Por João Cabrita
A crise política que o país atravessa decorre de mais um processo eleitoral marcado pela fraude. O Partido Frelimo é avesso a eleições livres. O pluripartidarismo não faz parte da cultura do auto-proclamado Partido Dirigente.
A revisão constitucional de 1990, que previa a realização das primeiras eleições livres desde a proclamação da independência de Moçambique tratou-se, não de uma opção genuína pela democracia, mas de um expediente político visando assegurar a continuidade de um regime divorciado das aspirações e interesses legítimos dos cidadãos moçambicanos.
Embora afirmando, na sequência do golpe de Estado ocorrido em Portugal em 25 de Abril de 1974, como sendo um movimento que lutava contra o fascismo, na realidade o programa da Frelimo visava a instauração de uma nova ditadura em que os cidadãos viam negados os seus mais elementares direitos.
Durante a vigência do governo de transição para a independência de Moçambique (20.09.1974 - 24.06.1975), em Portugal faziam-se preparativos para a realização de eleições livres. Em conformidade com as regras de Estados de Direito, todos os eleitores portugueses, residentes em Portugal e no estrangeiro, teriam o direito de participar nesse processo eleitoral. Os vários partidos políticos competiriam em pé de igualdade.
O governo de transição de Moçambique, com participação maioritária da Frelimo, impediu que cidadãos portugueses residentes em território moçambicano participassem no novo processo eleitoral português, rumo à criação de um verdadeiro Estado de Direito em Portugal. O círculo eleitoral de Moçambique elegeria 3 deputados para a Assembleia Nacional portuguesa.
Documentação oficial consultada em arquivos históricos portugueses revela que o governo de transição dirigido pela Frelimo considerava que "a organização em território moçambicano de comissões de apoio a candidaturas pode(ria) comprometer gravemente as condições de segurança e o clima de paz reinante".
Um telegrama expedido pelo Alto Comissário de Portugal em Lourenço Marques a 12 de Fevereiro de 1975, dizia que para o governo de transição dirigido pela Frelimo, "os actos de um processo eleitoral, designadamente campanhas eleitorais e propaganda poderiam de qualquer forma afectar o processo de descolonização" de Moçambique. (página 2 do telegrama.)
Tratava-se, efectivamente, de uma forma maquiavélica de a Frelimo impedir que os cidadãos moçambicanos se apercebessem de que no novo Portugal, saído do golpe de 25 de Abril de 1974, as pessoas passavam a usufruir de direitos básicos, como o de elegerem e serem livremente eleitas em processos eleitorais transparentes. O apregoado "anti-fascismo" da Frelimo, e a alegação de que contribuira para a libertação do povo português, traduziam-se, por um lado, na negação de direitos democráticos a cidadãos portugueses residentes em Moçambique; por outro lado, a Frelimo impedia que o povo moçambicano testemunhasse o exercício desse direito por esses cidadãos.
Na realidade, eleições livres não condiziam com o programa totalitário da Frelimo cujos dirigentes eram avessos a processos eleitorais democráticos, imperando. o abuso de poder, a imposição de ideias por meio da forças, agindo sempre com impunidade.
A campanha eleitoral portuguesa coincidia com uma onda de prisões de conhecidas figuras políticas moçambicanas por exigirem que o reconhecimento do direito de Moçambique à independência devia incluir a criação das bases de um Estado de Direito, mormente a realização de eleições livres, em que todos participariam em pé de igualdade.
Tais figuras foram ilegalmente transferidas para base militar da Frelimo em território estrangeiro, concretamente em Nachingwea, Tanzânia, para aqui serem submetidas a julgamentos populares reminiscentes da era stalinista. Numa flagrante contradição, os dirigentes da Frelimo, que reclamavam ter contribuído para a conquista da liberdade do povo português, negavavam essa mesma liberdade aos cidadãos moçambicanos.
Desde então, a Frelimo tem vindo a negar aos cidadãos moçambicanos a realização de eleições livres. Reprime com crueldade os cidadãos que, de forma pacífica, saem às ruas a reclamar um direito inalienável, consagrado em teoria na Constituição, mas que são garantidos em instrumentos de Direito Internacional, como a Carta Africana dos Direitos Humanos e dos Povos e a Declaração Universal dos Direitos Humanos.
Com a mesma impunidade de regimes fascistas, nazis e sociais-fascistas, o "Partido Dirigente" utiliza a milícia armada UIR-GOE para de forma selvática descarregar o peso do seu arsenal mortífero sobre cidadãos indefesos. Dá carta branca a agentes secretos para assassinarem activistas da sociedade civil, e reprimirem todo um povo em revolta contra os abusos, a corrupção e um rol de crimes hediondos.
O regime prepara-se para concretizar o plano há muito idealizado de permanecer no poder uma vez expirado o prazo previsto na Constituição da República. Para o efeito, promove o "diálogo", que faz questão de diferenciar de "negociação". Incentiva a elaboração de agendas com infindáveis temas e sub-temas, deixando propositadamente de fora o cerne da questão : a vigarice eleitoral de 9 de Outubro. Em suma, a burocratização da fraude e uma mesma táctica visando um velho objectivo - o de "fintar" o adversário.