Por: Armindo Chavana - Jornalista
Um dos meus hobbies favoritos é ir à oficina do meu bairro passar um bom tempo com os meus miúdos (entenda-se jovens). Sou mais velho, e a juventude actualiza-me, aprendo um novo calão, novas tendências da moda- esses novos swagg-, mas também vou partilhando a minha humilde experiência de vida. São acima de 30, todos eles com arte, habilidosos e bons no que fazem: serralharia, mecânica, pintura, eletricidade, bate-chapa, etc.
Embora vivam num bairro conotado com o crime (injustamente), nenhum deles é criminoso. São de famílias empreendedoras e honestas, como o grosso das famílias moçambicanos. A nossa conversa flui porque os nossos backgrounds são muito parecidos: também vendi maheu nas Lagoas, não tive saneamento básico, cresci numa rua com muitos desafios de segurança, e até mais alagadiça do que é hoje.
Nestes dias, este movimento “contestatário” que tem arrebatado alguma juventude, levou alguns destes miúdos à rua. Também eles partiram e saquearam coisas e gritaram anamalala (basta). Ontem, numa das nossas tertúlias perguntei-lhes: basta o quê?
“não temos emprego, tio” – foi a resposta.
Acontece que cada um destes jovens atende 2 a 3 carros por dia e ganha mais ou menos 3 mil meticais, o que resultaria numa média de 15 mil por semana, e 60 no final de cada mês (um licenciado da função pública aufere 37 mil meticais de salário/base).
Emprego, jovens!? O carro, que é o vosso principal objecto de trabalho, pulula aos milhares nesta cidade, e há sempre um por consertar, ou por lavar. O poder que saem à rua para reclamar, e até com muita violência, é um poder que já têm, ou esteve sempre ao vosso alcance. Não precisam de pedi-lo a ninguém. Assumam a vossa arte com mais responsabilidade, poupem o que ganham, invistam, façam do vosso trabalho uma carreira, aprendam novas técnicas de gestão dos vossos negócios, e vão ver a diferença. Numa cidade como a nossa o carro é um asset. Tomem vocês o controlo desse bem e não deixem que ninguém o use contra o vosso interesse. Quando os carros não circulam vocês não trabalham, e é do trabalho que se constrói uma nação.
Olhem à vossa volta e do Estado vão ver apenas as ruas, e os postes de iluminação. O resto, casas, automóveis, empreendimentos, são propriedade de pessoas singulares como vocês, e é isso que vos mandam destruir. O sucesso do vosso semelhante é para vos fazer querer ser como ele, não é para criar inveja, ou ódios.
Nestas manifestações também vemos jovens universitários a reclamarem “não temos empregos, formamo-nos e não nos dão emprego, por isso, à rua connosco e anamalala!”.
Cinco bons colegas duma formatura em direito podem constituir uma firma de advogados. Pode custar no começo, e deve custar, mas é esse o caminho, num país em que o Estado vai ficando cada vez mais mínimo.
Em Moçambique, exemplos de sucesso com trabalho próprio e árduo não faltam.
Mulheres vendedeiras no Xipamanine fazem xitiques diários, alguns de dezenas de milhares de meticais. Não é por acaso que todos os grandes bancos têm uma dependência naquele caos. Captam poupança, muita poupança que resulta do trabalho de moçambicanas, e moçambicanos, alguns dos quais nem sabem ler ou escrever.
Não quero trazer à colação a chamada crise pós-eleitoral porque ela me parece um falso argumento para distrair os distraídos. Prefiro deixar isso à conta do tempo.
Ps.Um dos problema é que a classe política criou a noção de que trabalho de pobre é sempre precário até ele conseguir um “emprego” formal mesmo que vá ganhar menos que o seu rendimento real na oficina ou barraca aonde nem precisa de pegar um chapa para chegar. Por isso os manifestos estão infestados de promessas de criação de emprego para responder a expectativa dos eleitores do que um plano sério de promoção de empreendimentos.
A mudança deve começar nas designações, nas narrativas porque as palavras têm sempre consequências. Por isso os governos tratam por sector informal um sector em que uma parte já tem um desempenho superior a algumas firmas do formal em termos de volume de negócios.
Mudando a terminologia talvez o governo ajuste a sua abordagem e aceite que a fonte de crescimento sai da periferia e é preciso olhar para esses empreendimentos e empreendedores como solução e não como problema. Cirrculando pelos bairros só vemos pujança e empreendedores a viabilizarem os projectos mais incríveis. Há quem pense que isto é desenrascar a vida mas não é bem verdade. Em cada 100 metros aqui há uma micro empresa a maior parte delas viáveis porque sustentam famílias. Não são um impencilho são viveiros onde se forjam os nossos empresários.