Ah, Moçambique, terra de ironias e paradoxos. Enquanto nossos acadêmicos, perdidos nos labirintos das suas bibliotecas, dançam com conceitos ilusórios, a população dita analfabeta está na rua, a organizar o país. E como eles fazem isso? Do jeito que sabem, com o que têm, e da forma que podem. Não é perfeito, mas está a acontecer. E onde estão os intelectuais agora? Escondidos, claro, com a língua portuguesa engolida para dentro. Eles, que falam um português tão rebuscado que até parece que engoliram um dicionário – mas, na hora de usar o conhecimento para ajudar quem nunca teve a oportunidade de estudar, calam-se ou complicam.
Sim, que vergonha. É como se soubessem muito, mas tudo fosse inútil. O conhecimento só vale se sai das páginas e ganha vida no mundo real. Mas nossos doutores, com toda a sua pompa, estão mais preocupados com vaidade e status. Agora que perderam o palco, estão encurralados. Enquanto isso, o povo, aquele mesmo povo que dizem “não saber falar português”, aquele povo que vive ao lado da lixeira e dos esgotos a céu aberto, está a fazer a gestão do país com as ferramentas que têm.
Aí os acadêmicos, na sua frustração, ao invés de se unirem ao movimento, fazem o quê? Criticam. Alguns até tentaram abafar o início dessa iniciativa popular, talvez com medo de que o caos mostrasse a sua própria irrelevância. Afinal, eles tiveram anos para organizar as coisas – com diplomas, teorias e fórmulas –, mas não conseguiram. Agora o povo está a fazer e, claro, eles sentem vergonha.
O cúmulo disso tudo é a espera. Estamos todos à espera que o Conselho Constitucional faça a grande revelação da verdade eleitoral. Mas o povo já decidiu: eles não precisam de uma verdade institucional, eles querem uma verdade vivida. Enquanto os intelectuais debatem “consensos teóricos” nos seus gabinetes, o povo está a expor a sua própria versão da verdade, na rua, na poeira, no calor.
O que resta aos acadêmicos? Frases bonitas, metáforas complicadas e a negação. É trágico, mas engraçado: passaram tanto tempo a construir castelos no ar que agora, sem chão, só conseguem tropeçar nas próprias palavras. Afinal, parece que o maior analfabetismo aqui é o da prática: saber muito, mas não conseguir fazer nada.
Observador,
Henda Ya Xiyetu