tipo de acordos, num contexto em que as contas públicas andam vazias, é violar direitos, porquanto o Estado fica privado de condições para a realização de direitos humanos. A falta de água, a falta de alimentação, a falta de cuidados de saúde, a falta de transporte que obriga o povo a ser transportado em carrinhas de caixa aberta como se de gado se tratasse e a falta de habitação condigna são contra os direitos humanos. O Governo deve encontrar formas de lidar com o assunto sem prejudicar o povo e nem comprometer a realização de direitos humanos.(TEXTO: CDD)
INTEGRITY – 20.01.2024