António Costa, em Moçambique, resolveu pedir desculpas por causa do massacre de Wiriamuru, ou qualquer coisa do género.
Boa parte da esquerda e o Chega estão de acordo em dar importância a estas coisas inconsequentes, uns porque acham fantástico pedir-se desculpa por uma coisa pela qual não se tem responsabilidade - em sociedades em que não há culpa colectiva - outros porque acham um crime de ofensa aos símbolos e soberania nacional.
Por mim, estão bem uns para os outros e limito-me a lembrar que para decidir o que são crimes de guerra existe um tribunal, o Tribunal Internacional Penal e lembro que mesmo o tribunal de Nuremberga, o antecedente deste que agora existe (mesmo que tenha sido um tribunal militar), condenou pessoas, não condenou sociedades.
Se quiserem condenar Estados, têm outro tribunal à mão. Até seria interessante, ver o Estado português, qual Egaz Moniz, apresentar-se no Tribunal Internacional de Justiça, com um baraço ao pescoço, para ser condenado pelas atrocidades cometidas ao longo da sua história.
No que não podia estar mais de acordo com Ana Sá Lopes, no seu artigo deste Domingo no Público, era com a ideia de que existe um "pacto de silêncio", só discordamos sobre a natureza desse pacto.
Ana Sá Lopes (e boa parte da esquerda inconsequente), acha que existe um pacto de silêncio do Estado português para não se falar nos crimes da guerra colonial, apesar do Estado português financiar muita investigação sobre o assunto, garantir inteira liberdade para cada um dizer o que quiser sobre o assunto (o que há é pouca gente com vontade de falar sobre parte dos crimes de guerra cometidos por um dos lados) e o massacre de Wiriamuru não ser nenhum segredo de Estado.
Pelo contrário, eu acho que existe um pacto de silêncio sobre o que fizeram os governantes pós-coloniais aos seus povos, com a desculpa de serem umas vítimas do colonialismo e uns heróis da libertação.
Há cem anos, grande parte das colónias africanas não sentiam a autoridade do Estado colonial para lá de algumas cidades, umas vezes porque o Estado colonial delegava em companhias majestáticas essa autoridade - ironicamente, foi o Estado Novo que acabou com essa situação - outras vezes porque simplesmente o Estado colonial não existia em grande parte do território (Mouzinho de Albuquerque submete Gungunhana em 1895, quase às portas do que é hoje Maputo, sendo certo que, durante centenas de anos, o centro da presença colonial em Moçambique até era uma ilha, por dificuldade de penetração no continente, continuando a haver larguíssimas partes do território em que a autoridade do Estado colonial era apenas formal e completamente irrelevante).
De resto, até ao fim do século XIX, a região que é hoje a de Maputo, esteve em disputa, entre os povos nativos, os portugueses, os britânicos e os boers.
Sejamos claros, a influência do Estado colonizador, em quase todo o território moçambicano, não se consegue recuar a mais de 150 anos (mais coisa, menos coisa).
Desses 150 anos, os primeiros 50 são de um tímido crescimento da influência colonial.
Os segundos 50 correspondem ao Estado novo, que a partir dos anos 40 a 50 passou a ter uma política de colonização de facto, com investimentos em infraestruturas (o caminho de ferro tinha começado antes), de estabelecimento de grandes projectos de ocupação do território, como o que está associado à barragem antes chamada de Trigo de Morais, hoje a cidade de Chokwé e arredores, de investimento em educação básica, política essa fortemente potenciada pela eclosão da guerra, ao trazer para as colónias gente e actividade económica.
Recent Comments