Lisboa, 17 Nov (Lusa) - Sessenta anos de histórias do fado são o mote da palestra de Luís de Castro, segunda-feira, na Sociedade Portuguesa de Autores, em Lisboa, que encerra um ciclo promovido pela Associação de Amizade Portugal-Portugal.
Fundador da Associação Portuguesa dos Amigos do Fado (APAF), Luís de Castro disse à Lusa: "Como ouvinte e apreciador de fado tenho mais anos que muitas carreiras artísticas".
Nascido na Mouraria em Lisboa há 75 anos, Luís de Castro, cirurgião dentista de profissão, recorda-se ainda de ouvir nomes como Alberto Costa e Amélia Maria, mas "a sério" começou a ouvir fado aos 14 anos.
"Comecei por volta dos 14 anos a acompanhar com mais interesse, lembro-me por exemplo de ter ido à inauguração do restaurante típico A Severa [em 1955] convidado pelo fadista Gabino Ferreira".
Fernando Maurício, também da Mouraria, é outro dos nomes de que guarda "gratas recordações".
"Fui seu amigo desde miúdo, quando ele cantava na Taberna do Saloio, e acompanhei a sua carreira de que nunca tirou proveito financeiro à altura do seu valor artístico", disse.
Relativamente à palestra de segunda-feira, Luís de Castro afirmou que "se falasse de todas as histórias, boas e más, que vivi no fado, não terminaria".
"Começarei por me debruçar sobre a palavra 'fado' e os diferentes conceitos a ela associados, depois falarei das origens desta canção, referirei a Severa e falarei da minha experiência", disse Luís de Castro.
De "ouvinte interessado" a estudioso da história do fado "foi um passo".
As origens do fado são um dos seus pontos de interesse, estando actualmente a preparar, com outros autores, um livro sobre a figura de Maria Severa Onofriana (1820-1846).
O seu interesse "por conhecer mais e melhor o fado, e divulgar essa sua vertente" levou-o a fundar "com um grupo de entusiastas" a APAF.
Questionado sobre as origens do fado, Luís de Castro declarou que "o fado é lisboeta, com várias influências culturais é certo, de além-mar, de outras culturas, e até das pessoas que vinham de outras regiões portuguesas, mas nasceu em aqui".
Este será um tema que abordará na sua palestra, além de partilhar experiências vividas, como "certa noite na Parreirinha de Alfama em que cantaram Amália Rodrigues, Alfredo Marceneiro e Fernanda Maria, num aniversário de Celeste Rodrigues".
Noites "de excelência" como esta guarda algumas na memória e se "o fado vive muito da tradição oral e dos testemunhos" Luís de Castro não projecta vir a escrever um livro sobre esta vivência que reconhece ser "única".
"Conheci e ouvi todos os grandes nomes, até porque fui dirigente de várias colectividades e nesse sentido contratei-os, mas tive na realidade convívio com eles", disse.
Remete a conversa para "o espaço de tertúlia que era o fado há uns anos atrás, quando nas casas típicas se encontravam intelectuais, poetas, actores, artistas e anónimos".
Amália Rodrigues é em seu entender um "nome essencial na história do fado não só pela voz excelente - tinha um facilidade extraordinária de ir aos agudos sem desvirtuar a melodia - como pela renovação que trouxe ao fado sem lhe atraiçoar as raízes, e a emoção que colocava em todas as suas interpretações".
O estudioso considera que a criadora de "Povo que lavas no rio" (Pedro Homem de Mello/Pedro Rodrigues) "foi maltratada" no filme "Fados" de Carlos Saura.
Em seu entender na película estreada há cerca de um mês "há pouco fado e dá quase a ideia que o fado não é nosso".
Referindo-se aos actuais nomes do fado, destaca Camané e considera que "há bons valores, mas são pouco criativos, fruto da difusão discográfica que os leva a tentarem imitar quem já gravou, e a falta de repertório próprio".
Ana Moura, Ana Sofia Varela, Katia Guerreiro, Mariza, Ricardo Ribeiro e Pedro Moutinho são alguns dos nomes que referiu.
Para bem se interpretar o fado, Luís de Castro considera que é essencial "uma voz bonita, boa dicção, saber dividir o verso e o compasso, criando assim um estilo próprio que os diferenciará".
Contraria a ideia de um "novo fado", defendendo que "há uma evolução natural, novas abordagens, mas tudo isso é fado".
Luís de Castro pertence ao grupo de consultores do Museu do Fado, que "é um sonho de há muitos anos, agora concretizado, e que, podia fazer ainda mais", mas reconhece os meios escassos.
Quanto ao futuro do fado, declarou: "haverá sempre fado, pois é uma canção que está arreigada ao povo português".
A palestra tem lugar no auditório Frederico de Freitas, na sede da Sociedade Portuguesa de Autores, em Lisboa, pelas 18:00.
NL. - Lusa/Fim
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