Em uma entrevista exclusiva concedida a Integrity Magazine, sobre os recentes resultados eleitorais, o jornalista e analista político Alexandre Chiure expressou sua visão a respeito da ascensão do candidato presidencial Venâncio Mondlane destacando a relevância histórica de sua trajectória e como se tornou no principal vencedor, um vencedor que transcende os números de voto.
Chiure começou sua intervenção reflectindo sobre a expectativa geral em relação às eleições, que, segundo ele, centrava-se em uma disputa entre duas figuras principais: Daniel Chapo e Venâncio Mondlane. Para ele, essa previsão se cumpriu parcialmente. Entretanto, o foco principal de sua análise recaiu sobre a questão dos números e a sua desconfiança em relação aos dados divulgados durante os processos eleitorais pelos órgãos eleitorais, que dão vantagem a FRELIMO e ao seu candidato Daniel Chapo.
“Eu nunca confiei nos números… Eles podem ser manipulados para satisfazer interesses políticos”, afirmou Chiure.
Essa manipulação, segundo ele, prejudica a credibilidade dos resultados e a percepção pública do que realmente ocorreu nas urnas, dado que há um entendimento de que os editais e actas elaborados nas mesas de votação em vários pontos davam vantagem á um partido e candidato, mas depois os órgãos eleitorais comunicam outros completamente diferentes.
O grande vencedor
Independentemente da confiabilidade dos números, Chiure foi enfático ao destacar que Venâncio Mondlane foi o “grande vencedor” dessas eleições. Para este, Mondlane não foi à guerra, mas saiu de casa, reuniu a documentação necessária, candidatou-se e conquistou resultados históricos, colocando o partido PODEMOS no parlamento de forma surpreendente, um partido que dificilmente chegaria lá por conta própria.
“Isso é histórico. Não há ninguém em Moçambique que tenha alcançado o que Venâncio Mondlane conseguiu sem ir à guerra”, disse Chiure, referindo-se ao facto de Mondlane ser um candidato que obteve um desempenho notável sem os recursos políticos tradicionais.
Futuro político de Mondlane e do PODEMOS
Chiure apontou que, se Venâncio Mondlane conseguir manter-se na segunda posição, poderá assumir a liderança da oposição e, com isso, subsistir Ossufo Momade, líder da RENAMO, e desfrutar de regalias como gabinete, staff e protocolos associados. Também, especulou sobre a possibilidade de Mondlane assumir a presidência do Podemos, caso Forquilha, o actual líder, decida ceder o comando ao candidato como uma estratégia para a sobrevivência do Podemos depois da próxima legislatura e evitar que este funde um partido rival.
“Se o PODEMOS não o colocar na presidência e mandar, poderá fundar o seu próprio partido para as próximas eleições.”
Chiure alertou ainda que, sem mandar, o Podemos corre o risco de perder espaço no parlamento, caso não consigam sustentar o crescimento político que obtiveram nestas eleições.
A erosão da RENAMO
Sobre o fracasso de Momade, Chiure não se mostrou surpreso, atribuindo os maus resultados às falhas na gestão da crise envolvendo a liderança do partido e Venâncio Mondlane. Este destacou que o tratamento dado a Mondlane, quando este deixou o partido, alienou uma parte significativa dos simpatizantes da RENAMO, que preferiram apoiar Mondlane nas eleições.
“A RENAMO está colhendo o que plantou”, disse Chiure ao comentar a queda drástica de apoio popular ao partido.
A questão da abstenção
Outro ponto levantado por Chiure foi o alto índice de abstenção nas eleições, que ele estima estar em torno de 56%. Segundo ele, esse fenômeno é reflexo de um processo eleitoral que não gera confiança na população, devido à falta de transparência e às irregularidades constantes.
“Os processos eleitorais em Moçambique têm estado a perder interesse porque, no final, os resultados não reflectem a vontade popular”, afirmou.
A entrada de Venâncio Mondlane na corrida eleitoral trouxe algum frescor e motivou parte do eleitorado jovem a comparecer às urnas, mas ainda assim, a abstenção se manteve elevada.
Por fim, Alexandre Chiure concluiu sua análise sugerindo que uma maior independência dos órgãos eleitorais, como a Comissão Nacional de Eleições (CNE) e o Conselho Constitucional, é necessária para que os processos eleitorais voltem a ser atractivos para o eleitorado moçambicano.
“Precisamos acabar com a partidarização dos órgãos eleitorais e garantir que sejam justos, livres e transparentes”, finalizou Chiure. (Ekibal Seda)
INTEGRITY – 10.11.2024