Excelentíssimo Secretário-Geral das Nações Unidas, Secretário do Departamento de Estado Americano para África, Presidente da Comissão Europeia, e Embaixadores acreditados em Maputo,
Apelamos para a vossa atenção e acção perante o cenário de violações graves dos direitos humanos e da ordem democrática em Moçambique, em consonância com a Carta das Nações Unidas e o Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos. As eleições de 9 de outubro expuseram fragilidades e injustiças que colocam em risco a legitimidade democrática e a segurança de cidadãos e opositores políticos.
Historicamente conhecida por seu peso e domínio, a Frente de Libertação de Moçambique (FRELIMO) mostrou-se um partido não invencível pela força de sua ideologia ou popularidade, mas sim por um complexo sistema de controle sobre as instituições do Estado — nomeadamente a Comissão Nacional de Eleições (CNE), a Polícia, A Procuradoria Geral da República e o Secretariado Técnico de Administração Eleitoral (STAE), com suporte final do Conselho Constitucional. Este mecanismo transformou-se numa engrenagem que opera em detrimento da vontade eleitoral do povo, contrariando os princípios de governação transparente e justa, defendidos pela ONU e por acordos internacionais.
Mitos sobre o "gigantismo" da FRELIMO, que sempre sustentou sua suposta invencibilidade, foram desmascarados ao se perceber que o poder deste partido está fundamentado na repressão e na força armada. Como Golias, este "gigante" não se sustenta por si, mas por meio do controle sobre os servidores públicos, da realização de reuniões coercivas que obstruem o funcionamento do Estado e da manipulação do sistema eleitoral.
A situação é alarmante: as forças de segurança têm actuado de forma desproporcional e violenta contra os cidadãos que, constitucionalmente, exercem o direito de manifestar-se. Cidadãos indefesos têm sido reprimidos brutalmente, com prisões e até mortes, como evidenciado pelos recentes assassinatos do advogado Elvino Dias e do ativista Paulo Gwambe. Esta repressão segue-se ao desarmamento dos opositores, como foi o caso da RENAMO, enquanto o governo permanece com o monopólio das armas, utilizando-as como instrumento de medo e controle, do livre arbítrio. Destarte, numa manifestação em Maputo, a Polícia atirou a disparar sobre um jornalista e a outros dispersou-os com gás lacrimogêneo, enquanto entrevistavam o potencial vencedor das eleições, Venâncio Mondlane, que foi forçado a deixar o país, por ameaças veladas à sua integridade física.
Filipe Nyusi, o presidente actual, com apoio de Paul Kagamé, governa de forma cada vez mais autoritária, tendo sido comparado a outros líderes globais que utilizam o aparato militar para reprimir populações. Tal como se alega em casos internacionais de repressão, o governo de Nyusi justifica suas acções sob argumentos de "segurança", mas as evidências apontam para uma repressão violenta que visa a perpetuação do poder, depois de fracassar a sugestão ao povo, para aguardar pelos maquinados resultados eleitorais, que seguem uma prática recorrente, o que levantou os ânimos da população cansada dos resultados eleitorais. A situação é ainda mais crítica quando um Estado depende fortemente de ajuda internacional, mas utiliza esses recursos para silenciar seu próprio povo, ao invés de promovê-lo e respeitar seus direitos fundamentais.
Aos líderes internacionais, solicitamos atenção e apoio urgentes para pressionar o governo de Moçambique a respeitar os compromissos assumidos perante a comunidade internacional, nomeadamente no que se refere ao respeito pelos direitos civis e políticos. O apelo é para que os direitos do povo moçambicano sejam garantidos, que as eleições sejam justas e que as liberdades civis sejam preservadas.
Contamos com a vossa solidariedade e firmeza na defesa dos princípios que nos unem e que devem guiar todas as nações, especialmente as que integram a ONU. Contamos com a vossa atenção de vigia, também, às manobras do Conselho Constitucional, presidido por Lúcia Ribeiro.
Atenciosamente,
Gaspar Sarmento Alfândega
Gorongosa, 01 de Novembro de 2024