Por Gustavo Mavie
Quando estava a estudar relações internacionais e diplomacia, um dos ensinamentos que me foi impregnado pelos melhores professores que me deram aulas, como o Professor Doutor tanzaniano Ibrahimo Msaba, foi que há problemas que são discutidos nas mesas diplomáticas, que para não dar a entender que há problemas não sanados entre as partes, as mesmas partes optam por não as tornar públicas, limitando-se a justificações evasivas que não fazem nenhum sentido mesmo para os leigos.
Quando também estava a estudar jornalismo, os meus melhores professores disseram-me, por sua vez, que que os problemas que os políticos e diplomatas discutem em portas fechadas, e que não chegam a contento ou os dividem, optam por não torná-los públicos, limitando-se a comuniques vazios, porque acham que só assim podem evitar criar outros problemas para alguns deles, ou contra a coesão dos seus povos. Mas que nós jornalistas os podemos revelar publicamente, salvaguardando no entanto o que pode causar danos aos seus países ou à comunidade local ou Mundial. Isto é o que se chama jornalísticamente de ‘’Diplomacia Aberta’’, em contra-ponto à Diplomacia Oficial, que decorre em portas fechadas, e que usa os tais comunicados evasivos para entreter o público, como esse de que a retirada da SAMIM se deve à falta de dinheiro. É o que irei fazer neste artigo. Vou dizer as coisas com os seus próprios nomes, como uma forma de fazer uma crítica construtiva à própria SADC, por se furtar aos seus deveres consagrados na sua Carta Constituitiva.
Para mim, a desculpa de que está a se retirar porque não têm mais dinheiro, é uma desculpa de mau pagador, dado que foi Moçambique que deu até o que tanto precisava para ajudar alguns dos países da SADC a se libertar da tirania racista a que estiveram durante décadas. Será que se os terroristas estivessem a decapitar sul-africanos angolanos em algumas das suas províncias, os seus governos iriam dizer que ‘’bom, nada podemos fazer para combatê-los, porque não temos dinheiro para manter tropas nessas províncias, para os combater? Claro que não diriam isso. Iriam sim mobilizar todos os seus recursos para combate-los até ao ultimo soldado e policia sul-africano e angolano. Mas como acham que não é dever da África do Sul ou de outros membros da SADC gastarem o seu dinheiro e arriscar os seus soldados a lutar contra os terroristas que estão decapitando moçambicanos, então optam por pular de Cabo Delgado. Mas isto é como disse já ser mau pagador. É não retribuir em ouro o que Moçambique deu em ouro para ajudar a libertar a própria África do Sul e alguns outros países da região, como o Zimbabwe, dos então sanguinários regimes racistas e do apartheid, que negavam os direitos mais básicos à maioria negra.
Os actuais dirigentes de alguns países que agora integram a SADC, estão a trair ou faltar ao cumprimento dum dos mais fundamentais compromissos da Carta que instituiu esta organização fundada em 1980 como SADCC, e mais tarde em 1992 com menos um ‘’C’’.
O tal compromisso ou artigo da Carta constitutiva, reza que ‘’uma agressão a um país membro é uma agressão a todos eles’’. Assim sendo, não faz sentido que deixem um pais membro a lutar contra quem está a agredir todos, com a alegação de falta de dinheiro. Esta alegação não cabe mesmo na cabeça duma criança, muito menos para as crianças do presente século XXI que já aos 8 ou 10 anos já sabem tanto quanto sabiam as de há 50 anos com a mesma idade, porque as actuais aprendem não só nas escolas como nas Tvs e cellphones inteligentes.
Por favor, deviam ter forjado outra desculpa e não essa de que não têem mais dinheiro!
Como disse, eu sou versado em diplomacia e jornalismo e temperado com outros saberes que jazem nos livros, e por isso estou documentado a ponto de saber que vão deixar Cabo Delgado não por causa da falta do dinheiro, mas porque nunca assumiram aquele terrorismo como sendo uma agressão aos vossos próprios países também. Mas saibam que o terrorismo é como um incêndio na casa do vizinho que se o não ajudam a extinguir, atingirá as vossas também.
O problema que não assumem que é também vosso problema, mas apenas exclusivamente de Moçambique. Não encaram genuinamente como vosso dever ajudar Moçambique a combater aqueles diabólicos tal como há 40 anos Moçambique assumiu as lutas dos povos sul-africano, zimbabueano e namibiano como sua luta também, e que por causa disso os moçambicanos pagaram um elevado e doloroso preço, incluindo o assassinato dissimulado de acidente aéreo do fundador e primeiro presidente do seu país, que foi Samora Machel.
Na verdade, sei através de revelações dos oficiais e soldados moçambicanos que combateram e ainda combatem os terroristas em Cabo Delgado, que a tal missão da SADC, SAMIM, nunca foi na medida e acção desejáveis. Foi uma presença mais simbólica que real, porque limitaram-se a mandar mais oficiais que se mantinham nas suas bases ou mesmo hotéis que no teatro da guerra como os faz o contingente ruandês de que tanto se tenta diabolizar mas que é o que tem feito um combate digno de se dar um bayete ou viva a alto som e tom.
Com base no que sei sobre a SAMIM, a sua retirada não fará muita ou mesmo nenhuma diferença, e se fez, terá sido mais pelo medo que terão incutido nos terroristas em função do teorema que reza que é o medo que guarda a seara e o guarda, porque a SAMIM nunca foi tão combativa no terreno como estão sendo as tropas moçambicanas e ruandesas.
Sei que haverá quem dirá que estou sendo ingrato à SAMIM, mas esta é a verdade pura e genuína que estou a revelar aqui em nome da verdade jornalística que jurei fazer. Uma das provas de que nunca assumiram este problema como deles também, é que o somatório do contingente dos oito países da SADC que contribuíram com tropas esteve muito aquém dos mais de 2.000 que o Ruanda sozinho mantém em Cabo Delgado! O próprio presidente ruandês, Paul Kagame', já condenou esta falta de proactividade e prontidão combativa da UA na luta contra os inimigos comuns da África.
É mesmo por isso que o presidente moçambicano Filipe Nyusi, escreveu diplomaticamente na sua página de Facebook que “Como moçambicanos precisamos estar preparados para esta realidade. Não fiquemos distraídos. A responsabilidade maior está conosco. Precisamos estar todos unidos e concentrados”. Quem assim fala não é gago, como dizia sempre o melhor meu professor do jornalismo, o agora falecido Dr. Augusto de Carvalho. Há indicações de que entre os oito países, há os que não estão a favor dessa retirada e que irão se manter a título bilateral. Do que apurei de fontes do governo, o Zimbabwe é um dos que já manifestou essa intenção de continuar a combater os terroristas. Alias, este é um dos poucos países que tinha mais forças na SAMIM que os restantes.
Decidi expor a falácia da retirada da SADC, porque é dever de nós jornalistas expor tudo o que é ruim, para que os seus autores mudem ou saibam ao menos que sabemos e não gostamos como pregou o lendário Martin Luther King Jr. Mais não disse embora haja muitas verdades ainda em torno da SAMIM como da União Africana (UA) que também não tem cumprido o seu dever preconizado igualmente pela sua Carta Constitutiva que proclama tal como a da SADC que ‘’uma agressão a um dos países membros da UA é uma agressão a todos eles’’. Era imperioso que a UA ajudasse Moçambique a combater os terroristas em Cabo Delgado, tanto mais quando é um facto que este grupo jihadista é inimiga de toda a África, de toda a SADC como é de todo o mundo.