Por Edwin Hounnou
Vi na stv, na noite de 26 de Agosto, Joaquim Chisswno, antigo presidente da República, a declarar, de forma aberta que vai votar em Daniel Chapo e na Frelimo, para que não restasse nenhuma réstia de dúvida . Não vemos mal nenhum em que alguém diga que vai votar no candidato X e no partido Y. É assim como as coisas funcionam em democracia plena e isso não deve, de forma alguma, levar à represália nem à discriminação de qualquer ordem ou que seja motivo para ver as portas de oportunidades fechadas. Em democracia, não é crime algum pensar diferente. Eu tenho mil e uma razões para reafirmar que não votarei no candidato da Frelimo nem no seu partido. Tenho motivos de sobra para pensar e agir de tal maneira.
Refrescando algumas memórias, nunca foi tão arriscado ser da oposição ou emitir uma opinião política diferente como no tempo de Filipe Nyusi. No dia 13 de Setembro, na província de Manica, localidade de Chibata, a escassos 15 quilometros do Chimoio, a caravana de Afonso Dhakama cai numa emboscada e quatro dos seus acompanhantes ficaram feridos.
No dia 25 de Setembro do mesmo ano, mais uma perigosa emboscada foi montada por uma subunidade das Forças Armadas da Defesa de Moçambique contra Afonso Dhakama, que se deslocava no sentido Chimoio-Gorongosa, a cerca de 30 km da cidade de Chimoio. Nessa emboscada, oito viaturas da Renamo foram incineradas e sete guardas do líder da Renamo tombaram.
Nada pode recompensar ou sarar a ferida e a dor que sinto. Quando me cruzo, nas esquinas da cidade ou em outro lugar qualquer, com os bandidos e assassinos do regime já identificados, a fúria toma conta de mim e parece que a justiça tarda a chegar.
Seria óptimo que a justiça chegasse antes que esta corja passe para outro mundo, porque a minha família e de tantas outras, gostariam de ouvir a versão dos assassinos para sabermos o que fizeram com os nossos parentes - pais e irmãos - para merecerem a pena de morte. Queremos realizar um funeral condigno. Exigimos que nos entreguem as ossadas dos nossos parentes. Não estamos a pedir nada de extraordinário.
Levo, no fundo do meu coração, muita mágoa contra bandidos e assassinos da Frelimo por grande falta de respeito pela vida humana. Prendem e assassinam como de aves da capoeira se tratasse. Têm as mãos sujas de sangue. As pessoas que comigo convivem sabem do que me estou referindo. Quando se pensava que com a democracia as coisas mudariam, equivocou-se.
No consulado de Filipe Nyusi, esquadrões da morte caçavam membros da oposição e académicos. Uns tiveram a sorte de verem quebradas as suas pernas enquanto Gilles Cistac, professor constitucionalista, foi o mais azarento. Foi morto a tiro, a 3 de Março de 2015, na zona nobre da Cidade de Maputo. Os assassinos continuam até hoje à vontade lá no "monte vermelho".
Se o partido Frelimo fosse o único a concorrer às eleições, como acontecia no passado monopartidarismo, seria, para mim, um dia grande reservado para ir à praia dar um mergulho, porém, como há alternativas de escolha, embora não sejam tão interessantes quanto gostaria, serei um dos primeiros na fila a ir votar, a ver se o povo se liberta da escravidão para a qual foi jogado por indivíduos que proclamavam paz, independência, liberdade e desenvolvimento.
A situação não se vai alterar de forma significativa ainda que o povo esteja cansado de um regime corrupto e ineficaz. Os partidos da oposição andam mais interessados no "tacho" e no bem-estar dos dirigentes das suas cúpulas. Nunca se organizam para escorraçar a Frelimo do poder.
Para além de questões de âmbito pessoal/familiar, há problemas de fundo do país que pesam sobre a minha decisão de me recusar a votar na Frelimo e em seu candidato.
O país está independente há 50 anos e a situação não pára de regredir. Todos os dias, damos um passo para trás. Ao invés de crescermos, recuamos à toda a velocidade que se pode imprimir ao nosso barco comum. Não temos uma única estrada nacional em boas condições. A que existe está cheia de buracos.
O povo continua sendo transportado em carro de caixa aberta, como se fosse gado. Importamos tudo que precisamos para nos alimentarmos, apesar de sermos um país com 36 milhões de hectares de terra arável adormecida e com cerca de 72 rios com curso de água permanente desaproveitada.
O sector da Educação está morto. Nossas crianças estudam ao relento e encurvadas ao chão. Os professores estão com salários de horas extraordinárias atrasados há cerca de dois anos. A saúde está um caos, sem fármacos mais elementares. Os doentes socorrem-se de farmácias privadas. Muitas vezes, falta a compressa, âlcool, um paracetamol.
Na importação de medicamentos, os graúdos do partido no poder intercalam-se. A luta é para se ficar com as comissões e isso não constitui segredo nenhum. Os enfermeiros e médicos estão em greve, por vezes, passiva e, por vezes, activa. Está tudo mal. Até os magistrados estão em greve. O nosso país desceu em todos ranking internacionais.
Por estas e outras razões, não poderei, em consciência, votar na Frelimo e no seu candidato. O povo está cansado de mentiras e da violência. Chapo não vai mudar nada. O nosso problema é a Frelimo e não sao as pessoas. Estamos conversados!
VISÃO ABERTA - 04.09.2024