EUREKA por Laurindos Macuácua
Cartas ao Presidente da República (209)
Este é um País cada vez mais absurdo. Ou seja, Moçambique, tal como o conhecíamos há sensivelmente dez anos atras- para não recuar tanto-, já não existe. Caminhamos a passos largos para o fim do Estado moçambicano. Quanto mais penso na crise moçambicana, mais me convenço que não entendo nada. Como entender um País que tem dois candidatos vencedores da mesma eleição presidencial?
Assim que o fraudulento Governo de Daniel Chapo tomar posse em Janeiro próximo (é que não vejo o Conselho Constitucional a ganhar juízo), podemos ter como certo que desapareceu o Estado moçambicano, pois o Estado são as instituições que o compõem e lhe dão vida no âmbito da legalidade. Porém ter chegado a esse nefasto cenário não é apenas culpa da Frelimo. A bem da verdade, é culpa de todos, porque nenhum de nós tentou parar esse punhado de pessoas que se aboletou no poder e faz de Moçambique seu quintal.
Nem mesmo alguns frelimistas decentes que sei que os há. Moçambique está de rastos. Desde Outubro. As manifestações viraram moda. Diz-se que é em nome do roubo de votos. Mas eu escolho uma palavra diferente. É em nome da desgraça que se tornou o Estado moçambicano, de que tanto dependem e precisam indivíduos como eu. Desprovidos de tudo e vítimas de injustiças abjectas e variadas formas de exploração.
E estão no topo, à mesa farta, alguns indivíduos hostis à igualdade social, predadores e oportunistas, auto-centrados em interesses mesquinhos. E, perante uma situação destas, podemos ter a sensação de ser impossível que algo de mais grave nos aconteça. É a famosa expressão de “bater no fundo”, usada com frequência, quantas vezes para caracterizar uma situação política e económica.
Mas esta é muitas vezes uma sensação ilusória, face à volatilidade da noção do limite em que cremos estar, sobretudo quando se trata de Moçambique.
Nunca deixamos de ser um País-mendigo, mas com este Governo tiraram-nos até as calças. E ninguém ri do outro. Normalizamos o absurdo. Quer dizer, há quem dorme num palácio como Ponta Vermelha, e sente-se realizado por governar mais de 30 milhões de moçambicanos que não têm onde cair mortos?!
É mentira de que 30 milhões de moçambicanos não têm hoje acesso aos bens mais básicos, como água, medicamentos ou comida?
Há uma coisa que me indigna: a Frelimo queria que o povo moçambicano continuasse a tolerar a sua postura ditatorial e circense?
Bom, por mais que tudo isto pareça familiar, a política moçambicana surpreende sempre. Há semelhanças com experiências anteriores, sim, mas também elementos novos. A resposta do Governo é cada vez mais dura e radical, a oposição está forte e unida como nunca antes, a Frelimo perdeu o apoio popular. O que nos espera, aos deuses pertence. Mas a Frelimo, neste momento, serviria bem ao País se estivesse na oposição.
DN – 06.12.2024