EUREKA por Lauarindos Macuácua
Cartas ao Presidente da República (183)
Desculpa, Presidente. Mas espanta-me o descaso com que gerencia as nossas crises. É deveras preocupante essa ausência de empatia. O que me empurra a dizer isto agora é o pronunciamento, ontem na Assembleia da República, do ministro da Indústria e Comércio. Silvino Moreno disse que o Presidente, depois de 98 pessoas que morreram num naufrágio ao largo da ilha de Moçambique, “orientou o Governo para, de imediato, trabalhar no sentido de, primeiro, reabilitar a estrada de 36 quilómetros que liga Naguema a Lunga”.
A forma como o Governo, desde o princípio, lidou com este assunto deixa muito a desejar. O Presidente levou mais de dois dias para se pronunciar. E quando esteve em Nampula, primeiro juntou-se à festa da comunidade muçulmana que celebrava o Eid al-Fitr (celebração que marca o fim do jejum do Ramadão). De certeza que se comeu à fartura. E só depois o Presidente recordou-se de ir à ilha de Moçambique para dizer palavras pouco palatáveis. E agora o ministro Moreno diz o que mesmo ele não acredita que irá acontecer.
As dificuldades de travessia, naquela como noutras zonas deste imenso País, são enormes e antigos. Não surgiram agora que morreram aquelas 98 pessoas- o Presidente já anda aqui há dez anos. E não são promessas vãs, típicas de um Governo populista, que vão consertar o problema. Em Sofala sucedeu o mesmo esta semana. Qual é a promessa?
Houve (vou conjugar este verbo no indicativo mesmo) muito tempo- dez anos- para se construir essas estradas e pontes. E talvez não havia morrido ninguém- ou pelo menos não em número assustador. Agora que o Presidente está de saída é quando se recorda de estradas e pontes. E é estranho não ter reparado que essas infra-estruturas fazem falta tendo uma casa em Chocas Mar, bem perto do local do naufrágio.
Causa espanto a indiferença do Governo pelos mortos de naufrágio, por moçambicanos que, em boa parte, morreram em decorrência da forma catastrófica com que este Governo lida com assuntos nacionais.
É verdade irrefutável que o dono da embarcação que transportava as 130 pessoas é culpado pelo que sucedeu. Mas também não é menos verdade que são culpados os que deveriam ter evitado que esse tal individuo transportasse tanta gente num barco destinado à pesca. Há um barco alternativo ao que naufragou para o transporte condigno de pessoas? Não. E quem o devia colocar naquele ponto, de certeza, não é o Laurindos...
DIÁRIO DE NOTÍCIAS - 19.04.2924